Rui Nabeiro partiu. Já quase tudo foi escrito e dito sobre a sua visão estratégica, a obra que criou e deixou aos seus descendentes, aos portugueses, assim como já se fez o elogio do seu carácter, bondade, honestidade, solidariedade, honradez, digamos que praticava um socialismo de proximidade, de ética e de coração. Um doutor «honoris causa», da vida de empresário, das relações interpessoais, da solidariedade, da amizade… e apenas com a 4.ª classe.

Conhecedor pessoal de Rui Nabeiro só posso acrescentar com alguns factos, tudo o que foi dito e escrito.
E vêm-me hoje à memória pequenos episódios reveladores, como o convite para assistir a um jogo de futebol em Campo Maior entre o Campomaiorense, e um dos três chamados grandes do campeonato nacional da primeira divisão.
Quem assistiu imparcialmente ao desafio, sem a clubite doentia, verificou a olho nu, que o homem do apito estava a beneficiar o clube visitante, em prejuízo do da casa.
Ora, a Rui Nabeiro, observador atento, não lhe passaram despercebidas todas aquelas malandrices, a falta de ética e de verdade desportiva. Acto contínuo, a Família Nabeiro e o seu Grupo Delta, à época com apoios incondicionais ao clube da sua terra, não estiveram para aturar mais o «jogo sujo»: a direcção do Clube de Campo Maior bateu com a porta no futebol profissional, ficando apenas com as camadas jovens.
Rui Nabeiro era de grande humanidade para com os seus empregados, conhecia-os pelos seus nomes próprios, ajudava-os em necessidades familiares, educacionais e na doença, como comprovei pessoalmente, ouvindo alguns deles: «Para nós é mais um pai do que um patrão.»
Uma vez, quando o acompanhava numa rua de Campo Maior, abeirou-se um cidadão de etnia cigana, que lhe expôs a sua situação precária e o desespero familiar, caso que não era estranho para Rui Nabeiro. Foi imediatamente com uma das mãos ao bolso e entregou-lhe uma avultada quantia. Abraçaram-se mutuamente.
Numa daquelas excursões que todos os anos se realizavam na comunidade de Aldeia de Joanes (Fundão), escolheram-se os territórios alentejanos de Elvas e Campo Maior, com uma ida a Olivença. Com um programa previamente definido, a última etapa seria uma visita às instalações dos Cafés Delta em Campo Maior. À espera de cem pessoas, maioritariamente crianças e jovens, estava o Senhor Rui Nabeiro, a trabalhar desde as seis horas da manhã.
Fez-nos pessoalmente uma visita guiada aos armazéns do café, explicou as suas diversas origens, assim como ao Museu do Café, onde nos deu uma explicação pormenorizada sobre tudo o que estava exposto, com uma especial atenção às crianças.
Antes de voltarmos para as nossas origens, fomos convidados para entrarmos numa sala onde nos foi ofertado um lanche e uma lembrança, com um abraço para todos.
Ainda hoje, e já lá vão mais de vinte anos, muitos se recordam com saudade dessa viagem ao Museu do Café graças à generosidade de Rui Nabeiro.
Para terminar este testemunho pessoal, não posso deixar de referir que disponibilizou gratuitamente, todo o mobiliário do Bar da Associação dos Funcionários do Estabelecimento Prisional de Castelo Branco, contando com a colaboração da Técnica de Serviço Social, Maria Manuela Marques Bernardo, que o sensibilizou para esta acção solidária.
Por mais textos que se escrevam sobre este Empresário com letra maiúscula, choramos a sua morte com olhos e lágrimas de verdade, num País onde há ricos podres de serem ricos. Foi generoso num Portugal egoísta, e amado numa sociedade sempre pronta a olhar para os cifrões. Um HOMEM bom que nos ensinou o impossível.
No outro lado, na eternidade celeste estou convencido que está a distribuir sorrisos e bom café.
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista no Capeia Arraiana desde Março de 2012)
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