Decorreu, no dia 27 de Janeiro, o encontro anual dos ex-alunos da Escola Apostólica de Cristo Rei, a maioria naturais da Beira Alta e Beira Baixa, residentes na Grande Lisboa. Neste ano de 2024 aconteceu na Quinta de Santo António, em Massamá Norte, Belas, contando com mais de uma centena de participantes.
É extremamente significativo conviver com companheiros das décadas dos anos cinquenta, sessenta, setenta, oitenta, noventa do século passado, e das primeiras décadas deste século.
Ninguém fica indiferente aos sinceros e apertados abraços, às recordações estudantis de uma juventude vivida em Gouveia, às muitas fotos daqueles tempos, à recordação de tantos momentos felizes, formativos, integrados numa nova comunidade.
O cenário da sala de festas, onde decorreu o almoço, também se associou ao Encontro dos Ex-Alunos, com uma exposição de diversos quadros de azulejos, com paisagens muito ligadas a tantos de nós. Lá estava o Castelo de Celorico da Beira, com o casario envolvente, por onde tantos alunos passavam, assim como a Sé de Viseu ou a Igreja de Nossa Senhora do Castelo de Mangualde que todos avistávamos diariamente dos nossos recreios e janelas de estudo e dormitório.
Convidados especiais, ninguém de renome mundial, nem engravatados, nem de renome social e político, mas sim dois missionários, desde logo o grande dinamizador, Padre Carlos Jacob, que foi um os grandes obreiros da Missão em Moçambique dos Missionários de São João Baptista e actualmente a dirigir os destinos da Escola Apostólica de Cristo Rei com todas as suas valências.
Também marcou presença o Padre moçambicano Pedro Berta, com o cargo móvel de Superior Geral desta Congregação. Depois de agradecer o contributo recebido dos antigos alunos, no processo formativo em Portugal, informou os participantes do estado de saúde do Padre José Cristino, natural de Fiães (Trancoso), um dos primeiros alunos a ser ordenado missionário. Referiu que inspira muita preocupação. Apesar de ter consulta marcada de fisioterapia em Alcoitão, não se preveem grandes melhoras. Pediu orações.
Na mesa de comunhão, da refeição, quatro jovens ex-alunos um dos anos cinquenta e três dos anos setenta, naturais da zona raiana do Sabugal, e um do concelho do Fundão, que emigraram ainda crianças para o litoral, vieram do Pinhal Novo e de Setúbal para Gouveia.
Habituados a determinados progressos e hábitos, o que mais os impressionou foi encontrar companheiros vindos do Portugal interior, que nunca tinham visto o mar, não tinham saneamento básico, água canalizada nas suas casas, nunca tinham visto o comboio, não tinham eletricidades, nunca tiveram acesso a um jornal, não conheciam as emissões da televisão. Relatam que um dos alunos, num programa de westerns na RTP, se levantou da sala e correu para a porta de saída com medos indescritíveis. Só depois de esclarecido e informado se acalmou e serenou.
Depois de passar pela Escola Apostólica nunca mais teve medo de assistir, não só aos programas da televisão, como a diversos filmes: «E Tudo o Vento Levou», «Quo Vadis», «Por Quem os Sinos Dobram», «A Túnica», «Molokai – A Ilha Maldita», «A Papoila», «Os Dez Mandamentos»… Um deles salientou que se apaixonou tanto pela Sétima Arte que, quando o filme «Laranja Mecânica» foi exibido no Cineteatro Gouveense, comprou bilhete com outro companheiro de estudos. Como não tinham idade para assistir, um deles disse ao porteiro: «Não temos aqui o bilhete de identidade, mas vamos avisar os nossos pais e vêm aqui criar problemas.» Com esta ameaça, lá os deixou entrar. Também tinham outras rebeldias próprias das suas idades, que muitas vezes resultavam no castigo de ir lavar a louça das refeições dos alunos, ficando sem acesso ao recreio.
Por outro lado, alguém que veio desse litoral nunca tinha visto neve e, de tal maneira fascinado, guardava pedaços nos bolsos, até ficar constipado.
Recordam os professores e as professoras muito competentes, dedicados e amigos dos alunos, alguns a ensinar também no sector público, na Escola Comercial e Industrial e no Colégio Nuno Álvares de Gouveia. «Quando íamos ao Liceu da Guarda, a Seia ou à Escola Comercial e Industrial de Gouveia fazer os exames secundários, as notas dos alunos da Escola Apostólica de Cristo Rei salientavam-se pela positiva, eram muito mais elevadas em relação às dos estudantes da escola pública. Quando fiz o 5.º ano e fui para Paris, falava tão bem a língua francesa, que ninguém acreditava na minha nacionalidade portuguesa.»
Aqueles padres alemães, e também muito professores, estavam muito à frente de muitas mentalidades retrógradas e mesquinhas no ensino e na formação dos jovens. Estavam noutra Galáxia…
Aquela Casa deu a todos aqueles que a frequentaram as ferramentas para progredir nos diversos caminhos das actividades profissionais. Hoje os mais velhos e reformados ainda se dedicam a serviços de voluntariado, desportivo, social, e os mais novos ainda continuam no ensino, na advocacia, na função pública, nas empresas, na justiça, na agricultura modernizada….
Ninguém esquece a mensagem do título do livro «Tanta Vida» sobre a Escola Apostólica de Cristo Rei de Gouveia, que a sua publicação coincidiu com os cinquenta anos daquele exemplar Escola.
Um encontro que ficará na memória de todos os participantes, muito positivo, com muita amizade, fraternidade, em que cada um trouxe as melhores recordações da sua estadia na Escola Apostólica de Cristo Rei em Gouveia, que nos alicerçou para a vida e cidadania.
Para o encontro de Janeiro de 2025, foi constituída uma equipa organizativa com os antigos alunos residentes em Lisboa e suas periferias: César Palos, de Nave de Haver (Almeida), responsável pelos contactos; Filipe Matos, natural de Manteigas e Paulo Renato de Loriga (Seia), responsáveis na elaboração das listas, da contabilidade e contas do encontro; e Carlos Almeida Reis de Freineda (Almeida), responsável pela logística do próximo convívio em Lisboa em 2025.
:: ::
«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Março de 2012)
:: ::
Leave a Reply