No Queimoso passarsido o Augusto Simão, que tunhe acompanharsido mês rabiscos no papeloso Capeia Arraiana, apreciarsindo-os, lançarsiu-me uno desafierno na noiena reta: «Por que nentes escrevumpes uno mintroso sobre Quadrazais? Toienes é que sunhes a pensante dedada p’ ó fazunhir.» Nentes penhando esperarsa duno desafierno daquesses, penhei sim sabunhir o que galrar senentes uno «dudez!» sim teimosa. A eureca penhou cá no baixo da muchela, sim granjeira chispa de a trazunhir ó de riba.
(Carcho 17.º, continuação).
II – DEIXARSIRA A ENSINADORA
Carcho 17.º (continuação)
Das pretas-amarelas que se encontrarsiam debaixo das drepas tunhia uno certo tefe-tefe. Mas dos alacrários, eles tamém debaixo de drepas, sunhe que tunhia jeca. Una aguilhadela dele e tunhia de inhir ó curador e aiar uno lúzio tótio.
As melosas já rumoravam de cheirosa im cheirosa e já podunhia inhir ó doçante. Mas, dorido co’as espetadas. Aí tunhia de sumar a loca da aguilharsa co’a naifinha e tirarsir o picoso. Incanto no fazunhisse aquisso, sunhia levantado por tótio vento.
Sunhia relógio de inhir ós grigris nas verdinhas. C’uma falhordinha metunhida no breco, sunhia único aguilhar e o grigri vunhia cá p’ó desabrigo.
Na fráugua do Magildro primeirava a rápida de usinar e moldar usentos campais p’ó suarento do aberto que reprimeirava. Inté os gemos precisarsiam de novernas ferradas p’a passarsir estreitos e andantes que as ansiadas do Chuvoso abaixaram. Co’a Florida, gemas e brocas granjavam o cio. Sunhia preco levarsir as brocas ó broco da Torre p’a tunhirem mai tardosa una broquinha e podunhirem suquir e donar os crostos.
No tardosaria que as espigosas fumassem e mostrarsissem os chifrachos nas gradas. Inhiria adicar se pulava uno quilotre deles que passaria a certos manuarjos que os marcavam, baro cumo ferroso gebo e porosas de saltantes.
Já se adicavam apressar-se e atravessarsir andantes casamentos de avoantotos. O ensinante Evaristo marcava cada escarchado de escarchante de avoanta a quinos argiositos.
P’a que os crunhia êle?
Cumo sunhia vadio, se cair crunhia tunhir a razonada que havunhia mutas avoantas a quem no havunhiam tirarsido os escarchantes do quentinho. Ó sunhirá que os redava a alguno organismo resinado à agricultura e pulava árgio dele?!
C’o bô relógio, chegarsiram os risotas. Inhiu adicar as risas à Fonte e sunhiu escolhunido, cum bondantes atros p’a, de garras atarsidas nas costas das alombantes, saltarsir de alipantes lençados, a adicar se rapava co’s carcábios una das espalmadas depandradas de uno guitinhas. Sunhiu naquesse lúzio que os risotas cedularam de Zé Broas uno dos malutantes, oitra que mantunhiu tótio alento.
Tamém chegarsiam os latoadeiros, os tira-tomates, os que ditarsiam tapadinhos nos latões ó poiam ajuntantes nos rasos partumpidos, os gadanheiros p’a cortar os secos, os chosquiadores da quentinha das bérreas com granjeiras corta-corta e inté os quitanos voltarsiam p’ó sê cambalache de passada de gemos, a que abrunhiam a muquideira p’a cuntarsirem as brancas p’os carcábios.
Passarsira una ó donas choinas a triturar o que marcaria im Valverde e p’a quem. Satisfazunhiria tótias encomendarsas, pagantasse o que pagantasse. Acharsia que donas inhidas a Valverde nos lúzios de trabalhosa e atra ó Judiado sunhiriam abondes. O Sagrado sunhiria p’a insuar, inhir à divina e adicar a Palmira. Sunhia preco relogiar sê alento.
Passarsidos donos lúzios de tunhir negado a ensinadora, aí inhe ele c’o aglomerado fadal a andante do risco. Daqueste tempo ultimava trazunhir a naca, fazunhida im anaco, inchada. Foitar-se-ia a trazunhir novernos feitos, cumo: golpes de riscadinha africada, cascosa e solarenta, donas ó trenas juntas de rasteiras, una ó atra dobrante, unos donos quilotres de quadrados p’ó senhor Mateus e atros montes p’ó Magildro. Canto fazunhido, lucraria unos 7$50.
Espigado a espigado, enchunhiria a galhosa. Cum catrenas ó quinas inhidas daquêstas a Valverde tunhiria o sê domingueiro noverno, já c’a pagarsa ó Zé Vinhas. A aqueste lucro havunhiria que juntarsir o da passada do moca. Granjaria p’a senos embrulhados.
– O Granjeiro vunha que inconstante mai adique os triangulares ó os fachos! Sinais mai, canhos!
Nos atros lúzios ajudarsiria a méria nos suarentos do aberto, cuparia da verdosa p’ó gemo, da suquida p’ó vista-baixa e de aquecedora p’ó runfo, que inhiria golpar ó Alcambar e trazunhiria nunas galhascas im riba do gemo. Agora esturrava menos porque sunhia Queimoso. Mas sunhia preca p’a fazunhir de muquir p’a éles e p’á sórdida do vista-baixa, que acabarsiram de marcar petesguinho e que tunhiria de engrossar durante unos senos trintanários. Tunhiria de lucrar una pesanta por trintanário. Sunhia preco inhir à abrótea, às leituguês, às sarrilhês, às boldregas, ós tassóis e atras verdosas que ele suquia, p’a além das boletas dos musgosos.
Chegarsiria entretanto, novernamente, a Sant’Ófêmia e ele, c’o sê domingueiro inda acais noverno, pegarsiria no bandeirante sangrento, mai petesgo. O vrede penharia p’a mai tardosa. Sunhia muto pesarsido.
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NOVELA NA RAIA – EPISÓDIO 17 (continuação)
(publicado originalmente a 12 de Outubro de 2018)
A minha intenção é sempre a mesma. Avivar a memória da cultura de Quadrazais para que não se perca, sobretudo entre os jovens que não nasceram ou não cresceram em Quadrazais, tendo ouvido apenas dos pais e avós algumas histórias e cenas da vida quotidiana da terra onde haviam nascido, tão longe do local onde agora se encontram. Na «Novela na Raia» vou utilizar personagens reais da aldeia, tentarei descrever quadros da aldeia e narrar os factos do dia-a-dia, embora não obrigatoriamente protagonizados por estas personagens.
SEGUNDA PARTE – DEIXAR A ESCOLA
Episódio 17 (continuação)
Das salamandras negras que se encontravam debaixo das pedras tinha um certo receio. Mas dos alacrários, eles também debaixo de pedras, é que tinha medo. Uma picadela dele e tinha de ir ao médico e gemer um dia inteiro.
As abelhas já zumbiam de flor em flor e já podia ir ao mel. Mas, cuidado com as ferroadas. Aí tinha de espremer o local da pica com a navalhinha e tirar o ferrão. Enquanto não fizesse isso, era inchaço por todo o lado.
Era tempo de ir ós grilos nas relvinhas. Com uma palhinha metida no buraco, era só picar e o grilo vinha cá pa fora.
Na fráugua do Magildro começava a azáfama de fabricar e consertar instrumentos agrícolas para o trabalho do campo que recomeçava. Até os burros precisavam de novas ferraduras para passar carreiros e caminhos que as chuvadas do inverno destruíram. Com a Primavera, burras e vacas aumentavam o cio. Era preciso levar as vacas ao boi da Torre para terem mais tarde uma bezerrinha e poderem comer e oferecer os crostos.
Não tardaria que os pães ondulassem e mostrassem os cornachos nas espigas. Iria ver se apanhava um quilo deles que venderia a certos homens que os compravam, bem como ferro velho e peles de coelhos.
Já se viam correr a atravessar caminhos bandos de perdigotos. O pursor Evaristo comprava cada cascarão de ovo de perdiz a cinco tostões.
Pa que os quereria ele?
Como era caçador, se calhar queria ter a certeza que havia muitas perdizes a quem não haviam tirado os ovos do ninho. Ou será que os entregava a algum organismo ligado à agricultura e recebia dinheiro dele?!
Com o bom tempo, chegaram os comediantes. Foi ver as comédias à Fonte e foi escolhido, com vários outros para, de mãos atadas atrás das costas, saltar, de olhos vendados, a ver se apanhava com os dentes uma das bolachas dependuradas de um fio. Foi nesse dia que os comediantes apelidaram de Zé Broas um dos concorrentes, alcunha que manteve toda a vida.
Também chegavam os latoeiros, os capadores, os que deitavam pingos nos caldeiros ou punham agrafos nos pratos partidos, os gadanheiros para ceifar os fenos, os tosquiadores da lã das ovelhas com grandes tesoirês e até os ciganos voltavam para o seu negócio de venda de burros, a que abriam a boca para contarem a idade pelos dentes.
Passara uma ou duas noites a magicar o que compraria em Valverde e para quem. Satisfaria todas as encomendas, custasse o que custasse. Achava que duas idas a Valverde nos dias de semana e outra ao Sábado seriam suficientes. O Domingo seria para descansar, ir à missa e ver a Palmira. Era preciso programar a sua vida.
Passados dois dias de ter abandonado a escola, aí vai ele com o grupo habitual a caminho da raia. Desta vez tencionava trazer a saca, transformada em carrego, cheia. Aventurar-se-ia a trazer novos produtos, como: cortes de pana preta, castanha e amarelada, dois ou três pares de sandálias, uma ou outra borracha, uns dois quilos de cravos para o Sr. Mateus e outros tantos para o Magildro. Contas feitas, ganharia uns 7$50.
Grão a grão, encheria a carteira. Com quatro ou cinco idas destas a Valverde teria o seu fato novo, incluindo já a paga ao Zé Vinhas. A este ganho haveria que juntar o da venda do café. Aumentaria para seis pacotes.
– Dês queira que nunca mais veja os carabineiros ou os fachos! Cruzes, canhotos!
Nos outros dias ajudaria a mãe nos trabalhos do campo, trataria da erva para o burro, da comida para o marrano e de lenha para o lume, que iria cortar ao Alcambar e traria numas cangalhas em cima do burro. Agora gastavam menos porque era Verão. Mas era precisa para fazer de comer para eles e p’ à vienda do marrano, que acabaram de comprar pequenino e que teria de engordar durante uns seis meses. Teria de ganhar uma arroba por mês. Era preciso ir à abrótea, às leituguês, às sarrilhês, às boldregas, ós tassóis e outras ervas que ele comia, para além das boletas dos carvalhos.
Chegaria entretanto, novamente, a Sant’ Ofêmia e ele, com o seu fato ainda quase novo, pegaria no guião vermelho, mais pequeno. O verde ficaria para mais tarde. Era muito pesado.
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Notas
Abachucar – salpicar com água
Alacrário – lacrau
Boldregas – beldroegas
Boletas – bolotas
Borracha – gudra espanhola, espécie de pequeno odre para vinho
Çarangonhas – cegonhas
Cascarão – coscorão
Crostos – colostros
Gamixane – marca de químico para matar os bichos das batatas
Garrocha – vaca-loira
Majadoira – mangedoira
Vienda – vianda
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Crónica «Novela na Raia» – «Episódio 17»… [aqui]
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«Narrada no Risco», por Franklim Costa Braga
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Maio de 2014)
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