AUDIÇÃO DE TESTEMUNHAS | Na região de Sortelha é frequente ouvir falar de Bruxas! No Arquivo Nacional da Torre do Tombo encontra-se o processo de Leonor Fernandes, «Cristã-Velha», que decorreu entre 6 de setembro de 1714 e 27 de fevereiro de 1716. Foi acusada de feitiçarias e bruxaria pelo Tribunal do Santo Ofício. Apresentamos alguns extratos de depoimentos que entendemos serem pertinentes. (parte 2).
PARTE II – AUDIÇÃO DE TESTEMUNHAS
O reverendo Sebastião Pires, de Penamacor, vai fazer o interrogatório ao Casteleiro.
Primeira testemunha – Fernando Martins
«Fernando Martins, solteiro, filho de Domingos Martins, já defunto, e sua mulher Isabel Martins, testemunha nomeada do lugar de Casteleiro para depor nesta Comissão, natural deste lugar do Casteleiro, notificada que foi pelo meirinho, e dada a rol pelo Doutor Promotor (…):
– (..) Sabe pelo ouvir contar a sua mãe que a denunciada Leonor Fernandes haverá três anos, segundo sua lembrança, fora chamada pela dita sua mãe para lhe fazer mamar um bezerro que havia dias não querer mamar, por ter suspeita que a dita lhe fizera mal, por lhe ter negado algumas coisas que lhe pediu. E que tomando-a por bem lhe pedira lhe remediasse aquele mal (…).
– (…) Dizendo que ali bastava. As quais ações feitas incontinente sucedeu que a rês pegou logo na teta a mamar, como dantes, dando assim lugar à confirmação da suspeita que ela sabe fazer e tirar malefícios, e que é fama pública que a dita tem poderes de dar e tirar saúde por más artes às criaturas, e que as mesmas suspeitas teve a dita sua mãe padecendo de um mal não conhecido os bezerros, sendo chamada o curou com umas folhas de esteva… contam que à mulher de Pascoal Luís que estando de parto poderia rebentar mas parir não, sem ela vir assistir-lhe.
Também na dita vila de Sortelha ter enfeitiçado o Capitão-Mor lhe ter feito feitiços as quais palavras lhe tiravam por suas ações, e dizendo que na baranda do mesmo com uma semente de fetos reais lhe tinha feito malefícios e que se acaso o dito Capitão-Mor a pisara com os sapatos velhos, assim sucedeu com sapatos novos, lhe adviria daí a morte, segundo a dita confessou e isto ouvi contar a um seu filho Joseph de Pinna de Olival.»
Segunda Testemunha – Leonor Pinto
Testemunho de Leonor Pinto, viúva de Sebastião Luís, natural do lugar de Casteleiro. Testemunha nomeada pelo Reverendo Promotor, e notificada pelo meirinho a quem o dito Comissário fez juramento dos Santos Evangelhos em que pôs sua mão direita se obrigou e se encarregou de dizer a verdade do que lhe é perguntado, da idade de que diz ter de trinta e três anos.
«Perguntada pelo conteúdo na petição do Reverendo Promotor disse ela testemunha disse que estando parida duas vezes com leite abundante se lhe secara de repente, suspeitara dos feitiços da denunciada Leonor Fernandes, por lhe ter pedido algumas coisas anos antes e lhas negando e tornando por bem a dita lhe restituíra o leite pondo um pouco de azinho e erva, depois que depois pisaram e lha pusera nas costas, lhe fizera comer dela e bebera caldo, o que imediatamente lhe restituíra o leite; e que pedindo-lhe mais coisas enfadada de lhe ter dado algumas lhe negou um quartilho de mel e logo de repente se lhe tornara o leite secar a qual suspeita tem dela.
Parte deste povo, da qual por essa causa é aborrecida, e na quinta sendo ela partida e já chamada por poucos, a muitas que estão para parir ameaça que não hão-de parir sem ela, como foi a Maria Leal, do Pascoal Luís, deste lugar, que andando a dita denunciada a uma légua, sendo chamada rapidamente para assistir ao parto recusara vir por não ser chamada primeiro e afirmava que não havia de fazer o parto sem ela assistir e a tais horas e rogava de que assim tudo sucedeu; sucedeu o mesmo à mulher de Manoel Mendes deste lugar, a qual esteve a um passo da morte com os sacramentos, ameaçada também da mesma, logo que a assistiu se viu livre da aflição e que a mesma confessou; assim, a denunciada é de todos difamada e murmurada sem contradição, todas as ameaças são concordantes.»
Nota
(*) José Serpa – Professor de Educação Visual na Escola D.João I, Baixa da Banheira, Moita.
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«Memórias de Sortelha», opinião de António Gonçalves
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2019)
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