Nestes últimos anos deixaram a cidade do Fundão, a Congregação das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição, os Missionários da Congregação do Espírito Santo, a saída prematura e inesperada do Padre Hélder Lopes para Roma, e no mês de Novembro a Congregação das Servas de Nossa Senhora de Fátima e acabo de receber a notícia para se confirmar a médio prazo, que nos finais de Dezembro irá encerrar a Livraria Paulista.
As razões possivelmente são diversas, mas a principal é o envelhecimento, as doenças e a falta de jovens com a vocação missionária. Senti que a comunidade do Fundão e paróquias vizinhas, com a saída destes elementos ficou mais pobre. Também há razões, que a razão desconhece…
Convivi muito de perto com estes agentes pastorais, com a Livraria Paulista, com maior incidência com as Servas de Nossa Senhora de Fátima.
Nas vésperas da sua partida, além da despedida, tive uma longa conversa com a Irmã Mafalda e a Irmã Fernanda, que estão há muitos anos ligadas à Congregação, fundada pela escalabitana Luiza Andaluz. A Congregação nasceu num período anticlerical na sociedade portuguesa, com perseguições à Igreja e Ordens Religiosas. Esta é uma das razões que estas Irmãs nunca tiveram hábito, vestimentas de carácter religioso, mas sim com as suas roupas normais.
Naquela época o Episcopado Português apostava numa boa imprensa religiosa, numa atitude audaciosa para colmatar essas perseguições.
Nos princípios de 1933 já se avistavam horizontes de abertura à liberdade e prática religiosa no país, as Servas de Nossa Senhora de Fátima, também estavam vocacionadas para trabalhos tipográficos, na imprensa e livrarias.
O livro «O Itinerário de Luiza Andaluz» indica que a 13 de Junho de 1933, seguem para a Guarda, cinco Irmãs e uma apostólica (nome dado a uma candidata à Congregação), a fim de tomar a direcção da Casa Véritas, que foi o berço da União Gráfica e hoje é uma sucursal. Ali colocadas inaugurou-se uma máquina de linotipe ao serviço daquelas Irmãs. A sua missão foi alargada no campo pastoral, no exercício da catequese, da liturgia, no atendimento aos idosos e aos pobres. Também estavam empenhadas em cursos de formação de catequese e da pastoral juvenil.
Todos os anos as Irmãs faziam um relatório em que descreviam o trabalho apostólico, a partilha e disponibilidade familiar.
As Irmãs da Congregação de Nossa Senhora de Fátima, quase um século de serviços na Guarda, deixaram o seu carisma através de Grupo de Leigos daquela cidade, muito activos nas suas paróquias, ligados àquela Instituição Religiosa, chamada Família Andaluz. Todos os meses se reúnem na reflexão de um tema, em oração e partilha. Também tem participado alguns cristãos da comunidade fundanense.
Eu jovem, nos finais da década de cinquenta do século passado, na ida para a Escola Apostólica de Cristo Rei em Gouveia, ou no regresso à minha aldeia, Bismula, fazia juntamente com outros alunos residentes na raia, uma paragem demorada na cidade da Guarda, a fim de seguirmos via férrea ou rodoviária para os nossos destinos. Recordo de na Casa Véritas comprarmos a estas Irmãs uns «santinhos», estampas que retratavam diversos santos da Igreja, que oferecíamos aos nossos amigos conterrâneos.
Em 2018 a Comunidade destas Irmãs fecha portas naquela cidade, por dificuldades de mobilidade daquelas e a Congregação não dispõem de gente jovem para as substituir.
A pedido do Bispo da Diocese da Guarda, Manuel Felício, são transferidas para a cidade do Fundão e ali lhes proporciona habitação e com melhores condições de mobilidade.
Segundo a Irmã Fernanda, com longo historial missionário em Moçambique, no Fundão dedicam-se fundamentalmente à catequese, liturgia, assistência espiritual a lares de idosos, a domicílios e outros serviços necessários na paroquia fundanense.
Um dos aspectos positivos foi conhecer e partilhar a vida e a fé com a comunidade fundanense, gente muito solidária, que recebeu estas Irmãs com muito acolhimento, consideração e amizade.
Com o agravamento da saúde de duas Irmãs, não foi possível dar continuidade à sua presença e actividades cristãs no Fundão saíram como peregrinas do amor, da fraternidade da solidariedade, a Irmã Fernanda foi para a Comunidade de Santana – Sesimbra e as outras Irmãs para a Casa em Lisboa. É obra…
Quase um século ao serviço da Diocese da Guarda é muito tempo de serviço pastoral, missionário, catequético, evangelização, partilhas de vivências comunitárias, amizades, solidariedades…
Partiram em Novembro, nas vésperas do Advento, tempo sagrado de esperança e preparação para a grande festa do Natal.
Da sua residência emprestada entregaram ao Centro de Migrações do Fundão, mobiliário, utensílios de cozinha, roupas…. Partiram num carro a relembrar a idade da figura bíblica Matusalém do Antigo Testamento, e na sua bagagem de missionárias, não levaram nem ouro nem prata, trabalharam, dedicaram-se ao serviço da Fé, deram o testemunho com descrição, com honestidade, seriedade, levaram a sua simplicidade, espalharam o bem ao serviço do próximo.
Partiram com o coração rico de partilhas, de fraternidades, de alegrias, de bem servir as crianças da catequese, os idosos, a comunidade…
Partiram com olhos homicídios de lágrimas, com um coração agradecido e com saudades das gentes generosas do Fundão.
Bem-hajam, Irmãs Servas de Nossa Senhora de Fátima!
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Março de 2012)
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