Quem não se lembra dos Italianos? Quem do meu tempo não conhecia o Manel Cigano? Pois bem, aqui ficam duas memórias deliciosas para a malta de antanho lá na aldeia…

Repito que se trata de crónicas em tempos publicadas no meu blogue «LisboaLisboa» nos anos 90, se não erro. São textos que nunca poderei deixar cair no esquecimento, pois eles trazem vida da aldeia nos anos 50 e 60 do século passado. Digamos que entre os meus 15-20 e 25-30 anos de idade.
Nada mais delicioso para mim do que ver que algumas outras pessoas ainda se lembram e que me lêem com prazer. Assim, já valeu a pena…
Os «Italianos»
O local e a construção a que chamávamos «Os Italianos» foram um mito durante toda a minha infância e adolescência. Era uma construção dos anos 40, anos da II Guerra, e fora erguida para servir de central de separação de minérios. Mas pouco uso tivera como tal porque os Menegoni seus proprietários (italianos) tiveram de fugir após a Itália ter sido ocupada pelas forças de libertação. O seu grande recinto exterior era ponto de encontro aos domingos. Os seus salões (antigos armazéns) serviram sempre de salão de baile. O espaço era óptimo para isso: um enorme «terreiro» lá dentro era o indicado para os bailes. Enorme, era o que nos parecia na altura.
Mais tarde, como o edifício era da família, mais adulto, ao entrar, tinha outra dimensão das coisas e nem me parecia tão grande. Mas, aos seis anos, o que é que não é grande?
Durante os anos 50, os bailes ou eram no Largo de São Francisco ou eram nos «Italianos», no exacto local onde hoje os herdeiros de um tio meu têm a sua residência quando vão lá e uma tia minha tem a sua casa mesmo de habitação e o café («Monte Estrela», parece-me que é o nome mesmo).
O Manel Cigano
Hoje, na areia, aquela jovem de fio dental já de si mínimo mas que ela comprou um número abaixo do que precisava, fez-me lembrar uma história de há muitos anos.
É uma das muitas histórias do Manel Cigano «da minha terra», ele que, não tendo «terra», achava que era dali porque ali o tratavam bem. Era praticamente da minha idade.
Pois bem, o Manel, que cresceu sempre por ali e era bem tratado lá em casa, tinha imensa piada e estava sempre com piadas novas.
Nesta altura do ano, espreitava a minha chegada por uma razão prática: a malta levava-lhe roupa e outros «regalos».
O Manel, convém dizer, era «sasso». Dizia os «eses» como os espanhóis dizem o «z», como se fosse «dss» sempre com a língua encostada aos dentes de cima à frente… E isso dava-lhe um toque de cor (áudio) ainda com mais piada.
O caso é o seguinte: numa das minhas chegadas para férias, ele lá estava à espera. Recebeu logo as roupas e tal. Mas às tantas, olhando-me para as sapatilhas que acabara de comprar em Lisboa, disse: «Ó sô Zé, dê-me esses sapatinhos.»
O pessoal riu-se da lata. Mas acho que ele bem sabia que lhos dava logo. E dei.
Fiquei descalço. O pessoal à garagalhada. Fui ou alguém foi comprar outros e a história morreu ali por aquele dia. Mas o Manel, com a sua pronúncia de «sasso», no dia seguinte volta para lá para a minha porta e larga-me esta que ficou para a história da família: «Ó sô Zé, à outra vez compre um número acima que estes ficam-me apertados.»
Gargalhada geral até hoje.
Obrigado por me ler! Até para a semana, à mesma hora, no mesmo local!
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2011)
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