O som das paisagens, o cheiro e a qualidade do ar, as memórias da juventude que não se podem perder, decisões urbanísticas discutíveis e gente boa, gira e criativa e gente nem por isso… um pouco de tudo nesta «visita rápida» às minhas raízes.

Soube bem voltar ao «tchão» e ao nabal
Uma visita rápida a Ruivós com o objectivo de cortar lenha para armazenar na garagem e preparar o «Inverno raiano» serviu, também, para passar pela «cidade» do Sabugal.
Manhã cedo lá seguimos no trator do Paulo Rebelo acompanhados pelo Américo Teixeira, um homem de Vila Nova de Gaia que um dia resolveu construir um cantinho de conforto na terra da sua amada Glória. A propósito, pelo caminho, recordámos as dificuldades burocráticas e administrativas que a autarquia colocou a quem «apenas queria regressar e povoar a terra natal». Processos tontos de quem se queixa que não consegue fixar pessoas mas por outro lado tudo faz para demover qualquer sonho do cidadão anónimo que tem o «defeito» de não votar no concelho e como tal «não interessa».
Apesar de estarmos no final de Abril o tempo estava estranhamente ameno. Sem frio, sem vento e com o sol a aparecer por entre as nuvens. Soube bem voltar ao «tchão» e ao nabal onde fui muito feliz na minha infância e juventude. Já lá não está a enorme cerejeira da minha perdição onde tantas vezes trepei sem consciência dos perigos. Mas naquele tempo tudo corria bem…
Depois de cortar alguns carvalhos, rachar os cavacos e carregar o reboque do trator era tempo de voltar com a satisfação da tarefa cumprida. Soube bem respirar o ar puro daqueles lugares que serão sempre meus, que serão sempre as referências das minhas raízes e da minha vida. E com a vantagem e o orgulho de poder dizer que o meu pai e a minha mãe eram naturais da mesma aldeia.
Ao final da tarde depois de guardar a lenha na garagem (parecia muita no lameiro e agora pouca depois de armazenada) fomos até à festa do Carvalhal do Côa cumprimentar alguns amigos. Aldeia (muito) pequena de gente dinâmica onde vivem entre outros o Alexandre, o Toni e… o Artur e a Olívia que sofreram e sofrem a tragédia da perca do seu filho Davide. No salão da associação um grupo musical de Castelo Branco muito bem equipado afinava os equipamentos para proporcionar uma animada noite de bailarico.


Nova arquitectura urbana na «cidade» do Sabugal
No dia seguinte uma breve passagem pela «cidade» do Sabugal despida de gente como o Largo da Fonte está despido de árvores. Continua a ser difícil, para mim, «aceitar» esta nova paisagem do centro de visitas da capital do concelho.
Alguns reparos. As casas de banho públicas (tão necessárias quando existe uma população mais idosa) desapareceram e parecem estar «provisório/definitivas» num contentor (?!?) no parque de estacionamento bem distante do largo. Não sei se esqueceram no projeto as casas de banho ou se a obra ainda não está fechada. Mas que já passou algum tempo desde a finalização do largo, já passou.
As obras da rua que passa pelo edifício da Câmara Municipal estão em fase de acabamentos. Ao longo da mesma foram plantados dezenas de pilaretes inestéticos e que pretendem ser protagonistas (horríveis) de uma «nova ordem» de circulação rodoviária. Eu sou particularmente sensível a estas criatividades urbanísticas até porque a minha mãe tinha muitas limitações de visão e sentia dificuldade em andar por ruas que não conhecia ou tinham obstáculos «paridos» pelos arquitectos paisagísticos.
Em frente ao Museu Municipal acabaram os estacionamentos. «Temos de acabar com os carros» dizem agora alguns fundamentalistas das trotinetes mas prefiro dizer como destacam os guias turísticos que descrevem o percurso nos autocarros: «Aqui fica o Museu do Sabugal mas não o vamos visitar porque o senhor motorista não tem aonde parar o autocarro!» A exposição sobre o 25 de Abril no Museu… vale o que vale!

A beleza e a criatividade das obras do atelier da Lucinda Baptista
Mas nem tudo é mau. Ninguém consegue ficar indiferente à beleza da criatividade da montra do atelier da Lucinda Baptista. Fiquei a saber do seu orgulho no filho finalista de Medicina. Parabéns! Ao filho e à mãe!
Experiência chocante à hora do almoço
E como já era hora de almoço (mais ou menos meio-dia) eu e o meu irmão decidimos (estupidamente) optar por ir ao restaurante Ambrósio. Experiência chocante e inacreditável acompanhada pela má-educação e o desrespeito pelos clientes.
Chegámos, a sala estava vazia, e um rapaz (com ar de chateado) veio perguntar se tínhamos reserva. «Não! Não temos!» – respondi – «Então só para depois da uma e meia mais perto das duas da tarde é que temos lugares!» Quase ao mesmo tempo chegam dois casais. «Viva senhor Joaquim! Tem reserva?» pergunta o tal rapaz. «Não, não temos!» e a resposta foi a mesma que me tinha dado.
Saímos em direção ao carro mas decidi voltar para cumprimentar o Portela filho (ao que me dizem anda muito ativo por terras do concelho) e reparo que os dois casais estavam sentados à mesa. Dirigi-me ao tal rapaz e observei-lhe: «Vi o que fez. Não lhe fica bem.» O sujeito, mal-educadamente, virou-me as costas e foi em direção à cozinha. Inacreditável! Inaceitável!
Como o vereador Pedro Figueiredo estava por perto descrevi-lhe a situação e demonstrei-lhe o meu desagrado. Assim não! Não sou turista na minha terra mas o turismo do Sabugal merece melhor! Muito melhor! Mais profissionalismo, mais respeito e, sobretudo, mais simpatia e menos idiotas.
E claro, rumámos áquela que devia ter sido a nossa primeira opção e onde fomos tratados como sempre! Com educação, simpatia e profissionalismo cinco estrelas!
E como já dizia um saudoso político do Sabugal quando estava bem disposto: «Não há condições porque não há gente e não há gente porque não há condições!»

Nota final – Ti Natália da Ruvina
O café da Natália na Ruvina será sempre um lugar onde fui muito feliz. Quando passei o exame da quarta classe alcancei o meu grande objectivo: recebi uma bicicleta. E os horizontes do meu mundo alargaram-se até às aldeias da Ruvina, da Nave, de Aldeia da Dona e de Vale das Éguas onde se incluiam as açudes do Côa e onde passavamos as quentes tardes do mês de Agosto. O regresso, ao final do dia, com a íngreme subida da estrada que vinha desde o rio até à Ruvina era duro e demolidor. Chegar ao café da Natália era como chegar ao porto de abrigo para nos refrescarmos. E como sabia bem.
Foi, também, à sombra da latada das videiras no terraço do café que recordo alguns namoricos de juventude. Sempre com o sorriso e a simpatia da Natália por perto. Acho que nunca se chateou nem berrou com os nossos juvenis excessos.
Fui, há poucos dias, apanhado de surpresa com a sua partida. Ao que parece já estava doente há algum tempo mas eu não sabia. Partiu uma mulher boa.
Bem-haja Ti Natália por tudo! Ao Chico e ao filho Carlos aqui fica o meu respeito e o meu sentimento pela sua perda.
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«A Cidade e as Terras», por José Carlos Lages
(Fundador e Director do Capeia Arraiana desde 6 de Dezembro de 2006)
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