Há muitos anos que alimentava o desejo de escrever sobre José Augusto Gil dos Reis, facto que acontece desta vez. Este será o primeiro texto, seguindo a cronologia que entendo ser a mais correcta de uma personalidade que fez história na Panasqueira, na Guarda, em Luanda e no Fundão. (Parte 1 de 2.)

Em 30 de Julho de 1946 nasceu no lugar da Panasqueira, freguesia de Cebola (actuamente São Jorge da Beira), concelho da Covilhã, José Augusto Gil dos Reis filho de Evaristo dos Reis e de Maria Irene Gil. Quando nasceu já tinha a irmã Margarida com doze anos de idade.
Os seus pais eram naturais de São Martinho, da freguesia da Barroca do Zêzere, e o seu avô materno era administrador e proprietário em São Tomé e Príncipe, onde faleceu.
Frequentou a Escola Primária na Panasqueira e foi um dos primeiros alunos do professor bismulense, António Alves Mendes, fazendo exame da 4.ª Classe na Covilhã e respectiva admissão no Liceu Covilhanense.
Refere-me que na meninice lhe aconteceram dois factos, que puseram em risco a sua vida. Quando tinha quatro anos saiu sozinho de casa, percorreu alguns quilómetros estrada fora, passou pela localidade de Cambões, sem medo e sem a noção da distância. Chegou a noite e continuou estrada fora, quando ao longe viu um mineiro que regressava à sua morada.
Estupefacto, o mineiro perguntou-lhe o que ali fazia, respondendo-lhe que ia ver a avó a São Martinho. O mineiro pegou-lhe ao colo, colocou-o às costas e levou-o de regresso à Panasqueira, onde toda a população com archotes andava à sua procura. Os seus pais e toda a população sentiram enorme alívio, regozijo, felicidade, vivendo-se momentos de grande festa.
O segundo acontecimento: encontrou um pequeno molho de pregos de colocar quadros numa cadeira. Meteu na boca «à carpinteiro» e engoliu um deles. Transportado para o Hospital das Minas da Barroca, onde lhe localizaram um estranho objecto nos intestinos, que entrou de cabeça para baixo. Felizmente o prego teve uma saída natural, evitando uma cirurgia que seria muito complicada.
Tem na sua memória a época de cinquenta do século passado na Panasqueira, uma povoação onde trabalhava e vivia muita gente, escola primária repleta de crianças, um clube com diversas valências: casa de convívio, prática de vários jogos de mesa, um campo de hóquei em patins, onde se aprendia a patinar e realizavam jogos a nível nacional e internacional. Um pouco mais acima, situava-se uma sala de cinema, onde eram projectados os melhores filmes da época, e se realizavam espectáculos de variedades com famosos artistas. Um centro cultural, de convívio e de entretimento. Um pouco mais abaixo, a Igreja era frequentada por todos, tendo à frente um pároco dinâmico e capelão da Beraltin and Wolfram, pago pela administração desta empresa da exploração mineral.
Todos os anos se realizavam as Festas em Honra de Santa Bárbara, Padroeira dos Mineiros da Panasqueira, com muita devoção e fé, com a realização da Primeira Comunhão e do Crisma. No centro da Panasqueira estava o Coreto, onde uma Filarmónica tocava música popular para todos se divertirem.
O ambiente na comunidade mineira era de grande relacionamento, criação de laços de amizade, afinidades comuns, que permaneceram entre as pessoas através dos tempos. Dos muitos amigos, não esquece o seu companheiro de infância, António Geraldes Pinto, que mais tarde encontrou em Luanda (Angola), de regresso de uma comissão militar em Macau.
A maioria da população trabalhava nas minas e para a Barroca Grande deslocavam-se em transporte da empresa mineira os trabalhadores técnicos e de escritório.
O trabalho nas minas e as suas condições naqueles tempos eram muito difíceis. Sentia-se uma tragédia quando morriam mineiros e se sabia que outros ficavam doentes.
O pai foi despedido das Minas da Panasqueira, como aconteceu a muitos outros trabalhadores e teve de ir trabalhar para Angola.
Findo o exame da 4.ª Classe na Covilhã, concluiu o 5.º Ano Liceal na Guarda, fez exame de admissão ao Magistério Primário, obtendo êxito no final dos dois anos obrigatórios. Com este diploma, fez a aprovação de Exame de Estado com treze valores e ficou apto a dar aulas em qualquer Escola Primária.
Na próxima crónica descrevo outros pormenores deste cidadão, actualmente reformado do ensino secundário.
(Continua.)
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista no Capeia Arraiana desde Março de 2012)
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