Não se trata de nenhuma sátira ao saudoso Prof. Martelo dos «Marretas» portugueses, a dita Contra-informação, programa da RTP, que sinceramente apreciei bastante.

No dia 27 de Março, faz oito meses que deixei a família e o nosso país. Nunca tinha estado tanto tempo fora, e encaro como mais uma experiência pessoal e voluntária. Como tudo na vida, muita coisa correu bem, mas outra nem tanto. Mas o ser humano sabe que o dia a dia é por si só, um desafio.
Como ficar quando um jovem amigo padece num acidente mortal de viacção? Conseguiu chegar apenas aos 29 anos, mas procurava dentro da sua realidade social, o conforto de sobreviver. Só o facto de não namorar, ou não ter filhos, era uma dureza tremenda que os seus mais próximos lhe faziam.
Tenho andado por zonas onde os meus pés calcam riquezas infindáveis, mas que na realidade muito, mesmo muito poucos, as veêm. Porque não imaginar um mundo diferente, em que encontro um caverna, ou gruta, e sou confrontado com inúmeras pedras que cintilam?
No fim de semana de 12 de Fevereiro, realizou-se «online» a 10.ª Edição do «Criar Raízes», uma das actividades da Fraternidade Nuno Alvares que mais gostei de participar. No meu caso participei em 2015, 2016 e 2017, onde ficará registada na minha memória a beleza da Serra do Alvão, a importância do voluntariado, neste caso em prol do ambiente, e de um convívio que tem o traço comum de termos sido na juventude escuteiros onde o campo nos despertava aquela liberdade que nunca nos deixou.
Depois de momentos únicos vividos em Luanda, achei que deveria presentear os meus leitores e leitoras, com a melhor prosa que consigo fazer. Li um artigo do Paulo Marques, enviado pelo meu amigo Fernando Marques, que me sensibilizou: «Literatura e Literaturinha.»
Hoje estou a escrever-vos no dia da apresentação de um livro em que fui convidado para ser co-autor. Como o livro só vai estar à venda em Luanda, obviamente nunca iria usar o facto de ser cronista do Capeia Arraiana para o publicitar. Será mesmo muito dificil qualquer dos leitores ou leitoras, o adquirirem.
Um pastor refugia-se na natureza onde partilha o seu interior com o que a terra nos dá. Mesmo longe da Serra da Estrela, onde os pastores tratam do seu gado e dos seus cães, aqui nas terras da Lunda a beleza desta tranquilidade nos transporta a saudade do frio e do ladrar, onde os chocalhos acabam por compor uma música da natureza beirã.
Foram precisos anos, muitos anos, para que este sonho de concretizasse. Mesmo reconhecendo que não sou um escritor de referência na lingua portuguesa, procurei o refúgio da velhice nas palavras que poderão entreter, ou até esclarecer, num futuro o passado que vivi.
Bem, hoje e dia 23 de Janeiro de 2021. É um dia de reflexão que só no dia 29 de Janeiro será publicado. E aproveito a reflexão para pensar em muitas coisas. Sinto também o sofrimento que o povo português anda a passar. Mesmo longe, e com uma vida de sonho, não posso ficar indiferente a quem amo, aos meus primos e amigos que estão a ser martrizados por algo inexplicável.
Inspirado no poema de Vinícius de Moraes, fui até Cacuaco, um muncípio juntinho a Luanda e que desfrua de uma zona balnear. Mas deixei a postura europeia e usei os transportes públicos, como um cidadão igual a qualquer outro. Foi um passeio memorável, onde mais uma vez, pude constatar a vida no coração de África.
Este artigo, continua na senda da História recente de Angola, com ficção literária visto ter sido muito jovem quando estes factos se terão passado. Uma das figuras angolanas que mais admiro, o Lúcio Lara, escreveu uma trilogia sobre a história da resistência que culminou na independência. É igualmente um documento interessante do ponto de vista histórico para nós portugueses.
Numa visita que fiz às quedas de Calandula, perto de Malanje, a pousada, agora fechada por causa da pandemia, tinha uma lápide exposta no seu interior com um excerto de uma frase do Governador Geral, Santos e Castro, que apenas diz o segunte: «…Pensemos ainda que também irão julgar-nos os que vierem depois.»
Considerado um dos locais emblemáticos, e mais perigosos, de Luanda, com movimento humano único, onde tudo se vende, desde a simples batata à melhor contrafacção da Dior, houve quem julgasse que iria cometer uma loucura, aproveitando uma oportunidade que seguramente pensei ser única. De facto, ninguém dos meus conhecimentos se atrevia a andar nalquele alvoroço, ainda para mais em vésperas do Natal, de 2020. Mas consegui, obviamente com sorte e com a ajuda de amigos, que me deram protecção e orientação. E digo: valeu mesmo a pena!
Tomei a decisão. Agora em Luanda, porque não ser luandense. Com um livro na forja, entendi ir ao editor de táxi. Pelo que ouvi terá sido uma ousadia. Mas para mim foi mais um passo de que as fronteiras só existem mesmo nas nossas cabeças. A viagem foi inesquecivel. A melhor parte foi quando pedi para tirar uma selfie.
O ano que se avizinha é de esperança. É é tão importante para quase todo o mundo que ninguém se ofenderá se disser «sagrada». O que nos espera é muito inesperado. Tudo indica que a tempestade vai passar. Mas deixou danos. A começar por aqueles que estão doentes à um ano aguardando o tratamento apropriado. No trabalho tudo indica uma revolução laboral. O comércio, o ensino, as viagens, muita coisa pode mudar…
Tenho escrito algumas crónicas de vivências únicas que tenho passado, mas estou a compilá-las para um dia, quem sabe, publicar. São estórias com história, onde há um vento da minha juventude, onde me faz lembrar como se vivia. Tal como tudo, há vantagens e desvantagens, mas para quem as viveu, deixa um sabor de saudade.
Um Natal que se aproxima. Como tantos lusitanos na diáspora, desde à séculos, a família com o bacalhau e grão, o madeiro, a lareira com a aguardente, a missa do galo com a samarra, o bolo rei com o cacau quente, referências que nos torna simplesmente portugueses, lusitanos perdidos mas com rumo e, acreditando, que um dia regressaremos a casa, sentido o calor do abraço de quem, de facto, nos quer bem.