Porcos destroem armada americana… (episódio 2)

Ao visitar Marrocos, José deu-se conta do desprezo que os naturais devotavam aos ocidentais, que culpavam da destruição da Líbia, seguidora de Alá, como eles. Mais recentemente, exigiram ao governo marroquino que cortasse relações com Israel pelo genocídio que está cometendo em Gaza.
Conversando com um deles, Youssuf, revelou-lhe que também ele se sentia revoltado com o que americanos, franceses e italianos haviam feito à Líbia e ao seu chefe Kadafi. Ficaram amigos, até porque os nomes deles eram homónimos, e prometeu-lhe que tentaria descobrir maneira de, juntamente com ele, se vingar da afronta feito à Líbia e aos palestinianos de Gaza e Cisjordânia. Regressou a Portugal e, ainda na viagem, matutou sobre o que poderia fazer.
Sabia que os americanos tinham uma base naval em Casablanca. Seriam os primeiros a sentir a sua vingança e a de Youssuf. Lembrou-se do episódio da Bíblia em que Jesus tirou os demónios de um homem da região de Gérasa, os quais entraram depois numa vara de porcos que ali estavam, a seu pedido. Os demónios tinham o nome de Legião, porque eram muitos. Os porcos possuídos fugiram espavoridos para o lago e afogaram-se.
Por que não utilizar um porco para entrar no mar armadilhado e fazer explodir um grande navio americano?
Era preciso transmitir o demónio a alguém e depois fazê-lo sair dessa pessoa e transferi-lo para um porco.
Começou a ler o Livro de São Cipriano, onde aprendeu como o demónio entrava nas pessoas, e inteirou-se junto do padre da sua terra como se tirava o demónio de uma pessoa, quais as rezas e outras acções. Até se lembrou dum certo rapaz da sua terra que diziam estar possesso e acabou dependurado da correia do munho onde o pai era moleiro. Haveria de aprender tudo sobre possessos.
Por carta, anunciou ao amigo que estaria de regresso a Marrocos num dia que marcou. O amigo esperava-o no aeroporto de Casablanca. Ficou alojado em sua casa e explicou-lhe o seu plano. Primeiro teriam de se aproximar da base americana e verificar a posição dos navios. Depois escolheriam o mais importante da frota, onde aplicariam o plano, que consistia no seguinte: o amigo Youssuf teria de adquirir um porco nalguma quinta que os criasse, embora fosse para exportação, já que ele e a grande maioria dos marroquinos seguidores de Alá não comiam carne de porco. Youssuf afiançou-lhe que isso não seria problema, já que ele sabia quem lhe venderia um porco.
– Mas, para que queres tu um porco? – perguntou-lhe intrigado em francês, língua que ambos dominavam.
– Deixa-me acabar de te explicar o plano e já verás para quê o porco. Eu vou endemoninhar o porco.
– Tu sabes fazer isso?
– Sim. Aprendi num livro. Iremos experimentar. Não digas nada a ninguém. Se chega aos ouvidos do teu imã, estamos feitos.
– Está tranquilo que ninguém saberá de nada. Aliás, toda a operação se vai manter em segredo.
– Muito bem. Onde está o porco?
– Numa quinta dum amigo.
– Precisamos duma rapariga que conheças. Ela é que vai primeiro ficar possessa e depois passarei o demónio para o porco.
– Oh, diabo! Deixa-me ver se descubro uma desgraçada a quem paguemos, enganando-a. Já sei, conheço uma.
– Vai buscá-la. Apresenta-ma.
– Olha, disse Youssuf à rapariga, este senhor vai fazer-te umas rezas. Não tenhas medo.
– Que me querem fazer? – perguntou a rapariga.
– Vamos só fazer umas rezas para tu ficares amiga daquele porco.
Ela ficou desconfiada mas acedeu. Começou José a fazer as rezas indicadas no Livro de São Cipriano. A rapariga começou a esgargalar os olhos e a gritar.
– Cala-te. Toma lá um chocolate. Come-o.
Ela sentiu-se com forças maiores que as normais.
– Youssuf, segura-a. Está possessa.
Abeiraram-se do porco e ataram-lhe uma correia como uma cilha, onde seguraram uma bomba.
Começou José a fazer as rezas para fazer sair o demónio da rapariga, pedindo ao diabo que fosse para o porco. Este desatou a correr e tiveram dificuldade em o apanhar. Uma vez passado o demónio para o porco, José gritou-lhe…
– Vai para o mar e mete-te debaixo do barco grande.
O demónio obedeceu. Passados uns minutos, José accionou a bomba e esta estoirou com um ruído tremendo que fez acorrer muita gente a ver de que se tratava. Só viram o barco estilhaçar-se e ir ao fundo.
Ninguém sabia quem havia feito isso ao barco. A rapariga já tinha desaparecido mal se sentiu bem. José e Youssuf haviam-se postado a uns cinquenta metros do navio antes de accionarem a bomba. Meteram o comando numa bolsa e juntaram-se à multidão curiosa.
Viam-se já alguns corpos de marinheiros a boiar e as autoridades cercaram o local. O comando americano estava desorientado, sem saber que fazer. Viam os muitos corpos a boiar e tentaram recolhê-los. Infelizmente já não havia nada a fazer aos 75 corpos já recolhidos.
A polícia militar cirandava de um lado para o outro à procura de algo que nem sabiam o que era. Peritos mergulhadores atiraram-se à água à procura de provas do naufrágio.
A notícia espalhou-se rapidamente pela cidade e só se ouvia das bocas dos muitos mirones:
– Alá é grande! Americanos, bandidos, assassinos, pagastes o que fizestes na Líbia e no apoio ao genocídio praticado em Gaza por Israel!
Estas palavras foram repetidas por cada vez mais gente, em jeito de manifestação pública, que as autoridades não impediram. Os americanos engoliam em seco e temiam pela sua segurança.
José e Youssuf que também haviam participado activamente na manifestação, recolheram à casa do último, onde festejaram a façanha. Até Youssuf bebeu um copo da garrafa de vinho português que José havia trazido para o festejo. Esqueceu por momentos o preceito de Alá, tal era a satisfação que sentia por ter vingado os líbios e palestinos. Acabaram a garrafa. Youssouf ficou borracho e sentou-se no sofá, adormecendo de imediato. José ficou a ver as notícias. Havia manifestações espontâneas contra os americanos em todas as cidades. Na Líbia, ao saberem da notícia, saíram milhares para as ruas maldizendo americanos, franceses e italianos. O mesmo fizeram os palestinianos em relação a israelitas e americanos.
Em Washington foi chamado o embaixador marroquino ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. Foi advertido das manifestações hostis a um aliado. A resposta do embaixador foi:
– Que podemos fazer contra o povo?
Os americanos tentaram a ajuda das autoridades marroquinas para inquirir sobre os culpados do trágico naufrágio. As autoridades marroquinas, alegando poderem ser vaiadas e molestadas pela população em fúria, escusaram-se a colaborar e até impediram as investigações.
A frota americana, temendo novas ameaças, zarpou rumo à base dos Açores.
Alívio para os marroquinos, que se viram livres de tais aliados indesejáveis. Em Washington senadores houve que propuseram sanções a Marrocos. Debatida a questão, chegaram à conclusão que não era conveniente, pois não queriam perder a base marroquina para sempre.
José regressou a Portugal satisfeito pelo acto que praticou. Youssuf, sabendo que os peixes poderiam ter comido os bocados desfeitos do porco, deixou de comer peixe. Os colegas que o acompanhavam nas refeições estranharam que Youssuf não comesse peixe. Perguntaram-lhe muitas vezes a razão. Nunca Youssuf lhes entregou o segredo.
A vingança contra franceses, italianos e israelitas ficaria para outra vez.
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«Contos breves de novos inventos militares», por Franklim Costa Braga
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Maio de 2014.)
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