Na nossa vida pessoal, familiar e principalmente profissional cruzamo-nos com pessoas, individualidades, figuras públicas, que não esquecemos facilmente. Falamos, neste caso concreto, de D. Augusto César Alves Ferreira da Silva, que no dia 21 de Maio assinalou o cinquentenário da ordenação episcopal na Sé de Castelo Branco.
Por uma questão de amizade desloquei-me naquela data a Castelo Branco, e antes da cerimónia jubilar, agradeci pessoalmente a D. Augusto César a disponibilidade que sempre manteve com o Estabelecimento Prisional daquela cidade, referente aos funcionários e aos reclusos.
Com os inúmeros convidados, autoridades eclesiásticas, duas dezenas de bispos, dezenas de sacerdotes, autarcas e de instituições diversas, a leitura da listagem demorou algum tempo a individualiza-las.
Salientam-se as mensagens da Diocese de Tete (Moçambique), do Papa Francisco e do Presidente da República Portuguesa.
O homenageado agradeceu as manifestações de simpatia, amizade e gratidão dos presentes, com votos de felicidades para todos.
Nasceu no dia 15 de Março de 1932, na freguesia de Fervença, concelho de Celorico de Basto. Aos treze anos ingressa no Seminário de São José, em Felgueiras, da Congregação dos Padres Lazaristas.
Em Santander (Espanha), frequenta o noviciado, regressa a Felgueiras, ao Seminário Maior de Santa Teresinha dos Padres Lazaristas.
D. Augusto César recorda aqueles tempos filosóficos e teológicos, onde realça a fraternidade, as vivências como irmãos a alimentar o sonho de ser missionário.
Em 24 de Julho de 1960 é ordenado sacerdote e, «com a mala preparada e de obediência», concretiza o desejo de partir em missão, ligada à formação de jovens seminaristas em Lourenço Marques-Quelimane- Maputo.
Regressa a Portugal em 1970 para desempenhar as funções, durante dois anos, de Provincial da sua Congregação.
D. Augusto César é ordenado bispo no dia 21 de Maio de 1972, dando-lhe posse D. António Ribeiro, Cardeal de Lisboa, na Igreja de São Vicente de Paulo.
Por indicação do Papa Paulo VI, segue novamente para terras de Missão, desta vez com a responsabilidade da Diocese de Tete, em Moçambique, território em guerra subversiva, onde esteve quatro anos. Inicia uma nova experiência de três anos antes da independência e de um ano depois.
«Deus colocou-me caminhos difíceis, mas o meu lema foi sempre de obediência. Visitei em tempos de guerra regularmente a Diocese, transmiti confiança, ânimo, encorajamento aos missionários de diversas nacionalidades e às comunidades cristãs, cuja simplicidade admirava.
Anunciei sempre o Evangelho e citei muitas vezes os artigos da Constituição Portuguesa. Sei que muitas vezes tinha visitas inesperadas de gente desconhecida, que estava atenta às minhas palavras e gestos.
A minha missão pastoral continuou durante um ano pós-independência, mas como Bispo mais novo em Moçambique entendi que devia ser nomeado um Bispo Moçambicano para Tete, a fim de se ajustar melhor às circunstâncias pastorais e pedi para regressar a Portugal.»
Regressado, está com os Padres Vicentinos dois anos. Em Setembro de 1978, João Paulo I, de curtíssimo papado, realiza a única nomeação episcopal, a de D. Augusto César para a Diocese de Portalegre-Castelo Branco, tomando posse a 26 de Novembro daquele ano, Solenidade de Cristo-Rei, onde está durante vinte e seis anos, até 22 de Abril de 2004. Fixa residência em Fátima na Casa das Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo.
«Pedi retirada antes de tempo, mas só ao segundo pedido de resignação fui atendido. Entendia que os sacerdotes e as comunidades cristãs precisavam de ideias e relacionamentos novos.»
Foi substituído pelo Bispo José Sanches Alves, natural da Lageosa da Raia, na zona raiana do concelho do Sabugal.
Diziam algumas vozes albicastrenses da época, «nunca tirou a roupa das malas, porque o seu grande objectivo e sonho era ser Arcebispo de Évora», como aconteceu quatro anos depois.
Desempenhei um cargo de responsabilidade na área prisional e membro de uma comunidade cristã albicastrense, durante vinte e dois anos, acompanhei de perto a acção pastoral de D. Augusto César.
Está na memória de todos os diocesanos de Portalegre e Castelo Branco, o seu empenhamento na Evangelização, e sobretudo as visitas às comunidades, começando pelos arciprestados e paróquias; a estruturação da Diocese, com a criação de quatro zonas pastorais e sete zonas com dinâmicas de missão itinerante de religiosas e leigos, de apoio aos doentes, crianças, e ainda a prestação de culto. Quando se achava oportuno realizava-se um encontro com todos num dos santuários da diocese, agregado a uma dessas zonas pastorais. Também não descurou a formação do clero e dos leigos, tão importante no funcionamento de uma diocese, sempre com base no diálogo.
Compete-me realçar a sua actividade na Pastoral Penitenciária, no cuidado com o perfil na escolha dos assistentes religiosos, nas diversas visitas, nas preocupações familiares, sociais, laborais e reintegração dos reclusos.
Realce-se a sua acção na formação da Liga dos Amigos do Estabelecimento Prisional Regional de Castelo Branco, com estatutos e publicação no Diário da República.
Nos contactos assíduos, deixou uma imagem de saber, diálogo, simplicidade, humildade, caridade, espírito de missão, sempre bem articulado com os visitadores prisionais, com a direcção, serviços técnicos, chefia de guardas, do Estabelecimento Prisional de Castelo Branco, que chegou a ter uma lotação de duzentas reclusas, cem reclusos e uma creche com vinte e cinco crianças. Uma instituição que necessitava dos apoios de todos para vencer as inúmeras dificuldades.
Um Bispo que deixou saudades e cumpriu a grande missão pastoral, estando sempre nas periferias, desabafou: «Nem sempre se consegue agradar a todos os sacerdotes e a alguns elementos das comunidades cristãs.»
Na minha modesta opinião, se me dessem a escolher, preferia ser Director de uma Penitenciária que Bispo de uma Diocese.
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Março de 2012)
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