4.º ANO – Como se pode ver na foto em baixo, se descontarmos o Sanches, o Simão e o Roldão, que entraram um ano antes mas perderam um ano, só já éramos 12 dos 64 que entrámos para o 1.º ano. Não constam na foto o Tavares e o Bairrada, da zona de Proença-a-Nova, que pertenciam à Congregação do Preciosíssimo Sangue, que tinham casa em Vila Viçosa, ao lado da igreja de São Bartolomeu, onde dormiam, mas que frequentavam as aulas no seminário. Foram mesmo para Évora comigo, sendo como alunos normais do seminário, onde comiam e dormiam como os outros. Claro que também ficaram para trás por reprovação alguns dos 64 que haviam entrado no 1.º ano, como foi o caso do Baltazar. (parte 7)

Atrás: Roldão, Silva, Casal, Júlio Aço, Palmeiro e Vasconcelos. À frente: Duque, Rosado, Sabino, Sanches, Esteves, Sanches Alves, Simão, Jacinto e eu. À frente, sentados: Vice-reitor, D. José Joaquim Ribeiro, e Padre Melo
(Continuação)
4.º ANO NO SEMINÁRIO DOS AGOSTINHOS EM VILA VIÇOSA
Iniciou-se o dia da chegada de férias para frequentar o 4.º ano pelo habitual retiro.
No 4.º ano a camarata era partilhada com os do 5.º ano, embora se mantivesse a regra de certa separação. Os do 5.º ano ficavam lá ao fundo e os do 4.º ano mais ao pé da porta de entrada. A capela era no rés-do-chão, sendo uma sala transformada em capela. Íamos de batina e roquete à missa, que despíamos após regressar à camarata para fazer as camas.
Desde miúdo que tive problemas de retenção de urinas. Por isso fui a Caria ao Dr. Jardim que tinha radioscopia e mais tarde a Coimbra ser visto por um filho do Sr. Alexandre, o Dr. João. Este concluiu que era questão nervosa e havia de passar quando crescesse. Receitou-me uns comprimidos que me faziam urinar de várias cores. Estava eu a urinar nos urinóis quando um colega viu a minha urina vermelha e foi dizer ao perfeito que eu urinava sangue.
Hoje eu tenho apneia do sono e, por isso, durmo com uma máscara para me obrigar a respirar. Fosse porque já tivesse apneia no 4.º ano ou porque adormecesse quando usava o penico, o certo é que de noite se ouviu um estrondo – tinha caído o meu penico da cama e partira-se no chão, espalhando a minha urina. Só dei conta ao levantar-me.
Frequentemente tinha de sair da capela por me sentir mal. Não sei se era do cheiro da cera ou por outro motivo. Sei que ficava branco e ia beber água para me passar.
Estávamos no ano lectivo de 1957/58, ano em que surgiu a gripe asiática, que matou muita gente, embora não comparada com a actual Covid-19. Todos os colegas a tiveram. Gozavam comigo porque, sendo franzino, não havia meio de ser contaminado. Até que chegou o dia em que a apanhei. Fui o último a tê-la. Como tinha tido uma pleuresia no 2.º ano, o médico aconselhou a que fosse internado no hospital, onde fiquei dois ou três dias. Por ser franzino, aconselhou a que seguisse uma dieta. Passei a comer da comida dos padres.
A merenda era no recreio, junto ao portão. Aí estavam expostas num cesto azeitonas que acompanhávamos com pão, migradas (romãs) no Outono ou laranjas no Inverno. Eu era amante de migradas, que por ali abundavam.
Os professores eram, na sua maioria, os mesmos do 3.º ano. Álgebra começou com o vice-reitor mas passou a ser dada por um professor leigo, meio zarolho, o Dr. Torrinha, quando o vice-reitor foi nomeado bispo. Uma vez tive 20 valores num teste, mas logo noutro tive negativa. Ficou desconcertado comigo. A Inglês passámos a ter o padre Vilela, um dos irmãos Vilela, o Nélson e o Mário, padres de Vila Real que rumaram a Vila Viçosa. O Mário foi mais tarde professor na Universidade do Minho ou Trás-os-Montes.
Da sala de estudo, comum ao 5.º ano, ouviam-se aos Domingos os sinos do Palácio Ducal, cujo som ainda guardo no ouvido. Era o chamamento para a missa chique.
Fomos algumas vezes convidados para conferências na biblioteca do Palácio. Ficou-me na memória a representação do «Auto da Barca do Inferno» pelo Grupo Teatral da Universidade de Coimbra, creio que sob a direcção do Prof. Paulo Quintela.
Uns dias antes da festa da Senhora da Conceição íamos à noite até ao seu santuário rezar o terço, seguido de missa. Íamos de batina, cabeção, sobrepeliz e barrete e ainda com a faixa vermelha. Não sei se era por já ter apneia do sono, o que é facto é que várias vezes adormecia durante as cerimónias.
No caminho do seminário até ao santuário havia uma avenida ladeada de laranjeiras. De vez em quando, no regresso, lá metíamos uma no barrete.
Os passeios continuaram a ser dois por semana e para os locais habituais. Metermo-nos com raparigas era algo impossível, não só porque nos preparavam para o sacerdócio, não podendo casar, mas também porque nos era incutido que as mulheres, à excepção de nossas mães, eram como seres impuros a evitar.
Umas senhoras amigas do seminário lembraram-se de apresentar no teatro da vila uma peça em que as personagens eram flores. Eu fui vestido de miosótis azul. O texto era cantado.
Como era bom aluno, passei sempre com boas notas.
(Continua)
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«Quadrazenhos no Seminário», por Franklim Costa Braga
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Maio de 2014)
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