Vendo-o levar-lhe o título de campeão da Premier League, John Terry, o capitão do Chelsea, louvou-lhe muito mais do que o estilo que espalhara, em fogacho, pelos campos de Inglaterra (e não só…): «Podia ver o United só para ter o prazer de ver Cristiano Ronaldo jogar. Ele faz coisas que mais ninguém no Mundo faz. No seu melhor, quase ninguém consegue pará-lo. Esta época mostrou tudo o que tinha para mostrar no relvado. É o melhor do Mundo.»… (Parte 15).
Com Nereida mais picante (e mexeriqueira…) pelos tablóides ingleses,
Ferguson correu a apanhar jato privado e no Algarve avisou Ronaldo:
«Preferia dar-te um tiro a vender-te…»
(e antes disso espantoso foi como o transformaram em «Goal Man»
falando-lhe de Bjorn Borg e mostrando-lhe vídeos de Muhammad Ali)…
(Continuação)
Ao dar-lhe o prémio da Associação de Jogadores Profissionais de Futebol para Jogador do Ano e para Melhor Jovem da Premier League (dobradinha que, antes de si, só Andy Gray conseguira em 1977), Gordon Taylor, o seu presidente, largou-lhe o encómio em tom semelhante:
– É o mais entusiasmante jogador em Inglaterra. A rapidez dos seus pés e as qualidades técnicas que possui fazem pensar, em alguns momentos, que Cristiano Ronaldo não é deste planeta.
Ryan Giggs lançou o elogio por outro lado também, notando que só com um «caráter muito especial» se poderia ter dado a volta ao «caso Rooney» como ele deu – e, a talho de foice, Tom Oldfield sublinhou-o:
– Ameaçava ser o mais estranho e infeliz ano da vida de Ronaldo, mas afinal foi um sonho tornado realidade. Passou de vilão a herói no espaço de 12 meses, numa espantosa resposta a vaias, insultos, ataques…
O destino tem caprichos assim: por outubro de 2007, fez, frente ao Cazaquistão o jogo 50 pela seleção de Portugal – e, entre os vários outros prémios que foi colhendo de lés a lés, exaltou-se-lhe o «Player of the Year dos Football Writers». Não deixou, igualmente, de ver pela primeira vez o nome lançado à corrida para o «Melhor Jogador FIFA de 2007». Pelé não acreditou que o pudesse ganhar:
– O melhor do mundo é Kaká, sem dúvida, Cristiano Ronaldo ainda só é o melhor em Inglaterra…
e foi mesmo Kaká quem ganhou, Ronaldo foi terceiro, segundo foi Messi. A France Football também deu a Kaká o seu «Ballon d’Or» – e aí Cristiano já foi segundo.
As comparações com David Beckham já não se esgotavam simplesmente no número que tinha nas costas: o 7 – e, a cada dia que passava, Cristiano Ronaldo tornava-se, cada vez mais insinuante, ícone para lá dos estádios. Associado à Gucci, à Prada e à Louis Vuitton, ao lado Jessica Miller fizera, em furor, campanha (em tronco nu…) para a Pepe Jeans – e à Four Four Two confidenciou-o:
– Gosto destas coisas e se é algo com que me identifique, é ainda mais estimulante. Mas não, não me sinto modelo, nem isso é coisa que me possa distrair do futebol.
Ronaldo admitiu poder imitar Cantona, aventurar-se a Hollywood como ator – mas só quando tivesse a carreira de futebolista fechada. Tom Oldfield notou-o:
– Não há sinais de que a sua fama se evapore nos próximos tempos, antes pelo contrário…
e, a Alex Ferguson (que já se atrevera a compará-lo a Pelé e a Maradona no seu destino), quando lhe perguntaram se não temia que a avalancha de elogios (os dele e os do outros) não poderia ser perigo para Cristiano Ronaldo, o treinador do United afiançou-o:
– Esse problema só existe quando os jogadores ficam vaidosos e começam a gostar disso. No Cristiano não existe absolutamente nenhum sinal de que ele se possa perder por isso. Antes pelo contrário. Em Manchester amadureceu maravilhosamente e só quer uma coisa: ser sempre melhor, o melhor jogador do Mundo. A sua melhoria esta época foi extraordinária. Em termos de futebol de alto nível onde é que se encontra um extremo que tenha marcado 23 golos como Cristiano marcou nesta temporada?
Muito mais espantoso estava para vir – e não foi preciso esperar muito. Rio Ferdinand pô-lo (e ao seu futuro) polvilhado de poesia:
– Quando Cristiano chegou ao Manchester, exibia-se bastante – era como um pónei a exibir-se. Queria driblar, só driblar – mostrar aos adeptos como era bom, colocar toda a gente aos seus pés. Quando se deu conta de que, assim, iria acabar como um produto de exposição apenas e que, para ser o melhor jogador do mundo, teria de marcar muitos golos e ter mais importância em todos os jogos, passou a esforçar ainda mais para ser esse homem, a sua grandeza…
Como se transformou Ronaldo de «showman» em «goal man»
Essa transformação de «showman» em «goal man» começou a dar-se-lhe ao raiar da temporada de 2007/2008. Com a Premier League na sua terceira jornada, saiu expulso de jogo com o Porthsmouth porque, cansado, ante os seus dribles e os seus enleios, de sofrer entradas ríspidas e faltas de rudes de Richard Hughes, esquentou-se – e deu-lhe uma cabeçada. Punido com três jogos de castigo, Alex Ferguson pôs Ronaldo nas mãos de um dos seus assistentes: René Meulensteen – que Carrington tinha como «Especialista no Treino de Desenvolvimento de Competências». O United descobrira-o na seleção sub-18 do Catar, depois, ao largar bem cedo a carreira de futebolista, ter dado os primeiros passos como treinador na formação do NEC Nijmegen.
Ao chegar, meses antes, a Manchester tinha por baixo do nome, no seu cartão de apresentação, a função posta em traço espirituoso: «pediatra do futebol» – e Luís Miguel Pereira revelou-o no seu «Duelo Nunca Visto»:
– Foram dias intimistas e mágicos entre os dois profissionais, isolados no centro de treinos em Carrington. O técnico desenhou um diagrama onde ressaltavam as caraterísticas de CR7 como jogador: há a consciência tática, composta por compreensão e tomada de decisão; há o físico, materializado na força, resistência e agilidade; há a personalidade, em que é fundamental uma mentalidade ganhadora e atitude; finalmente há a técnica, o básico, passe, remate, desmarcação e outras valências para ganhar o um-para-um. «Em que é que tu és bom?», perguntou Meulensteen. «Técnica», respondeu Ronaldo. «OK, então com o um-dois, mais a capacidade de movimentação que tu tens, vamos tornar-te imprevisível e assim muito difícil de marcar para os defesas».
«Tens de aprender a jogar futebol como Bjorn Borg jogava ténis» (e o homem que lhe estava a mudar a vida também lhe mostrou vídeos de Cruyff, Pelé e de… Muhammad Ali)
Antes de lhe refinar outras virtudes, René Meulensteen centrou-se nessa, afirmando-lhe (ainda não tão provocador como haveria de ser depois):
– Quando te rasteiram, a imagem que vemos é de uma pessoa que pensa: Ahhh… não me pode rasteirar, eu sou o Cristiano Ronaldo. Tens de aprender a jogar futebol como Bjorn Borg jogava ténis, como Roger Federer jogar ténis: «Frio!» Se o adversário deixar de te rasteirar, isso é mau sinal. Significa que encontrou outra forma de te parar. Tens de querer que eles te rasteirem. Para isso é fundamental que, vendo o defesa a aproximar-se, sejas inteligente em vez de seres emotivo…
Depois de Meulensteen ter entregue a Ronaldo, vídeo com imagens de Muhammad Ali e Pelé (por entre citações sobre vontade, espírito de sacrifício, fé e empolgamento – fez mais:
– Mostrei-lhe clipes de Cruyff, um especialista a evitar tackles. Ele sentia a aproximação dos adversários, simulava uma mudança de direção e eles deslizavam à sua frente. Depois expliquei-lhe: o mais importante, Ronaldo, é a tua expressão facial. Não reajas a nada. Derrubam-te? Levanta-te e limpa-te – que os defesas ficam, desesperados, a pensar: «O que é que eu posso fazer mais, então?!» Domina-os com as tuas qualidades, deprecia-os com a tua habilidade e joga sempre a pensar que tu é que tens o controlo de ti, não é mais ninguém!
René Meulensteen passou, então, ao outro lado da estratégia, da estratégia para fazer dele goleador (mais certeiro e ávido). Conhecendo-lhe o ego, abriu com a primeira das «três armas fatais» que idealizara para a sua missão, a que denominou: «acusação»:
– O teu problema de finalização está muito relacionado com a tua atitude e, portanto, com a tua tomada de decisão. Quando estás a jogar procuras sempre ser o centro das atenções, como se não te calasses de dizer: «Olhem para mim, tão bom que eu sou!» Portanto, estás a fazer um monte de coisas que não significam nada para os teus colegas.
Não tardaria que Gary Neville, visse, num ápice, a diferença a sair-lhe, fulgurante, dos pés (cada vez com mais cabeça):
– Constantemente em busca das fraquezas do adversário, detetava-as rapidamente. Procurava quem defendesse pior ou quem não gostasse de jogar com atacante tão poderoso como ele e fazia-lhe a vida num inferno. Se as coisas não estivessem a resultar de um lado, mudava para o outro ou para o sempre – e assim, as coisas, acabavam sempre por resultar melhor e melhor…
Continuando a espicaçá-lo, René Meulensteen avançou para a segunda «arma», a que chamou «acusação»:
– Estive a ver os teus golos da época passada e só marcaste 23. Sabes porquê? Porque tu queres sempre marcar golos perfeitos. «Olhem para mim! Canto superior!» Nunca te esqueças, Ronaldo, de que o indivíduo mais importante é aquele que eleva a equipa e não o próprio. Tu achas o contrário. Muda: eleva a equipa e a equipa vai elevar-te, depois.
Da conversa soltou-se, enfim, a terceira «arma fatal»: o «desafio». Meulensteen perguntou-lhe, de fogacho:
– Quantos golos achas que podes marcar esta época?
Ronaldo exclamou-lhe (sem pestanejo):
– Entre 30 e 35!
e René alvitrou-lhe:
– Pois eu acho que podes marcar mais de 40 e para marcares mais de 40 vamos começar já no campo a trabalhar a tua finalização!
Desataram a sublimá-la, a sós, num criativo processo revolucionário – René Meulensteen contá-lo-ia:
– Durante uma semana, em Carrington, treinámos diferentes cenários. Atribuiu cores aos quatro cantos da baliza. Cristiano Ronaldo ficava de costas, recebia a bola, gritava a cor e chutava para o respetivo canto. Era, assim, treinado para associar uma imagem da situação ao resultado desejado: «Onde estou? Onde está o guarda-redes? Qual a melhor solução?» – era, de forma subconsciente, o cérebro a trabalhar.
Para além de continuar a fazer (e melhor) o que já fazia: trucidar defesas, enredá-los nas suas estonteantes fintas, Ronaldo não demorou tornar-se no que Tostão (campeão mundial pelo Brasil de Pelé que também é cronista de boa estirpe) afirmaria que ele se tornou:
– Cristiano Ronaldo talvez seja o jogador com melhor técnica para finalizar de todos os tempos.
E, para que assim fosse, ao trabalho mental de Meulensteen, seguiu-se o trabalho de depurador de Carlos Queiroz que em «Cristiano Ronaldo – Sonhos Realizados» de Enrique Ortego lhe levantou assim os véus (pondo-lhe, ainda, certeira poética premonição):
– Regressando do Real ao United, comecei a trabalhar com ele de manhã, à tarde e à noite. E digo noite porque era a essa hora que preparávamos os seus treinos específicos para o dia seguinte. Eu tinha trabalhado com muitos talentos, como Figo, Rui Costa, Paulo Sousa, João Vieira Pinto… mas rapidamente comecei a sentir que o seu potencial era único: as suas capacidades, as suas virtudes, o seu talento. Era um super em tudo. Aim, apercebi-me de que estava diante de um super-homem. Em toda a minha vida, nunca tinha visto uma criação de Deus no campo como ele. À medida que o tempo passava, parecia-me perfeito, vendo nele tudo o que encontrava de melhor nos grandes jogadores que treinei: a criatividade de Figo, a potência de Ronaldo Nazário, a elegância de Zidane. O melhor de todos eles, num só. Para mim, Cristiano é o Michael Jordan do futebol. Tem um dom divino e creio que nos próximos 10 anos será para o futebol o equivalente ao que Jordan foi para a NBA. No início, Michael era um solista: brilhava ele, jogava para ele, a estrela era ele. Aos 33 anos era um maestro que ensinava os outros e fazia jogar os outros. Já não se percebia se era base, ala ou poste. Irá acontecer o mesmo a Cristiano: não se saberá se é avançado ou extremo, será o jogador de futebol à volta do qual toda a equipa girará…
A 12 de janeiro de 2008, o seu primeiro hat-trick no Manchester United teve por vítima Shay Given na vitória por 6-0 ante o Newcastle (de Michael Owen). Deixou o relvado de Old Trafford com a bola do jogo debaixo do braço, no balneário Ryan Giggs assinou-a e, por baixo do autógrafo, colocou a frase: «Not bad». A esse «nada mau» juntou-lhe o conselho (que já lhe largara de outras vezes) que não insistisse em atirar à ribalta o que era o seu sonho: «ser o melhor do Mundo», sublinhando-lhe:
– Isso vai pô mais pressão à tua volta…
e Quinton Fortune contá-lo-ia:
– Cristiano riu-se e, muito senhor de si, disse a Ryan: «Eu consigo lidar bem com isso, sei lidar bem com coisas piores do que isso.»
Com março no fim, soltou-se-lhe dos pés ainda mais empolgante pedaço de imortalidade: ao minuto 17 da jornada 17 fez, de calcanhar, ao Aston Villa, o seu golo 17 – um golo que Tom Oldfield eternizou assim:
– Uma obra-prima, de pura classe, momento inesquecível para qualquer avançado com fé nas suas melhores habilidades, esse portento de técnica foi marcado pela magia do simbolismo dos números, como se fosse um momento predestinado.
Mas 17 dias antes, sinal do terror que criara já nas equipas que tinha de defrontar, vivera-se em Lyon (para a Liga dos Campeões): na ânsia de o travar (ou de o desconcentrar), adepto do Olympique usou raio laser (que lhe atirava das bancadas aos olhos) sempre que via Cristiano a aproximar-se em perigo e frenesim da sua baliza. (O caso levou a multa da UEFA de 3675 euros – e haveria de repetir-se, depois, em Barcelona e em Múrcia, quando Ronaldo já saltara para o Real).
Tendo por vezes de jogar a fintar dores, bateu (por três) recorde de George Best que, pelo Manchester United, marcara 32 golos na época de 1967/1968.
Cada vez mais comparado a George Best, com Nereida na sua vida…
A 18 de março de 2008, Alex Ferguson dera-lhe pela primeira vez a braçadeira de «capitão» – e Cristiano Ronaldo retribuiu-lhe com dois golos ao Bolton. Sem que se comparasse ao que fora a vida de Best, Ronaldo não deixava, porém, de andar em furor também pelo que era a sua vida fora de campo – e, por esses dias, arrastava consigo Nereida Gallardo. Auxiliar de enfermagem, lançara-se a modelo para pagar curso de Dietética e Nutrição – e conhecera Cristiano numa boate de Palma de Maiorca (onde, então, vivia).
Se rumores anteriores de relacionamentos com Luciana Abreu, Núria Bermúdez Karina Bacchi, Carolina Patrocínio, Bipasha Basu, nunca passaram disso mesmo: de rumores, andando-se por abril de 2008, o «Daily Mail» publicou a primeira foto de Cristiano Ronaldo com Nereida – a chegarem, de mão na mão, a um restaurante em Chesire – horas depois de com golo seu o Manchester United ter ganho ao Arsenal, mantendo-se, assim, imparável na corrida para o título de Premier League (numa altura em que já se tornara o mais caro jogador da história do Manchester, recebendo só de ordenado 120 mil libras por semana).
E, num ápice, aconteceu o que Luca Caioli revelou em «Cristiano Ronaldo – A Perfeição é o Limite»: «Na Net começaram a multiplicar-se as fotografias de Nereida em que às vezes, aparece, vestida. Também são feitas entrevistas a pessoas conhecidas que a definem como uma rapariga capaz de fazer qualquer coisa pelo dinheiro e pela fama. A mãe de Ronaldo não gosta nada do que vê, e muito menos do que lê, em relação a Nereida, mas o jogador continua com ela. Nereida assegura publicamente que se vai casar com Ronaldo se Portugal ganhar o Europeu…»
Na primeira Champions, o penálti falhado…
Antes do Europeu, jogou Ronaldo a final da Liga dos Campeões. O caminho para lá passara por Alvalade (na fase de grupos): o United ganhou ao Sporting por 1-0, o golo saiu da sua cabeça, após cruzamento de Wes Brown. Ronaldo atirou os braços para as bancadas, como se, emotivo, lhes pedisse desculpa, percebeu-se que os adeptos lhe responderam em perdão – e a maioria deles em aplausos até (e esse foi o seu primeiro golo para a Champions) fora de Old Trafford.
Essa final da Champions foi em Moscovo, contra o Chelsea – já sem José Mourinho e a Avta Grant, o seu novo treinador, ouviu-se:
– Não bebo álcool, mas vai haver uma exceção. Vou beber um copo de vodka com Abramovich porque vamos ganhar!
Não, não ganharan – mas esteve quase. O Chelsea até jogou melhor que o Manchester, mas perdeu o desempate por penáltis. Por entre o brilho de uma noite quase perfeita, a Ricardo Carvalho ficou-lhe a sombra de falta feia sobre Ronaldo (que lhe valeu o amarelo) – e consternado saiu do Luzhniki Stadion (que antes da remodelação que lhe fizeram se chamava Lenine, estátua de Lenine continuava à sua entrada):
– O duelo com Ronaldo? Ele jogou mais nas alas e encontrámo-nos poucas! Estivemos muito perto de ganhar esta Champions, mas acabámos por não ter sorte. Quando o Cristiano Ronaldo falhou o penálti e depois do Ashley Cole marcar por nós, pensei que estava ganha, mas depois…
Sim, Cristiano Ronaldo falhara o terceiro penálti do Manchester, John Terry atirara ao poste o quinto do Chelsea, a Liga dos Campeões saiu da defesa de Edwin Van der Sar ao remate de Nicolas Anelka – e por entre a euforia afirmou:
– Foi o meu momento Hans van Breukelen.
(Van Breukelen fora o guarda-redes que, em 1988, dera ao PSV a Taça dos Campeões que o Benfica perdeu no penalty de Veloso.)
O desempate terminou com 6-5, o primeiro penálti do United marcou-o Carlos Tévez. Nani também cobrou, perfeito, o seu:
– Mesmo depois da falha do Cristiano, não deixei de estar como estava… confiante. Quando o Cris chegou ao meio-campo abalado, disse-lhe que ficasse tranquilo porque a Champions seria nossa – e tinha um feeling de que o Van der Sar acabaria por defender pelo menos um dos pontapés… E o que aconteceu, depois, é fantástico.
Fora com cabeceamento indefensável a desafiar a lei da gravidade que Cristiano Ronaldo abrira, aos 26 minutos, o placard desse Manchester United-Chelsea. Depois, quando, no desempate, lhe coube marcar o penálti, permitiu defesa a Petr Cech – e viu-se-lhe como, a custo travou as lágrimas. Minutos depois, no regresso ao júbilo, Luís Filipe Simões, enviado-especial de «A BOLA» a Moscovo, apanhou-lhe:
– Ao falhar o penálti, pensei que sairíamos dali derrotados e teria sido o pior dia da minha vida. Não foi, foi o dia mais belo da minha vida!
A frase: «O dia Mais Belo da Minha Vida» fez a manchete de «A BOLA» – e a Ronaldo (o Melhor Marcador dessa edição da Champions) ainda se lhe escutou (por entre emoção picada):
– Persegui muito este título!
Juntando a Liga dos Campeões à Premier League (ganha com mais dois pontos que o Chelsea e mais quatro que o Arsenal) e à Charity Shield também calçou (pela primeira vez) a Bota de Ouro. René Meulensteen não falhara o prognóstico: ao longo da época fizera 42 golos (em 49 jogos) – e, no balanço dessa época de 2007/2008, escreveu-se no «The Guardian»: «Ninguém poderá objetar legitimamente a que Cristiano Ronaldo se tornou o atacante mais devastador do Mundo.»
«Heróica» a participação no Euro 2008, com o calcanhar a atirá-lo a operação imediata
De Moscovo levara Ronaldo a Champions – e a lesão agravada com nova pancada no tornozelo tornou-lhe inevitável a operação. Contudo, antes de se sujeitar à mesa do cirurgião, jogou o Euro 2008 – e, com ele fazendo apenas um golo à República Checa (de Petr Cech), Portugal ficou-se pelos quartos, eliminado pela Alemanha (por 3-2). António Gaspar, o seu fisioterapeuta (e da seleção) não deixou, contudo, de o admitir:
– A sua participação no Euro foi heróica!
Para poder jogar, enganava-se-lhe a dor com anti-inflamatórios, mas 20 minutos depois de entrar em campo o tornozelo começava a inchar de novo – e a dor voltava a atazaná-lo, horrível era quando se chegava ao fim da partida.
A 7 de julho de 2008, 19 dias depois do Euro acabado, Cristiano Ronaldo entrou na sala de operações do AMC Hospital (em Amesterdão) – e a equipa de Cornelius Nicolas van Dijk tratou-lhe do desprendimento de dois fragmentos de cartilagem que lhe causavam inflamações constantes – e o que não se suspeitava era que tal não bastasse para lhe resolver o que se tornara, apesar de tudo, o seu calcanhar de Aquiles.
Pelos jornais britânicos andara Nereida Gallardo cada vez mais comparada a Victoria Beckham – e fotos dela com Cristiano Ronaldo nas praias da Sardenha (após a conquista de Moscovo) puseram paparazzis em virote e euforia – o que não se imaginava era que, afinal, as «imagens de felicidade» que eles vendiam «a peso de ouro» estivessem a caminho do fim, o seu «tórrido romance» não chegasse, sequer, a 2 de dezembro de 2008, dia em que a «France Football» o anunciou (em pompa) vencedor da edição 53 da Bola de Ouro com 446 votos em 480 possíveis (Lionel Messi, o segundo não passou de 281) – e não, não foi nada que não se esperasse. Três dias antes, Ronaldo revelara-o à «Gazetta dello Sport»:
– Acho que fiz mais do que ninguém para o conseguir…
e quando o repórter lhe falhou do Euro 2008 como a única sombra da temporada, Cristiano lembrou-lhe:
– Em todos os jogos, era como ter uma faca cravada no pé. Não quero voltar a sentir o mesmo. Era torturante, do ponto de vista psicológico também.
A «Bola de Ouro» da «France Football» recebeu-a, claro, em Paris – com Dolores, a mãe, Elma, Kátia e Hugo, os irmãos, na plateia – todos eles «felizes com lágrimas». Emocionado se vira ao escutar elogios gravados em vídeo de Evra, Kaká, Anelka, Benzema, Eto’o, Scolari – e ainda mais quando, de súbito, subiu Alex Ferguson ao plateau e soltou em clamor:
– Cristiano merece esta Bola de Ouro, a Bola de Ouro que o Manchester United esperava há 40 anos, pois foi há 40 anos que George Best a ganhou. Ronaldo é bom, aliás, muito bom. Amadureceu tão depressa que nem eu próprio o poderia imaginar quando ele se juntou a nós há cinco anos. O que mais me agrada nele é a sua bravura e a sua coragem. A coragem no futebol é como na vida. Reconhece-se de várias maneiras. A coragem de não perder a bola independentemente de ser acossado e desarmado pelo adversário. Isso é inato nele. Não tem medo. Tenho visto poucos jogadores tão valentes como Ronaldo. Quem pensa que ter coragem no futebol é roubar a bola ao adversário, engana-se. Ser corajoso é ter a bola, querê-la e jogá-la. É uma coragem moral e só os muito grandes a possuem. Sim, Ronaldo é já um deles e tendo apenas 23 anos o melhor de si ainda está para vir, eu sei…
O «The Sun» a falar do fim do romance com Nereida para não levar confusão ao balneário do Real Madrid
O «The Sun» já espalhara, sensacionalista, a notícia: «Ronaldo separou-se de Nereida por descobrir que ela teve caso amoroso com Sérgio Ramos e, segundo amigos dele, Cristiano não gostou da possibilidade de terem de se cruzar nos balneários quando se juntar à equipa de Madrid» – e, por janeiro de 2008, já Dolores Aveiro se deixara fotografar com uma camisola do Real, exclamando-o (mais ou menos insinuante)
– Morreria feliz se o Cristiano fosse para Madrid.
Seis meses depois surgiu Ronaldo a dar ainda mais mistério ao que já nem sequer era apenas rumor a fogachar:
– Disse milhares de vezes que tenho um sonho: jogar em Espanha. Sei que, às vezes, os sonhos nunca se tornam realidade, mas eu continuo a sonhar. Estou contente no Manchester United, mas ninguém sabe o que se passará no futuro…
Não tardou, pois, que jornais espanhóis desfizessem o secretismo da operação: que Ramón Caldéron acenara com 9,5 milhões de euros de ordenado líquido anual a Ronaldo e que o Manchester United estava disposto a dar 80 milhões pelo seu passe.
Empertigado, Alex Fergunson correu a condenar a «falta de ética do Real» (e ainda comparou, em remoque, o clube à «ditadura de Franco…) e apresentou queixa à FIFA por «comportamento inaceitável para com Cristiano Ronaldo».
Surpreendente (ou talvez não) foi Joseph Blatter (depois da parada subida para 88 milhões…) ter dito que o Manchester deveria deixá-lo sair, sem deixar de falar em «escravatura moderna» (no caso dos contratos de longa duração).
Queiroz telefonou do Algarve e Fergusson correu a apanhar o primeiro avião (e foi assim que afastou Ronaldo de Madrid)
Sem que, todavia, já se tivesse anunciado que tomaria o lugar de Luiz Felipe Scolari como selecionador nacional, Carlos Queiroz estava de férias em Portugal – e, de um alvoroço para outro, ligou para Manchester (sem esconder preocupação):
– Boss, tenho o Cristiano comigo e preciso de si aqui…
Alex Ferguson apanhou o primeiro avião que lhe servia e ao correr para a casa de Queiroz quem lhe abriu a porta foi Ronaldo que, espirituoso, brincou:
– Mas se eu só contei do Real Madrid ao Carlos há três horas como é que o senhor levou tanto tempo a chegar?
e o treinador retorquiu-lhe:
– Teria chegado mais cedo, mas infelizmente ainda não há viagens no tempo em Inglaterra. Mas vamos já ao caso, diz-me, diz-me tudo o que o Calderón te disse!
Não foi preciso dar muito à conversa para que Ferguson o afirmasse:
– Cris, sei que queres ir e sei que sempre sonhaste jogar no Real…
Ronaldo ainda lhe soltou o murmúrio:
– Sir, sou o jogador que sou por causa do United, estou-lhe eternamente grato e só quero fazer o que está certo…
e Alex Fergusson não perdeu, então, ensejo de lhe lançar o ataque ao coração (e tudo isso está contado em «Cristiano Ronaldo – A Ascensão de Um Vencedor» de Michael Part):
– Sim, é verdade. Fizemos de ti o jogador que és, mas isso é só um lado da história. Devolveste o entusiasmo à equipa quando mais precisávamos. Trouxeste-lhe expressão pessoal, uma coisa que já não tínhamos há umas quantas épocas. Sei porque é que o Calderón te quer. Sei que ele anda a dizer ao mundo que vais estar em breve a jogar pelo Real Madrid. Querem pagar-te mais dinheiro do que alguma vez um futebolista ganhou, porque querem marcar uma posição: que o Real Madrid é o melhor clube do Mundo. Mas tem de ser tudo como ele quer. Se eu aceitar isso, perco a honra, perco tudo, e não me importa que fiques sentado no banco. Sei que não vamos chegar a esse ponto, mas tenho de te dizer que não te vou deixar sair este ano. Percebes o que estou a dizer? Tem tudo a ver com respeito…
Ronaldo assentiu-lhe de cabeça a balançar – e ouviu de Ferguson o bramido:
– Já te disse. Não tenho dúvidas, sei que queres muito o Real Madrid mas da maneira como o Calderón está a fazer isto, prefiro dar-te um tiro a vender-te…
Ronaldo riu-se e do riso partiu para a decisão fechada… que, então sim, aceitava o que o treinador lhe afiançara: que o Manchester United se comprometa a que, no ano seguinte, se ele continuasse a desejar sair, o deixaria ir embora.
Não, Ferguson não se esquecera: ao acabar de ir buscar Cristiano Ronaldo ao Sporting, atirara a Carlos Queiroz a pergunta (sem lhe disfarçar a premonição):
– Quanto tempo achas que o vamos conseguir manter aqui?
e, recebera, em resposta:
– Sir, se conseguir cinco anos é porque lhe saiu a lotaria…
Com a sua argúcia, conseguiu, contudo, um ano mais do que os cinco da aposta (como se veria…) – e estando-se já nos primeiros dias de agosto, Cristiano Ronaldo penitenciou-se (em entrevista a Bruno Prata, no «Público»):
– Posso confirmar que na próxima época jogarei de novo no Manchester United. Alex Ferguson ouviu as minhas razões. Eu ouvi as dele, e ficar em Inglaterra é a melhor solução para mim. E antes que alguém diga que vou jogar sem me sentir feliz, quero esclarecer uma coisa: quem o disser ou escrever é mentiroso. Jogarei com todo o coração, darei o máximo pelo Manchester e honrarei a camisola como sempre tenho feito. É verdade que fui eu que criei este caso exprimindo publicamente o meu desejo de ir para Madrid. Durante um certo tempo esperei que o United desse luz verde à minha saída. Se dissesse o contrário mentiria. Reconheço, pois, que, de maneira involuntária, fui responsável por uma relação de conflito entre os dois clubes.
Depois do romance acabado, os mexericos (ou pior) de Nereida a querer ganhar dinheiro assim…
Ainda durante o seu romance, o tablóide «News of the World» pagara Nereida Gallardo para ela aparecesse numa sessão de fotos em topless (e diáfana lingerie) – facto que logo se soube ter «irritado» Cristiano – e para que contasse ao «Correio da Manhã» por que deixara de ser namorada de Ronaldo exigiu que lhe desse 45 mil euros. O jornal achou demais – e não tardou que os «segredos do namoro e do seu fim» (e outras intimidades com Ronaldo…) aparecessem com ela no «News of the World» («secreto foi o cachet»), com ela a contar que «tudo acabara», afinal, através de um SMS:
– Nesse ponto é um cobarde, um cobarde sem coragem para terminar uma relação, cara a cara.
Não, não foi só: desvendando-lhe ainda o «lado metrossexual» (que passava por depilações e creme hidratantes) e as suspeitas de traição descobertas no telemóvel, Nereida soltou de si confidências (em mais em ressaibo):
– Acabei por compreender que o maior amor de Cristiano Ronaldo é… ele mesmo. A casa dele está cheia de espelhos que ele usa para se admirar a si próprio, tem uma obsessão pelo número 7 e cada vez mais espalha as suas iniciais, o CR por todo o lado: das maçanetas das portas às toalhas do banho. Está sempre a ligar à mãe e não me surpreenderia se a sua próxima namorada fosse ela que a escolhesse…
Luca Cioli também o revelou no seu «Cristiano Ronaldo – A Perfeição é o Limite»:
– Nereida não se dá por vencida e tenta tudo para conseguir que Cristiano Ronaldo mude de ideias.
Meses depois da separação, chega a assediá-lo à entrada de uma discoteca em Palma de Maiorca, graças à cumplicidade de um programa romântico de televisão. Mas as coisas não chegam a lado nenhum e Nereida dedica-se a rentabilizar a sua história com entrevistas a jornais, canais de televisão, com mais uma ou outra pose nua…
O segredo de Pelé antes de o anunciar o «Melhor do Mundo»
Com o seu «sonho de pequenino» adiado, esse sonho de jogar no Real Madrid – a 15 de novembro de 2008, Cristiano Ronaldo marcou ao Stoke City o seu golo 100 pelo Manchester United. Ainda colheu outro título: o Mundial de Clubes em Yokoama (ganhando a final à Liga de Quito, surpreendente vencedor da Taça dos Libertadores) – e, tendo já recebido a «Bola de Ouro» do «France Football», surpresa seria que não sucedesse o que sucedeu na Gala da FIFA, na Opera House de Zurique (a 12 de janeiro de 2009).
Candidatos a FIFA World Player 2008 eram também Lionel Messi, Fernando Torres, Kaká e Xavi Hernandez. Silvie Meis, a apresentadora do espetáculo que era mulher de Rafael van der Vaart (então jogador do Real Madrid), chamou Pelé para a apresentação do vencedor, ao subir ao palco tropeçou num degrau da escadinha, livrou-se da queda, pegou no microfone, abriu o envelope – e, depois de um sorriso, exclamou:
– Tenho de contar isto. No ano passado, após entregar o prémio a Kaká, apertei a mão a Cristiano Ronaldo e disse-lhe no nosso português: da próxima vou entregar o troféu a ti…
Levantando o cartão, num clamor a que não faltou emoção, ouviu-se então a Pelé:
– Cristiano Ronaldo!
Silvie sublinhou-o:
– The best football player in the world is Cristiano Ronaldo
A ele (que colhera 935 votos dos selecionadores e capitães das 155 equipas da FIFA, ficando Messi com 678, Torres com 203, Kaká com 183 e Xavi com 155) topou-se-lhe no discurso de vitória a premonição:
– É um momento especial na minha vida, muito emocionante. Tenho de agradecer em primeiro lugar à minha mãe, ao meu pai e a toda a minha família e amigos, a José… Não, não tenho de dizer os nomes, eles sabem quem são. Dedico-o também aos meus companheiros de equipa. Sem eles não poderia ter ganho este troféu aqui… É um dos meus dias mais felizes e… e… espero voltar outra vez…
O Ferrari em destroço que acabaria vendido por 10 milhões
Quatro dias antes da consagração em Zurique, Ronaldo passara por «tremendo susto». Seguindo da mansão de cinco pisos (e garagem para 20 carros) que comprara por 3,9 milhões de libras (que por 2006 equivaliam a mais de 4,5 milhões de euros) para o centro de treinos de Carrington (com o Bentley de Edwin Van der Sar, seu vizinho em Chesire, atrás de si) à beira do aeroporto de Manchester perdeu o controlo do seu Ferrari 599 GTB Fiorano F1 – que ao embater, primeiro, num rail de proteção, resvalou para parede do túnel, lá ficando com a frente praticamente toda destruída. Uma das rodas dianteiras descobriram-na 200 metros adiante – e testemunha disse, por entre o alvoroço, à BBC:
– É espantoso que Cristiano Ronaldo tenha saído dos destroços do carro sem um arranhão sequer, percebia-se, apenas, que estava agitado e nervoso com o que lhe sucedera.
(A Ronaldo, o Ferrari vermelho custara-lhe 300 mil euros, com ele fizera apenas 3099 quilómetros – e foi vendido como destroço a um negociante de automóveis acidentados. Andando-se por março de 2013, levou-o a leilão no Ebay com lance inicial de 50 mil euros – e não tardou que as ofertas subissem a 10 milhões de euros. Tempos antes, a primeira tentativa para o leiloar fora suspensa até que se tivesse «prova fidedigna» de que era mesmo o «Ferrari que Cristiano Ronaldo destruíra»…)
(Continua)
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«Às voltas da História», crónica de António Simões
(Cronista no Capeia Arraiana)
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