Tinham desaparecido da aldeia cinco homens. Havia já uns dias que não eram vistos. As pessoas perguntavam se estariam com alguma maleita ou se teriam ido ao contrabando e teriam sido apanhados pelos carabineiros. Nem os próprios filhos diziam nada e as suas mulheres evitavam dar «paleio» às parceiras e amigas, com receio que a guarda fiscal fosse fazer alguma «rusga».
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Foram os primeiros homens da aldeia a «darem o salto» para França.
Passaram dias, semanas, meses e não surgia qualquer sinal de vida. Só um deles tinha andado à escola e sabia escrever, mas não vinha nenhuma carta. Até parecia que toda a família andava de luto!
Então, certo dia, já ao pôr-do-sol, chegou a «camioneta da carreira» ao Pocinho, com o saco do correio cheiinho até ao «baraço» de apertar. Todos se interrogavam porque seria que o saco vinha «tão de coagulo». E ninguém arredou pé sem matar a curiosidade. Não só chegava a tão almejada carta como uma encomenda para cada uma das esposas. Vinham de Paris.
Logo ali, no curral, começaram a desatar os cordéis que prendiam o papel acastanhado e que dezenas de olhos arregalados tentavam alcançar. Lembro-me que traziam lenços da cabeça em cetim sedoso, uns de tons verde claro e outros em preto. Tinham a Torre Eiffel estampada. E receberam também saias plissadas que nunca antes tinham sido vistas por cá… «mais lindas», como lhes ouvi dizer.
E recordo aquela carta, com muitos selos e muitas folhas escritas dentro do envelope, que a esposa do ti Mostajeiro, tentava devorar com o olhar como se a soubesse ler. O que mais lhe interessava, nesse dia, era saber do seu homem, onde estava e por onde teria andado. As prendas seriam mais importantes no dia seguinte.
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«Gentes e lugares do meu antanho», crónica de Georgina Ferro
(Cronista no Capeia Arraiana desde Novembro de 2020)
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