:: :: EFEMÉRIDES 2015 :: 27 DE AGOSTO :: :: O Capeia Arraiana publica diariamente as efemérides mais relevantes de cada data… Hoje destacamos a ocupação do concelho do Sabugal pelas tropas francesas de Reynier, em 1810, e a tomada da praça de Almeida pelas tropas franco-espanholas, em 1762.
Ler MaisFomos a Torres Vedras falar com o Coronel Manuel Francisco Veiga Gouveia Mourão, um dos autores do livro «Sabugal e as Invasões Francesas», que vai ser lançado no Sabugal no próximo dia 2 de Abril, por ocasião da evocação do bicentenário da Batalha do Sabugal. No livro o coronel Mourão descreve com grande minúcia essa última batalha com as tropas francesas em solo português, o que também serviu de mote para a animada conversa com o afável investigador.
Loison foi um general e conde do Império Francês, que participou nas três invasões de Portugal. Ficou muito popular pelas piores razões, pois o povo, que o imortalizou como «Maneta», sofreu na pele os horrores do seu comportamento criminoso. Esteve acampado na Ruvina, no final da terceira Invasão.
Henri-Louis Loison nasceu a 13 de Maio de 1771, em Damvillers, filho de um deputado da Assembleia Constituinte. Alistou-se no exército aos 20 anos e passado um ano era tenente. Já capitão de hussardos, serviu na actual Bélgica, onde liderou o saque à célebre e riquíssima abadia de Orval, seu primeiro acto de grande atrocidade.
Promovido a general de brigada, participou na repressão da insurreição monárquica de 1795, sendo depois nomeado presidente do tribunal que condenou os cabecilhas da revolta.
Em 1799 serviu na Suiça, sob as ordens de Massena, que o promoveu a general de divisão. No ano seguinte participou na Campanha de Itália onde se bateu em batalha sob as ordens do marechal Ney.
Em 1806 perdeu o braço esquerdo num acidente de caça, o que o colocou fora do comando das tropas durante largos meses. Recuperado, participou no cerco de Colberg, na Alemanha, e foi nomeado governador de uma região do novo Reino da Vestefália.
Em finais de 1807, foi nomeado comandante da 2.ª divisão do Corpo de Observação da Gironda, que, sob o comando de Junot, invadiu Portugal. Foi o homem de mão de Junot para punir os actos de rebeldia dos portugueses. Isso é especialmente notório a partir de Maio de 1808, perante sinais de uma insurreição geral, o que levou Junot a encarregar Loison de expedições punitivas exemplares. Ocupou então diversas povoações portuguesas, de norte a sul, praticando todo o género de crueldades contra as populações, ferindo, açoitando e matando quem lhe surgisse pela frente. O povo chamava-o «Luisão» e «Maneta», ficando então a usar-se na linguagem popular o lugar comum «ir para o maneta», em analogia com o destino fatal de todos aqueles que o Maneta apanhava.
Finda a primeira invasão, Loison foi, em 1808, enviado para o corpo do marechal Soult, a quem Napoleão encarregou de uma segunda invasão, entrando pelo Norte. Bom conhecedor do País, Soult enviou-o por diversas vezes em campanha, a fim de pacificar zonas revoltosas ou para cobrir os movimentos do exército francês, continuando a praticar as suas malfeitorias sobre o povo.
Fracassada a segunda invasão, regressou a Espanha e, em 1810, esteve de novo ao comando de uma divisão, integrado agora no corpo de Ney, com o objectivo de entrar em Portugal, no exército de Massena. Loison combateu na batalha do Buçaco, ocupou diversas posições defronte das Linhas de Torres e evoluiu às ordens no movimento retrógrado. Massena vivia em conflito permanente com o fogoso Ney, que por sua vez detestava Loison. A rivalidade entre os marechais culminou na decisão de Massena destituir Ney do comando do 6º Corpo, em plena retirada, quando as tropas se encontravam em Celorico da Beira, tentando suster o avanço aliado.
Loison foi então escolhido para comandar o 6º Corpo, mas as tropas, que sempre tiveram Ney como herói, não se adaptaram ao novo comandante. Loison não tinha o carisma e a capacidade de comando do seu predecessor. O 6º Corpo, era a elite do exército invasor, que havia coberto toda a retirada desde Santarém, mas com Loison passou a ser uma estrutura pesada e difícil de movimentar.
Massena ordenou a Loison que ocupasse o vale do Côa, e a Junot e Reynier, os outros dois comandantes de corpo, que avançassem pelo Sabugal para sul, pretendendo relançar a invasão. Porém o atrito com Ney e a consequente demora na manobra do 6º Corpo fizeram fracassar este plano. Loison ocupa a margem direita do rio Côa, instalando-se na Ruvina, a partir de onde comandou os seus homens, com vista a garantir que as forças anglo-portuguesas não passassem o rio.
Entretanto Junot deixou Belmonte e Sortelha e recuou para Alfaiates, onde Massena estava instalado, e Reynier acampou no Sabugal, começando-se a desenhar um definitivo retrocesso dos franceses para Espanha. Wellington, à frente do exército anglo-luso, atacou Reynier no Sabugal, o qual esperou pelo socorro de Loison, que porém não foi capaz de lho prestar. Optou antes por levantar o acampamento e partir da Ruvina para Alfaiates, onde se juntou a Massena, daí recuando para Espanha.
A curta passagem de Loison pelo concelho do Sabuhgal, não deu azo a mais que os normais e puros actos de guerra, dentre os quais as acções de saque às populações a fim de garantir a subsistência do exército. Loison era um homem cansado da guerra, que transportava a fama terrível de general sanguinário e cruel. Porém não passava, nesse momento de uma sombra de si próprio.
Já acantonado em Espanha, pediu insistentemente uma licença, que acabou por lhe ser concedida, e abandonou o comando do corpo, regressando a França.
Em Maio de 1812 foi enviado por Napoleão para a campanha da Rússia, onde combateu abnegadamente.
Regressado a França em 1814, passou a comandante de uma região militar e, no ano seguinte, passou à disponibilidade. A queda de Napoleão fê-lo passar em definitivo à posição de reformado, indo viver em Liége, no recém-criado Reino dos Países Baixos, onde morreu em 30 de Dezembro de 1816, com apenas 45 anos.
Paulo Leitão Batista
Jean-Louis Ebénézer Reynier nasceu a 14 de Janeiro de 1771 em Lausanne, na Suíça, tendo-se destacado enquanto militar ao serviço de Napoleão. Na terceira invasão de Portugal coube-lhe ocupar o Sabugal e Alfaiates, onde permaneceu no período preparatório do avanço para Lisboa. Na retirada voltou a acampar no Sabugal, onde enfrentou as tropas anglo-portuguesas comandadas directamente por lord Wellington.
Reynier foi um oficial talentoso, que porém era por vezes acusado de ser muito inseguro e de trato difícil.
Formado em engenharia civil, ofereceu-se para servir no exército francês em 1792, tornando-se oficial de artilharia. Serviu abnegadamente em combate, o que, aliado aos seus conhecimentos, lhe valeu ser promovido a general de brigada com apenas 24 anos.
Integrou a expedição ao Egipto, onde serviu na batalha das Pirâmides e foi nomeado governador de uma província. Tomou parte na expedição à Síria, e, de volta ao Cairo, desentendeu-se com o comandante-em-chefe, o general Menou, o que lhe valeu ser preso e acusado de traição.
Já em Paris, bateu-se em duelo com o general Destaing, a quem provocou a morte. Napoleão expulsou-o então da cidade. Mas o reconhecido talento de Reynier fez com que estivesse de volta pouco tempo depois.
Em 1804 integrou o Corpo de Observação de Nápoles, e, no ano seguinte, venceu os austríacos. Em 1806 serviu sob as ordens de Massena e, em 1807, assumiu o comando do exército francês na Calábria, cuja campanha o levou a Grande Oficial da Legião de Honra. Em 1808 foi nomeado Ministro da Guerra e da Marinha do Reino de Nápoles.
No decurso da importante Batalha de Wagram, o Imperador retirou o comando ao Marechal Bernadotte, chamando Reynier para o substituir à frente de um dos corpos.
No final de 1809 foi enviado para a Península Ibérica, onde tomou o comando do 2º corpo, que integrou o Exército de Portugal, sob as ordens de Massena. Apesar dos reveses desta campanha, Reynier tornou-se Conde do Império, em reconhecimento dos seus méritos.
Em Janeiro de 1812 retornou a França para preparar a campanha da Rússia, na qual participou. Na retirada, já na Alemanha, ficou prisioneiro dos russos, que, sabendo-o suíço de nascimento, lhe ofereceram uma comissão no seu exército. Reynier recusou, permanecendo fiel à França, e retornou a Paris, graças a uma troca de prisioneiros. Desgastado pelas campanhas adoeceu gravemente e morreu pouco depois, em 27 de Fevereiro de 1814.
No decurso da terceira invasão de Portugal foram diversos os momentos de tensão entre Massena e os seus comandantes dos corpos, incluindo Reynier. Massena considerava-o um general com muito talento, mas que era tímido e desesperava perante a menor dificuldade.
Antes da invasão se iniciar, coube-lhe cobrir a linha do Tejo, sustendo as tropas do general Hill. Depois o marechal comandante ordenou-lhe que viesse para norte, entrasse em Portugal pela Idanha e atingisse o Sabugal e Alfaiates, onde deveria instalar os seus 18 mil homens. Esteve no Sabugal de 27 de Agosto a 11 de Setembro de 1810. Seguiu depois para a Guarda e desceu o vale do Mondego, acompanhando os outros corpos no movimento geral.
Na batalha do Buçaco Reynier formou a esquerda do ataque francês, tendo sofrido pesadas baixas. Passando Coimbra e Leiria o exército invasor chegou às célebres linhas de Torres Vedras, também chamadas de Lisboa, que não conseguiu ultrapassar, espraiando-se em toda a sua extensão, cabendo a Reynier ocupar Vila Franca de Xira e Castanheira do Ribatejo. Recuou depois para Santarém, cidade que ocupou enquanto os franceses esperaram por reforços que nunca chegaram.
Reynier era admirado pelos seus soldados, dado o rigor com que manobrava as tropas e os estratagemas a que recorria para iludir o inimigo. Em Santarém, passando grandes privações, por falta de víveres, Reynier pensou numa incursão à margem esquerda do Tejo para recolher algum do gado. Wellington tinha soldados guardando toda essa margem, sem porém se conhecer o seu número. Reynier concretizou então um plano, que consistiu em fazer subir um balão de ar quente que mandou fazer com papéis, facto que despertou a curiosidade dos soldados portugueses e ingleses, que saíram dos seus refúgios para observarem o artefacto. Munido do seu binóculo o general contou então as tropas inimigas, planeando depois uma incursão que foi muito bem sucedida.
Aquando da retirada, Reynier voltou a surpreender ao montar um estratagema que iludiu as linhas luso-britânicas e lhe garantiu um avanço considerável. Mandou fazer manequins vestidos de soldados, colocou-os nos locais das sentinelas e abandonou os postos durante a noite. Só ao amanhecer os aliados deram conta de que as linhas francesas estavam desertas.
Na véspera da batalha do Sabugal Reynier fez mais uma vez desesperar Massena, que estava em Alfaiates. O Marechal ordenara-lhe que garantisse a ponte do Côa, dando tempo a Loison para recuar com o seu corpo. Porém Reynier mostrava-se nervoso e impaciente, face aos movimentos que os seus postos avançados observavam ao exército anglo-luso, que vinha de Vale Mourisco em direcção ao Sabugal. Os ajudantes de campo de um e outro oficial cruzavam-se incessantemente com missivas. Reynier dizia estar defronte de toda a vanguarda do exército aliado e queria retirar durante a noite, mas Massena ordenava-lhe que se mantivesse firme e escrevia-lhe: Não penso que o inimigo nos queira atacar; colocou-se na estrada de Penamacor para ver se queremos ir por ela. (…) o 6º corpo está à sua direita e o 8º atrás de si, e ou um ou o outro lhe dará apoio em caso de necessidade. (…) Para lhe dizer a verdade, não creio que lord Wellington esteja à sua frente. Mas estava, e em pessoa, preparando um ataque vigoroso às linhas francesas. Atacado, Reynier resistiu quanto pôde, até receber enfim autorização para retirar.
Massena elogiou porém o esforço do seu general: o combate do Sabugal honra Reynier, pois este general recuperou toda a sua energia logo que a acção começou, escreveu o general Koch nas «Memórias de Massena». Na verdade cumpriu a sua missão e conseguiu retirar em boa ordem, sem perdas consideráveis.
O nome de Reynier está escrito no lado sul do Arco de Triunfo.
Paulo Leitão Batista
A Lapa de Maria foi um dos refúgios naturais que os habitantes de Valongo do Côa usaram para se esconderem dos franceses, procurando evitar os abusos desmedidos da soldadesca, que percorria as aldeias em busca de sustento ou na perseguição das guerrilhas que os atacavam.
Há 200 anos, no tempo em que Napoleão espalhou a guerra por toda a Europa, os exércitos não tinham ainda capacidade logística para transportarem consigo os meios de abastecimento. Atrás das colunas de cavalaria e infantaria seguiam os pesados trens da artilharia e da engenharia, carroças com pólvora, balas de canhão e cartuchos de espingarda, caixões de biscoito, e algum material de intendência.
Bonaparte fixara a máxima: «A guerra deve alimentar a guerra.» Tal significava que cada um dos seus exércitos deveria subsistir com o que o país ocupado produzisse, cabendo aos comandantes providenciar no sentido de garantir esses recursos.
Ora, em certas regiões, os exércitos franceses andavam depauperados. Os soldados passavam fome, tinham as roupas e o calçado rotos, além de que os soldos estavam em atraso. A solução era mandar «forragear».
Constituíam-se destacamentos com carroças para transporte, que seguiam pelos territórios ocupados em busca de víveres. Onde havia algo a confiscar para a sobrevivência do exército, os forrageadores deitavam a luva, sem pedir licença. Embora procurassem sobretudo cereais, tudo lhes servia: vinho, aguardente, animais para abate, ovos, enchidos, fruta, e até feno e palha para os cavalos. Quem se lhes interpusesse, alegando defender o que era seu, arriscava-se à morte. Por isso era tremendo o medo dos franceses e os povos das zonas ocupadas procuravam locais de refúgio, para onde se escapuliam logo que os franceses se aproximassem das aldeias.
No concelho de Vilar Maior, junto a Valongo, na margem do Côa, havia um refúgio natural que foi sucessivamente usado durante o tempo em que os militares de Napoleão operaram na raia. Trata-se da Lapa de Maria, que é uma gruta natural, formada por grandes barrocos. A entrada é muito baixa e estreita, sita na base dos rochedos. Porém o interior da gruta contém uma nave ampla, onde cabem mais de três dezenas de pessoas. No topo contém uma pequena abertura, por onde entra luz natural.
Está localizada a pouco mais de um quilómetro da povoação, na margem direita do rio, em local aprazível. O isolamento da Lapa de Maria e a sua localização privilegiada, tornam-na num esconderijo perfeito, perante um invasor que possuía cartas das principais estradas e caminhos e sabia localizar facilmente as principais povoações, mas não podia conhecer os abrigos que o povo escolhia para se esconder.
Joaquim Manuel Correia, no seu livro «Celestina», fala na Lapa de Maria e conta alguns episódios que o povo não esqueceu.
«Durante o “tempo dos franceses” cerca de 30 pessoas estiveram escondidas na Lapa de Maria, junto ao rio Côa, na zona do Seixo. Estiveram três dias sem comer, até que um homem, Afonso Correia, “foi ao Seixo comprar uma bolacha, uma coisa dura a arremedar uma bola, por oito tostões, repartindo-a por todos”.
Muitas vezes ali estavam escondidos, quando viam o perigo assomar. Conta-se que duma vez ouviram gritar “Ó Maria, olha que já abalaram os franceses”, porém desconfiaram e não saíam porque quem gritava era um garoto a mando dos franceses que assim esperavam surpreender os escondidos. Como não saíam ameaçaram deitar fogo a toda a gente, pelo que saíram, fugindo cada um para seu lado.
Uma mulher, chamada Josefa, fugiu com todo o ouro do grupo para a Serra do Seixo, sendo perseguida por um francês que a tentou, sem êxito, balear.
No mesmo local consta que os invasores tentaram enforcar uma rapariga chamada Paula, de Vale das Éguas, deixando-a pendurada num carvalho, decerto depois dela terem abusado. Valeu-lhe ali passar um homem que lhe acudiu cortando a corda. “Ficou sã e escorreita, inda casou e teve filhos”.
Na Ruvina mataram um rapaz por defender a mãe que um francês queria acometer. Eles, desagradados com a acção do rapaz em defesa da mãe, “deitaram-no sobre um banco e obrigaram a mãe a aparar o sangue como se fosse um porco”.»
A Lapa de Maria deveria ser inserida numa «rota das invasões» a criar no concelho do Sabugal.
Paulo Leitão Batista
No dia 11 de Setembro de 1810, o corpo de tropas de Reynier abandonou os concelhos do Sabugal, Alfaiates e Vilar Maior, onde estavam instaladas há 14 dias, iniciando, sob o comando de Massena, a manobra da terceira invasão de Portugal. Para trás deixavam aldeias saqueadas, homens mutilados e assassinados e mulheres violadas. Portugal e os portugueses viviam um dos períodos mais pavorosos da sua história.
plb
A 27 de Agosto de 1810, há precisamente 200 anos, as tropas do 2.º corpo do exército francês, comandadas pelo general Reynier, vindas do sul para se juntarem ao grande exército de Massena, ocuparam em força as terras dos concelhos do Sabugal, Alfaiates e Vilar Maior, provocando a fuga desesperada das populações.
Enquanto o 6.º corpo, de Ney, manobrava em redor de Almeida, estabelecendo o cerco à fortaleza, e o 8.º corpo, de Junot, estava ainda em Espanha nas margens do rio Águeda, o 2.º corpo, de Reynier, operava em Cória e Placencia, na linha do Tejo. Massena montara o seu quartel-general no forte de La Conception, frente a Vale da Mula, de onde emanava as ordens do dia.
O marechal ainda não decidira como invadir Portugal e estava inclinado a fazê-lo em duas frentes, partindo uma coluna de Almeida, pela estrada da Beira, e penetrando a outra pelo vale do Tejo, em direcção a Abrantes. Porém acabaria por preferir juntar os três corpos e avançar em força por Celorico e Viseu, pois a postura de Wellington, que deixara cair Ciudad Rodrigo e não auxiliava Almeida, indiciava que podia dar-lhe perseguição e enfrentá-lo em qualquer posição.
Foi assim que na manhã do dia 25 de Agosto enviou ordens a Reynier para se deslocar para norte e tomar posição na margem direita do Côa, à esquerda do corpo do marechal Ney. Em cumprimento dessas instruções, o 2.º corpo avançou em marchas rápidas e no dia 27 ocupou em força os concelhos do Sabugal, Alfaiates e Vilar Maior, cujas aldeias ao redor foram também tomadas pelos destacamentos, tendo os soldados ocupado as casas abandonadas pelos habitantes receosos. Tal como o comandante em chefe lhe prescrevera, Reynier estabeleceu o seu quartel-general em Alfaiates e guarneceu fortemente a ponte do Sabugal, tendo em vista dissuadir qualquer tentativa do exército anglo-português de atravessar a linha do Côa.
Os concelhos raianos onde até então tinham forrageado os destacamentos do 6.º Corpo, ficavam agora literalmente ocupados pelas tropas do 2º corpo, as mesmas que com o marechal Soult haviam protagonizado a segunda invasão de Portugal. Estes soldados experientes e com amargas recordações dos portugueses teriam que ali subsistir até que fosse dada a ordem de avançar em direcção a Lisboa. Os povos das terras em redor sofreram então como nunca os excessos da soldadesca que, querendo alimentar-se e aprovisionar-se de viveres, lançavam mão a tudo o que servisse de alimento para os homens e para os animais do exército.
Esta forte e dura ocupação militar das nossas terras manter-se-ia até ao dia 11 de Setembro, data em que Massena transmitiu aos seus lugares tenentes as instruções para a execução dos movimentos preparatórios para o avanço da invasão. Nesse mesmo dia o 2.º corpo deixou as suas posições na margem direita do Côa e marchou para a Guarda, de onde depois prosseguiu num movimento combinado com os restantes corpos do exército.
Já em finais de Março de 1811, malograda a terceira invasão e em plena retirada, as tropas do 2.º corpo voltariam a ocupar as terras do Sabugal, com a ideia de aí conterem o avanço dos anglo-lusos, que lhes davam perseguição. As populações voltaram então a sofrer com as atrocidades dos soldados franceses que vinham ainda mais famintos e coléricos do que quando dali haviam estado há sete meses.
No dia 3 de Abril de 1811, teve lugar a batalha do Sabugal, onde os homens de Reynier foram batidos pelos portugueses e ingleses comandados por Wellington, livrando-se assim os sabugalenses das pilhagens e dos excessos da tropa francesa.
Paulo Leitão Batista
Passou mais um ano sobre a importante batalha do Sabugal, que aconteceu em 3 de Abril de 1811, no quadro da guerra peninsular. Para o ano fazem-se 200 anos e até ao momento nenhuma autoridade responsável avançou com a ideia de evocar esse momento histórico.
O exército do marechal Massena, cuja fama de estratega militar só era superada pela do próprio imperador Napoleão Bonaparte, tinha batido em retirada após não ter sido capaz de atravessar as Linhas de Torres Vedras e tomar Lisboa. O segundo corpo, comandado pelo General Reynier cumprira as ordens do marechal e instala-se no Sabugal, onde foi surpreendido pelas forças anglo-lusas de Wellington, que atacaram o seu acampamento no sítio do Gravato obrigando-o a retirar para Espanha.
Massena não queria desistir da conquista de Portugal e o seu recuo era apenas estratégico.
Não conseguindo entrar em Lisboa, os 65 mil homens do exército francês fixaram-se em Santarém, onde estiveram durante semanas aguardando reforços. Mas o caso é que os franceses ficaram isolados, sem conseguir estabelecer comunicações com os restantes corpos de exército que operavam em Espanha e desconhecendo por completo se as restantes movimentações ordenadas pelo imperador se estavam a cumprir. Cansado de esperar e já com imensas dificuldades em alimentar o seu exército, Massena decidiu recuar. Fê-lo de forma controlada, mas seguido de perto pela tropa de Wellington.
Quando conseguiu comunicar com os corpos de exércitos que operavam em Espanha, verificou o ponto da situação: a sul o marechal Mortier conquistara Badajoz e Campo Maior e tinha ali estacionadas forças consideráveis; o marechal Bessiéres marchava com um corpo de exército para Ciudad Rodrigo, vindo do norte de Espanha. Face a esta realidade Massena elaborou um plano audaz, disposto a relançar a invasão: abandonar na fortaleza de Almeida, tomada pelos franceses, os doentes e feridos e tudo o mais que embaraçava os movimentos do seu exército e seguir pelo vale do Côa até ao Sabugal, depois para Belmonte e Penamacor, entrar em Espanha, atravessar Coria e encontrar-se com o exército de Mortier em Alcântara. Dali lançaria uma forte ofensiva sobre Lisboa, seguindo desta vez pela margem esquerda do Tejo.
O arrojado plano de Massena de fazer uma ofensiva pelo Alentejo, confrontou-se porém com a recusa do marechal Ney, que comandava o 6º corpo, em obedecer a essas ordens, o que levaria à sua exoneração e substituição. Esta contrariedade fez-lhe perder o tempo suficiente para que Wellington, apercebendo-se de que a movimentação que os franceses ensaiavam não era lógica, avançasse para o Sabugal, onde já estava a vanguarda de Massena, e aí atacasse o corpo do general Reynier, infligindo-lhe uma derrota
Com a linha de operações interceptada, e um corpo de exército destroçado, nada mais restou a Massena que mandar retirar todas as suas tropas de Portugal, assim terminando a terceira invasão.
Foi esta a importância histórica da Batalha do Sabugal na guerra peninsular. Foi decisiva, na medida em que fez desistir os franceses de tentar invadir o nosso país. De facto, permaneceram mais dois anos em Espanha, mas não mais tentariam ocupar o solo português.
É possível que as entidades do concelho não se aponham à tarefa de comemorar os 200 anos da Batalha do Sabugal, mas fica a promessa que no ano que vem o Capeia Arraiana voltará a evocar a data.
plb