Em tempos não muito antigos proliferavam em Portugal os galicismos, muitos deles adaptados posteriormente à nossa língua. A horda dos anglicismos invadiu-nos e penetrou de tal forma que se não pronunciarmos uma ou outra palavra em inglês passamos por ignorantes.

Quando a prevalência do ensino em Portugal se focava mais na língua francesa do que na inglesa, os vernaculistas cultores da língua apontavam frequentemente para a necessidade de evitar os galicismos, substituindo-os na medida do possível, por palavras ou expressões existentes na nossa língua. Por exemplo: em vez de «constatar», optar por «verificar»; e «menu», por «ementa» ou «cardápio».
De igual modo se recomendava falar e escrever em português os termos que pelo seu uso frequente já tivessem o direito de cidadania concedido por filólogos, dicionaristas, foneticistas, glotólogos, linguistas, etimologistas, gramáticos, que tanto se notabilizaram pelo fervor que manifestaram na defesa intransigente da língua portuguesa. Por exemplo, preferir «chique» em vez de «chic», «gafe» em vez de «gaffe», «guichê» em vez de «guichet», «maqueta» em vez de «maquette», «omeleta» em vez de «omelette».
Na actualidade, o inglês ganhou a primazia ultrapassando o francês. Quase não se procura já uma forma de evitar palavras inglesas que entraram no nosso dia-a-dia, havendo até altos responsáveis que fazem alarde da sua utilização mostrando cultura.
Até as siglas parece obterem estatuto de palavras na sua pronúncia de letras soletradas à inglesa: CEO (cí-í-ou); MIT (ém-ái-tí). «Reunião» passou a ser «briefing»; uma «pausa no trabalho» passou a «coffee-break».
Há quem levianamente verbalize «print» à portuguesa resultando no verbo «printar» e chega mesmo a ser conjugado, tal a situação de «print» em «crashar». Porém, tenhamos em conta que se pode grafar correctamente «robô» em vez de «robot» e «champô» em vez de «shampoo». Muitos outros casos foram já sinalizados em dicionários e outros meios de consulta que nos são facultados.
Conta-se que o Prof. Campos, um antigo docente da Faculdade de Letras de Lisboa nas décadas de 1930 ou 1940 do século passado, era um acérrimo defensor da língua portuguesa, evitando a todo o custo usar palavras estrangeiras. Tão conhecido era que os estudantes o alcunharam de «Campo Pequeno» devido à sua baixa estatura. «Campo Grande» era a alcunha atribuída à sua alta mulher, enquanto o filho era mimoseado com a alcunha de «Entrecampos».
O Prof. Campos num estabelecimento da Baixa perguntou se tinham um «tapa-colos». O empregado que o atendia, sem perceber o que o cliente desejava, limitou-se a dizer que não. Campos observou que estava a ver um exemplar numa das vitrinas:
– Se o senhor não sabe o que é um tapa-colos, digo-lhe que serve para tapar o pescoço.
– Mas isso, senhor, é um cachecol – esclareceu o empregado.
– Olhe, meu caro, se isso é um cachecol, eu não o quero. Vou a outro estabelecimento à procura de um tapa-colos.
– Muito bem, senhor, está no seu direito. Daqui tenho a certeza de que iria bem servido. Mas se for a outro lado pode ser enganado, em vez de um tapa-colos podem dar-lhe um tapa-olhos.
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«Língua Estufada», opinião de José Leitão Baptista
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Um texto agradável, humorístico e verdadeiro!