Eram quatro da tarde e parecia noite escura. O céu era um carvão apagado envolto em cinza. A minha avó avisou que vinha um grande nevão para a noite. E eu perguntava-me como é que ela sabia! Ela sabia sempre tudo antes de acontecer!…

O lume chamejava com galhos e toros de giesta deitados no cepo detrás, mas parecia que, naquele dia, não sabia aquecer-nos! Pela primeira vez não protestei por ir para a cama mais cedo, mais a mais, o meu rebolinho de pedra, estava bem quente, enrolado na camisola de lã que me deixara de servir e num trapinho de linho, que já fizera parte de um velho lençol.
– Oh!, tia, como é que a avó sabe que vai nevar?
– Ela já viveu muitos Invernos. A tua avó é muito sábia, porque presta atenção a tudo!
A minha enxerga de folhelho até parecia mais fofa do que era habitual. Depois do beijinho da tia e do meu abracinho no seu pescoço, mal dei pela noite!
Acordei ao raiar do sol e a claridade era diferente!… Fui ver ao janelo do quarto! Que lindo! Não havia rua, nem canteiros, nem nada!… Era tudo de uma alvura lisa, macia e brilhante. O céu era mais transparente que nunca e lá no ciminho mesmo, é que luzia o azul celeste! Saí disparada em direcção à cozinha e gritei: «A avó é mesmo sábia, tia!» A tia sorriu, ela sorria sempre às minhas criancices e valorizava as minhas aprendizagens de menina. E disse:
– Tu também vais ser sábia como a tua avó, se estiveres atenta ao que ela te ensina!
– Tia, a senhora também é sábia! A tia também sabe tantas, tantas coisas! Eu hei-de aprender, está bem?
– Vais aprender um «poquenino» de cada vez. Olha, vamos tomar o café e depois vamos enrolar as canelas para fazermos um tapete novo, queres? Acho que amanhã já vamos poder usar o tear!
– Ai que bom!…
Mas a tia não me viu aquela animação costumeira!
– Parece que não ficaste muito alegre, que se passa? Já sei!… Vá, vai lá pôr a touca, o casacão e as luvas e vamos ao prado!…
– Óh, minha tia, a senhora ainda é mais sábia que a minha avó!…
– Meu tontedo!, eu e a tua avó somos irmãs!
:: ::
«Gentes e lugares do meu antanho», crónica de Georgina Ferro
(Cronista no Capeia Arraiana desde Novembro de 2020)
:: ::
Leave a Reply