O ti Pepe fizera a promessa a Deus de mandar o filho para o seminário. E uma promessa é uma promessa. Mas como comprar três lençóis brancos, dois cobertores, pano cru para fazer cuecas, o algodão para a sua Conceição fazer cinco pares de meias, uma mala…. Por mais que pensasse não havia solução para arranjar dinheiro.

E o ti Pepe cismava, cismava ali sozinho, ao redor do lume mortiço do serão, enquanto a mulher aconchegava os quatro cachopos mais novos na cama grande de ferro, dois aos pés e dois à cabeceira.
– Ai mulher!, meti-me cá numa alhada! – segredou ele à sua «Xão», quando ela arribou à cozinha.
– Ai homem, valha-te Deus, então que foi?
– Dizes bem! «Valha-me Deus!» Foi mesmo com Ele que eu me comprometi. Sabes, o homem que levou o ti Mostajeiro para França diz que sabe duma fábrica de loiça, onde precisam de homens com bons braços. E isso, verdade, verdadinha, braços fortes é o que eu tenho. E se eu aproveitasse a ir? Senão, como vou cumprir a minha palavra?
Entre sugestão e sugestão nem deram pela luz da aurora que levantava o lusco-fusco. Só então foram a aconchegar-se um poquenino na cama, resolvidos a ir pedir dinheiro emprestado para o passador, ao seu amigo Zé, que era como um irmão. Ele sabia da sua promessa e das suas necessidades, como mais ninguém e sabia bem que ele era um homem de palavra de honra.
Lá pelas dez horas pôs a enxada ao ombro e foi a caminho do «tchão» das poldras para passar pela casa do ti Zé. Fez-lhe o aceno habitual de quando tinham coisas a combinar. Longe de qualquer olhar o ti Pepe disse ao que ia.
– Não é tarde nem é cedo, homem. Já pensei nisso tudo! Lembras-te de quando levámos o último carreto a San Sebastian? Estavam por lá aqueles franceses a pedir homens para trabalhar nas forjas. Ainda estive tentado em ir à sorte, mas não tive coragem! Olha, vamos até lá e não precisamos de passador nenhum. Havemos de nos desenrascar.
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«Gentes e lugares do meu antanho», poesia de Georgina Ferro
(Poetisa no Capeia Arraiana desde Novembro de 2020)
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