Os limites de Quadrazais são muito vastos. É mesmo a maior freguesia do concelho em área, com 39,57 Km2. Mas também foi a primeira freguesia em população até 1878, a segunda, atrás do Sabugal, de 1890 a 1950, e a terceira a partir de 1960, suplantada pelo Soito.
Apesar de ser região de minifúndios, havia três ou quatro médios proprietários. Daí que, quem não tinha terrenos perto da povoação, teria de desbravar baldios mais afastados dela.
Foi o caso do Alcambar, que já aparece no foral de Sortelha concedido por D. Manuel I, em 1508, onde se diz:
«Tem obrigaçam os moradores do Lugar de Coadrazaes, termo de Sabugal de darem em cada anno hum jantar aos officiaes da Camara desta villa o dia que vão aos termos, e os dictos officiaes lhe deixam um alvará para poderem coutar as terras que eles tem nos limites desta villa e alguns matos e por isso lhe dão setecentos reais o anno que estão de restolho as dictas terras e logo no anno seguinte lhe pagam trezentos reis por meia folha que fica no Alcambar.»
Aí se instalaram 13 famílias quadrazenhas, que ora iam e regressavam à aldeia no mesmo dia, ora dormiam por lá, ora por lá pernoitavam durante a semana, só vindo a Quadrazais nos domingos durante a Primavera e Verão, e algumas delas viviam aí permanentemente. Foi o caso dos meus bisavós maternos, Manuel Esteves Cipriano e Luísa Nabais (ou Esteves) Corceira Carpinteira, casados em Novembro de 1875, que deram origem a sortes dos cinco filhos e de quatro filhas, entre as quais a minha avó Luisinha. Alguns ficaram no Alcambar de Baixo, como minha avó e sua irmã Maria da Luz que, ao casar em 1892 com Manuel Pires Diz Cabeiro, de alcunha Sono, deu origem aos Sonos, outros no Alcambar de Cima, como o irmão António de minha avó, que daria origem aos Carrapatinhos.
Um pouco afastados do Alcambar de Baixo, já pegando com os limites de Vale de Espinho, viviam o Tonho Zé Panto e seu genro, o Guerrilha. No Alcambar de Baixo viviam os Sonos e os primos. No caminho para o Alcambar de Cima viviam as Carachas e o Higino com a Trindade. No Alcambar de Cima viviam os Ginginhas, os Carabinas, os Balechos e os Carrapatinhos, formando, no conjunto, uma autêntica aldeia. Até casavam entre si.
Já fui eu que vendi os terrenos que minha mãe herdara de sua mãe, a um homem de Vale de Espinho, já nos últimos meses de vida dela, e recentemente o lugar da casa esborrondada a um criador de vacas de Rendo, casado com uma mulher dos Fóios, que se instalou nas Peladas.
Como eu, outros herdeiros dos meus bisavós, se desfizeram de suas terras e malhadas no Alcambar vendidas ao preço da chuva ao mesmo homem de Vale de Espinho, já que não há procura e os quadrazenhos já não se interessam por terras. As outras quintas estão praticamente todas abandonadas.
A última família a viver no Alcambar de Baixo foi a do Manel Zé, primo de minha mãe, casado com a Glória Manhonha. Morto o marido, ela foi viver para Quadrazais, onde faleceu em 2021.
Mas outras quintas existiram com mais 21 casas, na sua maioria desabitadas. Na Ferraria, no Vale da Ussa com nove casas, mas só duas habitadas, numa das quais viveu o Zé Cordeiro Velho, no Vale da Maria, no Ribeiro da Marrã, no Mocho, onde viveu o Manhonho, no Rebispinheiro, onde viveu o Manel da Caroça, nas Vinhas, onde viveu o Bola, no Vale d’Asna, onde viveu o Tó Feijão, na Galiana, onde viveram os quinteiros do Sr. Nacleto, e na Estrejansola, onde viveram os Baldinhos.
Para além de cultivarem terrenos de sequeiro, sobretudo de centeio, pedaços havia que eram regados por água do ribeiro do Alcambar e que produziam boas batatas e outros legumes, que lhes abasteciam as casas.
Estes quinteiros tinham, na sua maioria, juntas de vacas. Com elas lavravam suas levas, estrumavam-nas com elas e com elas acarretavam o grão já malhado para Quadrazais. O Alcambar tinha mesmo uma eira comum cujas lascas foram arrancadas pelo Meirinha para construir a casa da filha.
Para além disso o Alcambar era pródigo em malhadas onde poderiam abastecer-se de lenha e cepas para consumo no local ou para levarem para suas casas em Quadrazais para seu consumo no Inverno. Com lenha dessas malhadas faziam carvão com o auxílio dos fornicos de Malcata.
Em geral tinham também gado, com vastos campos para pastorearem e boa sombra de malhadas para rodearem. O leite era abundante e com ele faziam bons queijos de cabra. Os cabritos davam-lhes bom rendimento.
Um incêndio devastou as casas do Sordo, contígua à que fora de minha avó, já sem pedra sobre pedra, e outras, onde agora crescem silvas.
O valdespinheiro Zé da Lenha, que comprou boa parte dos terrenos de meus bisavós, vedou todas as suas terras com arame farpado para que as suas vacas não saiam dali.
No Alcambar de Cima ainda há poucos anos vi a casa dos Carrapatinhos em ruínas, com a cantaria da porta ainda de pé. Parece que o Chico da Trindade a comprou. Não sei se reparou a casa e se cultiva as terras. Mas será o único por ali, embora viva em Quadrazais.
Nas quintas com menos casas, em geral uma ou duas, raramente dormiam, salvo na Estrejansola, onde vivia a família Baldinho, e às Vinhas, onde vivia o Bola e família.
Até a Quinta do Major, de cinco mil hectares ou mais, está abandonada, com casas, fornos, lagar e igreja em ruínas. Parte foi tomada pelos serviços florestais de Penamacor, que aí reconstruíu uma casa, onde até há luz eléctrica produzida por um painel solar.
Visitei-a pela primeira vez no Verão de 2015 com o Távio Riclano (Octávio do Herculano) na sua carrinha e vi o estado de degradação em que se encontrava. Os filhos dos donos saíram para Lisboa e outras terras e compradores não aparecem.
Se o major cá voltasse, lamentaria o trigo e vinho que gastara para comprar os quadrazenhos, ao ver tudo abandonado.
Hoje, falecidos os mais velhos, já ninguém vive nas quintas, que os mais novos emigraram e já não querem trabalhar os campos. As casas, sobretudo os telhados, caíram e o mato invadiu-as. Parecem fantasmas no meio do matagal.
Os arquivos paroquiais mencionam a Quinta das Águas do Bacelo mas nada dizem de qualquer das quintas atrás citadas. Não existiam ou não as contava como quadrazenhas por estarem além-Côa em território do então concelho de Sortelha?
Por favor alguém que saiba aonde está localizada a Cancela do Sabugal
Muito obrigado
Carlos