A ti Benedita e o ti João tiveram cinco filhos. De dois em dois anos surgia um rebentinho novo. Seria uma imensa alegria para eles se tivessem uma maior nesga de terra para semearem, mas por muito aproveitamento que fizessem da «tapadinha» não conseguiam arrancar mais que umas poucochinhas de batatas, umas couves, meia dúzia de beterrabas, um rego de cenouras, uns pés de feijoeiro de embarrar e pouco mais…

Não ficava ali um espacinho sem que o sacho não esmiolasse um possível torrão de terra endurecido. Todos os dias o ti João sabia quantas folhinhas tinham desabrochado, quantas vagens podiam ser já colhidas, se as cenouras já podiam ser arrancadas e se era preciso regar… Quando viu que todo o esforço era pouco teve uma ideia brilhante. Entre as pedras que formavam o muro ficavam umas frechas. Foi aí que ele se apercebeu que rompiam conchelos, erva cidreira, malvas, azedas e lembrou-se:
«A ti Maria Ramos, mãe da ti Benedita, sabia todas as mézinhas tradicionais e ela aprendera bem os seus conhecimentos.»
Decidiram-se, então, ir recolher todas as plantas silvestres milagrosas: camomila, carqueja, sabugueiro, erva de São Roberto, loureiro, bagas de zimbro… e faziam a secagem de folhas e flores, os melhores licores e compotas… Criaram pigmentos que só eles sabiam como combinar. Os seus produtos passaram a ser famosas para lá da aldeia.
Quando os emigrantes voltavam à «Terra» seria uma desfeita não terem um saquinho guardado para cada um deles levar. Ti João não aceitava dinheiro em troca, mas ficava muito feliz com a roupa e calçado que lhe traziam para os catraios, os «gateaux», brinquedos e lembranças.
Quando a aldeia começou a ficar despovoada de gente o ti João propôs-se tratar dos «tchões» dos seus vizinhos.
Entretanto, ia cavando, semeando e tendo colheitas. Aproveitava as alfaias e até ficava com duas ou três vacas e eles quando viessem de «vacanças» tinham o que a terra desse. Assim, o ti João e a ti Benedita tiveram a felicidade de nunca terem saído da nossa aldeia. Saíram, mais tarde, os filhos, pois já nem escola havia para eles!…
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«Gentes e lugares do meu antanho», crónica de Georgina Ferro
(Cronista no Capeia Arraiana desde Novembro de 2020)
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