Nos finais de 2009 escrevi uma peça de que muito me orgulho sobre a minha aldeia. Trago-a hoje em repetição pela primeira vez, pois acho que vão gostar de ler…

Como se vivia no Casteleiro em meados do século XX?
Dediquei muitas crónicas a esta temática durante anos e anos. Chegou a altura para revermos algumas dessas crónicas escritas nas minhas plataformas na net que então eram várias… Vamos analisar uma delas, em que analiso vários aspectos da vida diária das gentes da minha terra naqueles tempos.
– O clima – Ali, na minha aldeia, começa a Cova da Beira. O clima é muito mais ameno. As frutas que temos são as da Cova da Beira e não as das terras frias. Nunca ouvi falar de cegonhas a Norte fosse em Santo Estêvão, fosse no Sabugal. Mas ao Casteleiro elas «não se dispensavam» de vir passar a Primavera.
– A orografia – É sabido que os montes e vales, a orografia, determinam muito numa região, a começar pelas culturas. Pois bem: a orografia do Casteleiro tem tudo a ver com a Cova da Beira, com o Sul, e nada com a zona a Norte, com o resto do concelho do Sabugal. Os montes à nossa volta desenham quase uma concha, que começa na descida do Terreiro das Bruxas, passa no Casteleiro e se espraia até Caria e por aí abaixo. A Natureza assim o desenhou, mas o poder mudou essa lógica há 150 anos.
– A saúde – Não deixando de referir o Dr. Manso, do Sabugal, a verdade é que havia um médico muito recorrido em Caria, o Dr. Salgueiro. E outro em Belmonte, o Dr. Vieira. Era para aí que escorria a maioria do pessoal quando havia problemas com a miudagem ou com os adultos. Ainda hoje, quem precisa de Hospital vai ou faz tudo para ir para a Covilhã.
– A farmácia – Muita gente só ia a Caria. Outras pessoas, tanto iam a Caria como ao Sabugal e, sem dúvida, na minha juventude ouvia falar mais da Farmácia «da Ilda» (Sabugal) do que de qualquer outra. Mas podia ser talvez mais na minha família. Não sei explicar.
– As romarias – Até as romarias a que se ia ficavam quase todas a Sul: a Senhora da Póvoa (no Vale de Lobo da época), a Senhora da Quebrada e o São Bartolomeu (ambas nos Três Povos), a Senhora do Carmo (a seguir a Caria). Havia ainda o Santo Antão, em Sortelha, antiga sede do Concelho a que pertencera o Casteleiro e lá se ia. Só a Santa Eufémia (em Quadrazais) e a Senhora do Bom Parto é que eram para Norte: uma para lá do Sabugal e a outra logo ali, no Terreiro das Bruxas…
– Os transportes – Primeiro, o comboio. Essa é a grande via de ligação às grandes cidades: Covilhã, Castelo Branco, Lisboa. Ninguém vai apanhar o comboio ao Barracão, a estação do Sabugal. Depois, a «carreira». Este era o único transporte público que passava na minha terra. E, claro, havia o táxi (o meu pai foi dono da praça por mais de 20 anos). Mas a carreira, essa, condicionava uma série de coisas. E facilitava a ida ao Sabugal e não a Belmonte até porque a viagem era concebida de modo a que as pessoas fossem de manhã e viessem à tarde. Era um dia consumido nessa simples deslocação de 15 quilómetros.
– A economia e a vida escolar – A economia da Freguesia e a nossa vida escolar marcam aqui um contraponto: enquanto o Grémio estava no Sabugal, os abastecimentos e escoamentos escorriam para Sul; por sua vez, o facto de termos de ir estudar para o Sabugal determinou o futuro de muita gente. Mas a maioria da malta, entre ir para a Guarda e depois Coimbra ou para Lisboa, foi para Lisboa estudar. Mas nada disto é estanque nem pacífico: é muito grande o peso da Administração durante 150 anos. O abastecimento (batata, adubos, farinhas, sei lá) era tudo recebido por comboio. E depois, o grosso dos produtos era também escoado para Sul, ou de camião ou de comboio mas os grandes escoamentos iam sempre para os lados de Lisboa, via Castelo Branco, também.
– O emprego – aparte os emprego de tipo administrativo – e, para malta do Casteleiro, isso significaria uma curta meia dúzia de pessoas, pouco emprego era encontrado no Sabugal, Guarda ou Raia. Pelo contrário, era para Sul, sobretudo para a Covilhã, Castelo Branco ou, mais ainda, Lisboa, que corriam as hipóteses de ter um emprego mais bem remunerado do que no Casteleiro. Até o emprego agrícola estava a Sul e não a Norte: logo ali, em Santo Amaro ou, mais longe, no Ribatejo e no Alentejo.
Obrigado por me ler! Até para a semana, à mesma hora, no mesmo local!
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2011)
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