Para além do encerro, toiro da prova, passeio dos rapazes, pedido da praça, lide com o forcão e o desencerro final, a tradicional Capeia Arraiana conta também com os momentos em que o toiro corre pela arena improvisada ao sabor dos desafios que a rapaziada lhe faz livremente.
Após o manejo do forcão, logo que o mesmo é encostado às «calampeiras», os jovens saltam para a arena e correm a fazer tangentes sucessivas ao toiro bravo, abordando-o por todos os lados, por vezes de forma estonteante, fazendo com que o animal rodopie na tentativa de atingir algum dos vultos que o «atentam». Doutras vezes o toiro corre para alcançar o atrevido que lhe passou de raspão e ainda se atreveu a dar-lhe uma palmada de incitamento.
Mas ele há momentos mágicos, de verdadeiro malabarismo, nomeadamente quando os rapazes mais intrépidos e de melhor preparação física correm para o toiro, que para eles investe decidido, e, no momento da reunião, formam um salto por cima do dorso do animal, caindo ilesos e em perfeito equilíbrio. Em recompensa, os corajosos ouvem longos clamores de admiração seguidos de infindáveis aplausos.
Alguns desses moços arrojados passam sobre o animal sem lhe tocarem, outros assentam-lhe um pé em cima, num acto de desafio e de dominação, outros, cuja sorte ou destreza não os acompanham, desequilibram-se e caem desamparados na arena, originando o desassossego geral perante uma eventual colhida.
Temos na memória o feito memorável de um jovem japonês que, já lá vão 15 anos, entrou na praça do Campo Pequeno, em Lisboa, quando ali acontecia a capeia anual da Casa do Concelho do Sabugal. Da bancada, onde esteve uns instantes, desceu à trincheira e dali entrou na arena, quando os cortadores arraianos se divertiam e davam espectáculo fazendo tangentes velozes ao animal. O jovem japonês, magro e alto, olhou para o toiro e quando este investiu para ele o jovem arrancou também em direcção ao animal, sob o olhar incrédulo das pessoas. Formou um salto e colocou o pé sobre o dorso do toiro, caindo em equilíbrio do outro lado. O público gostou e ovacionou o jovem estrangeiro, que possivelmente nunca pusera até então um pé numa praça de toiros.
Na raia os «malabaristas», chamamos-lhe assim sem qualquer sentido pejorativo, multiplicam-se pelas terras e dão espectáculo nas capeias.
O festival Ó Forcão Rapazes, que este ano se realizou no Soito, no dia 18 de Agosto, foi exemplo disso.
Os manos Batista, de Alfaiates aproveitaram um toiro feroz, que investia com valentia, para lhe saltarem por riba. Um deles, o Frank, formou mesmo um salto mortal perfeito, para gáudio do público que o compensou com um longo e caloroso aplauso.
O Pedro Fonseca (conhecido por Balhé) do Soito, que também é mestre nos saltos, teve este ano o trabalho dificultado por ter cabido à sua terra um toiro pouco dado a investir, que se colava às tábuas, mas mesmo assim, na única oportunidade que se afigurou, o jovem não hesitou e satisfez um público já sedento de observar e ovacionar o seu herói.
Que o espírito, a vontade e a intrepidez dos «malabaristas» não esmoreça, para que as capeias possam continuar a contar com o seu contributo para a valorização do espectáculo.
plb