Continuemos a recordar a bicharada com quem lidávamos e que estabeleciam connosco quase uma relação fraternal. Não estou a gozar, é mesmo verdade! Quem viveu naqueles tempos da minha infância e juventude sabe do que estou a falar e concordará comigo, de certeza absoluta. Vamos lá a isto…
O coelho
Este era um dos animais mais interessantes das nossas «casas», sempre a morarem ali mesmo ao lado, como se fossem membros da família de segundo plano, mas sempre muito bem tratados… Claro que naquela altura, as coisas não eram como hoje. Não havia lá festinhas na cabeça dos coelhos nem eles estavam para aí virados. Queriam era comer o dia todo e terem sempre água para beberem. Isso, sim, nunca lhes faltava. Até porque a última coisa que as pessoas queriam era que os coelhitos morressem de fome ou de sede! Mas não tanto por causa do bem-estar deles, claro, era mais por causa da comida boa que eles tinham e que fazia cá cada refeição, meus amigos, que eu nem lhes digo nada. Era ver a festa que se fazia quando se matavam dois ou três coelhos e de seguida começavam as refeições de coelho guisado com batata cozida.
A ovelha
Nada mais meigo do que as ovelhas e os seus filhotes… Era uma delícia mexer-lhes na cabeço e elas tão mansas, tão satisfeitas. Além disso, a ovelha dava aquele leite muito especial para se fazer o queijo único que nunca mais comi por todo o lado onde andei. Queijo como o que a minha madrinha fazia… nunca mais vi em lado nenhum, por mais propaganda que façam por todo o lado.
De referir que ainda hoje, quando vejo estes gados por aqui sempre espalhados na serra e na mata, não posso deixar de me lembrar de forma bem evidente que na minha meninice as ovelhas das casas das pessoas do Casteleiro eram um abrir de boca de tanta mansidão e fome, sempre a dar gemidos bem típicos e sempre a comer tudo o que houvesse por ali para roer: ervas, couves, restos de alimentos vegetais das casas, fosse o que fosse… O importante era que estavam sempre a roer.
A vaca
Tenho das vacas de trabalho e de criação lá da casa do meu padrinho três memórias muito fortes:
– primeira – a palheira onde elas dormiam e onde dormiam os meus tios – e eu com ele muitas vezes –, sempre com grande alegria e sempre com a lembrança que ainda hoje perdura do cheiro intenso e profundo típico das palheiras;
– segunda – a imagem de ver as vacas a pastar em Gralhais, nas Cruzes do Ti’ António Joaquim ou noutro lameiro qualquer onde houvesse muita erva;
– terceira – as vacas a parirem lá de quando em vez. Era uma lamúria e uns berros que se ouviam por toda a aldeia…
Depois, acompanhava os bezerrinhos a crescerem pois eu, depois da escola, tido e achado era lá em baixo no quintal ao pé dos animais ou nas idas com o meu padrinho ou os meus tios (antes da emigração deles para a França, claro).
:: ::
«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2011)
:: ::
Leave a Reply