Como doía àquela mãe ver o filho quase a desaparecer nos ossos, sem ter forma de lhe aligeirar o cansaço e dar-lhe uma vida mais fácil…

Origens: Aldeia do Bispo (Sabugal) :: :: Crónica: Gentes e lugares do meu antanho :: ::
Naquele dia em que a neve cedera lugar ao gelo escorregadio, nos caminhos e quelhas da nossa aldeia. Só se estava bem na cozinha à roda do lume. Nem os rapazes iam esperar as cachopas ao chafariz, nem sequer se viam os vizinhos a ir ao curral buscar lenha ou qualquer outra coisa. Era a altura de descer à loja pelas escadas do alçapão.
Pela manhãzinha, acordava ao crepitar do lume da carqueja a arder. O cepo custava a «pintchar» fogo, pois humedecia debaixo do lençol cristalino da geada! Porém, havia sempre uns toros de giesta, raízes de urze ou torga para o atiçar! Não tardava a chegar até mim, aquele chio perfumado da brasa a assentar as borras do café de cevada!…
Felisbela era filha única do ti Jacinto. Casara com o seu vizinho Zé, também ele filho único e que, para além de serem «quintos», nasceram precisamente no mesmo mês, no mesmo dia e só com algumas horas de diferença.
O ti Francisco trabalhara uma vida inteira naquele labutar árduo do campo, onde raramente entrava o arado pela pequenez das suas terras. Eram os seus braços que levantavam e baixavam o sacho e a enxada que abria a terra; os mesmos braços que seguravam o machado e a pedoa para arranjar lenha; ou o malho e mangual para debulhar o grão, feijão, centeio, cevada… os mesmos que, com devoção seguravam um varal do pálio em dias de procissão …
A Pepa pusera o xale pardo de lã, gasto e já meio esburacado, sobre a saca de sarapilheira do contrabando. O Diamantino esperava por ela entre umas moitas de carqueja que ladeavam o carreiro junto do moinho do nosso Toino, lá para o Prado Castelhano. Era o último acarreto antes do Natal, ia ela pensando pelo caminho.