A Pepa estava em casa da avó, Ti Maria Brites. O pai havia dois anos que fora para França trabalhar numa forja da fábrica de loiça…

Naquele dia em que a neve cedera lugar ao gelo escorregadio, nos caminhos e quelhas da nossa aldeia. Só se estava bem na cozinha à roda do lume. Nem os rapazes iam esperar as cachopas ao chafariz, nem sequer se viam os vizinhos a ir ao curral buscar lenha ou qualquer outra coisa. Era a altura de descer à loja pelas escadas do alçapão.
Pela manhãzinha, acordava ao crepitar do lume da carqueja a arder. O cepo custava a «pintchar» fogo, pois humedecia debaixo do lençol cristalino da geada! Porém, havia sempre uns toros de giesta, raízes de urze ou torga para o atiçar! Não tardava a chegar até mim, aquele chio perfumado da brasa a assentar as borras do café de cevada!…
O ti Francisco trabalhara uma vida inteira naquele labutar árduo do campo, onde raramente entrava o arado pela pequenez das suas terras. Eram os seus braços que levantavam e baixavam o sacho e a enxada que abria a terra; os mesmos braços que seguravam o machado e a pedoa para arranjar lenha; ou o malho e mangual para debulhar o grão, feijão, centeio, cevada… os mesmos que, com devoção seguravam um varal do pálio em dias de procissão …
A Pepa pusera o xale pardo de lã, gasto e já meio esburacado, sobre a saca de sarapilheira do contrabando. O Diamantino esperava por ela entre umas moitas de carqueja que ladeavam o carreiro junto do moinho do nosso Toino, lá para o Prado Castelhano. Era o último acarreto antes do Natal, ia ela pensando pelo caminho.