As nuvens refaziam-se em grupos enegrecidos ameaçando ofuscar a claridade celeste. Dir-se-ia que a natureza já previa o desfecho e que o chão se dispunha a receber a chuva exalando, de antemão, um intenso odor a terra malhada…
Mas nada disto era novo. Ao que, na altura, assistia já o havia presenciado inúmeras vezes.
A minha memória olfativa não me permitia, portanto, nenhuma confusão quanto à época do ano. Estávamos no verão, sim, mas no seu final. Quase se pisava, já, o átrio do outono. Esvaia-se a quentura extrema e tudo o que ela simbolizava.
Sucedia, pois, a inevitabilidade da mudança sem que a ameaça de chuva eximisse a harmonia ou a sugestão de aconchego.
Em breve haveriam de caducar as folhas que atapetariam as ruas. Aos pés dos passantes não mais chegaria a dureza quente dos pavimentos. Sentir-se-ia a fofura das folhas secas, em tudo semelhantes a longos mantos fofamente acastanhados.
Confirmou-se, por fim, o temporal. A água veio e ficou por algum tempo. Não encheu apenas os poros da terra. Também lacrimejou janelas, fez cantarolar telhados e embalou sonos e sonhos.
Chegou também o baixar de temperatura que se combinou com o aumento das aguadas e com a míngua da luz dos dias. E surgiu o recolhimento como uma consequência natural.
Feita a transição resta, agora, desejar que ela seja bem sucedida.
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«Terras do Jarmelo», crónica de Fernando Capelo
(Cronista no Capeia Arraiana desde Maio de 2011)
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