A presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, está a ser pressionada por vários membros do Conselho do BCE que querem ver esta autoridade monetária a tomar medidas rapidamente para tentar conter a inflação e a subida dos preços que continuam a grassar na União Europeia.
Em crónicas anteriores, tive a ocasião de alertar para o facto de que algumas das condições financeiras favoráveis que foram propiciadas a Portugal pela União Europeia (UE), durante os últimos anos, não serão repetíveis a médio e longo prazo.
Na verdade, tudo indica que o Banco Central Europeu (BCE) irá retirar em breve os estímulos dados aos Estados-membros da UE, via compra das respetivas dívidas públicas e de uma política de baixas taxas de juro, embora o possa vir a fazê-lo de forma gradual. Isto mesmo foi, aliás, confirmado em 15 de Janeiro numa entrevista à Agência Lusa, por Fernando Teixeira dos Santos, antigo ministro das Finanças do governo de José Sócrates, que negociou a intervenção da Troika em Portugal, nos idos da crise financeira de 2011.
A este propósito, importa lembrar que as taxas de juro próximas de 0% a que o país se tem financiado nos últimos anos, se ficaram a dever, como é consabido, à intervenção decisiva do Banco Central Europeu. Aos mais esquecidos convirá recordar que foram estas baixas taxas de juro decididas pelo BCE que permitiram que o nosso endividamento externo não continuasse a derrapar após a saída da Troika de Portugal em 2014, e que, simultaneamente, conseguiu tranquilizar os mercados financeiros que nos têm facultado os empréstimos indispensáveis ao normal funcionamento dos serviços públicos do Estado, da banca portuguesa e, em grande medida, da economia nacional. E foi também esta intervenção do BCE que permitiu, nos últimos sete anos, reduzir a nossa despesa com os juros da dívida da República, uma poupança que poderá terminar a curto prazo.
Todavia, se a presente vaga de inflação vier a revelar-se mais duradoura do que aquela que tinha sido prevista pelo BCE, a pressão para a subida das taxas de juro tornar-se-á incontornável, o que, a acontecer, acarretará ao nosso país, consequências extremamente nefastas e muito difíceis de ultrapassar. Para já, embora o cenário mais provável seja que as referidas baixas taxas de juro se poderão ainda manter no primeiro semestre de 2022, é de prever uma nova subida dos juros, a partir do segundo semestre deste ano, ou o mais tardar no decurso de 2023.
Na verdade, em vários países do mundo e da Europa, incluindo Portugal, a vaga de inflação tem vindo a atingir proporções preocupantes para segmentos significativos das populações. Na verdade, importa chamar a atenção para o facto de que a inflação representa, na prática, uma espécie de imposto invisível mas real, uma vez que contribui fortemente para o empobrecimento das pessoas, sobretudo das mais carenciadas.
Não admira, assim, que os avisos e alertas sobre as consequências financeiras desta vaga de inflação já tenham começado a chegar.
O atual presidente do Banco de Portugal e ex-ministro das Finanças do primeiro governo de António Costa, Mário Centeno, já alertava, em Dezembro último, que o país vive uma situação de tal modo grave que «tem apenas dois anos para resolver a dívida pública da República»…
Por outro lado, o governador do Banco Central da Alemanha, Joachim Nagel, já admitiu que, se os números da inflação na Zona Euro não baixarem até Março, irá defender na próxima reunião do Conselho do BCE que esta autoridade monetária inicie sem demoras a normalização da política monetária – o que poderá significar o fim das compras de dívida pública e uma primeira subida das taxas de juro ainda em 2022.
Em declarações que se aproximam daquilo que foi também dito há dias por Klaas Knot, governador do Banco Central Holandês, Joachim Nagel aproveitou numa entrevista concedida a 9 de Fevereiro ao jornal Die Zeit para confirmar que a taxa de inflação na Alemanha irá, provavelmente, superar «significativamente» os 4% neste ano – mais do que o dobro, portanto, daquilo que é o objetivo de médio prazo do BCE. Ora, se as próximas semanas não trouxerem uma alteração nos indicadores avançados relacionados com o ritmo de subida dos preços, então o Banco central Europeu vai ter de atuar, defendeu o governador do Banco Central da Alemanha.
O primeiro passo a dar nessa «normalização da política monetária» que Joachim Nagel admite vir a apoiar seria terminar as compras de dívida que o BCE tem vindo a fazer – tanto ao abrigo do programa pandémico de compras como, também, no âmbito do programa regular de intervenção que o BCE já estava a executar quando a pandemia começou. O segundo passo seria subir as taxas de juro, mais perto do final do ano, afiançou. E acrescentou: «Os custos económicos de agir demasiado tarde são maiores do que os custos de agir demasiado cedo.»
Por sua vez, o Banco Central Europeu garante estar pronto para «tomar medidas no momento certo» com o objetivo de baixar a taxa de inflação. Aliás, como admitiu a presidente do BCE Christine Lagarde num discurso proferido no Parlamento Europeu no dia 14 de Fevereiro «o alcance da política monetária neste momento pode não ser suficiente para normalizar mais rapidamente a subida dos preços». Christine Lagarde reiterou que o Banco Central Europeu prevê por isso adotar uma abordagem gradual na normalização da sua política monetária.
Reconhecendo que a inflação «subiu de forma acentuada nos últimos meses», a presidente do BCE garantiu que a autoridade monetária vai continuar a «analisar de forma atenta» os dados económicos que chegarem, para «cuidadosamente avaliar as implicações para o horizonte de médio prazo para a inflação». E admitindo que a inflação continue elevada no médio prazo, Lagarde sublinhou que «os preços de energia mais elevados continuam a ser a principal razão para a taxa de inflação elevada» – preços da energia que, por sua vez, estão a ter um conjunto de efeitos indiretos que também conduzem a uma subida mais rápida dos preços. Lagarde referiu também que «parte da explicação para a inflação mais elevada está nas dificuldades nas cadeias globais de abastecimento» dos países europeus.
Em antecipação à reunião do Conselho do BCE decisiva para os próximos passos da política monetária na Zona Euro, Christine Lagarde acrescentou que «as incertezas relacionadas com a pandemia se reduziram um pouco» mas, «ao mesmo tempo, as tensões geopolíticas agravaram-se» e «os custos da energia persistentemente elevados podem provocar uma pressão negativa sobre o consumo e o investimento». Efetivamente, a grave situação político-militar que atualmente se vive na Ucrânia face ao endurecimento das pretensões russas de domínio deste território, não deixarão certamente de refletir-se, a curto prazo, numa significativa subida dos preços do gás e do petróleo e no consequente efeito dominó nos outros custos, como os da eletricidade.
«Estamos perfeitamente conscientes de que muitas pessoas em toda a Zona Euro estão preocupadas com o aumento do custo de vida neste momento», salientou a presidente do BCE, lembrando que «o fardo é ainda mais pesado para aqueles que têm rendimentos mais baixos, que têm de enfrentar as dificuldades diárias de gerir as suas vidas com preços mais elevados», e reiterando que «o BCE está empenhado no cumprimento do mandato de estabilidade dos preços» e «para o conseguir, irá tomar medidas no momento certo».
«Dentro de algumas semanas, as novas projeções macroeconómicas do Banco Central Europeu vão trazer uma avaliação atualizada, tendo em conta os últimos dados disponíveis – algo que irá ajudar o Conselho do BCE a julgar mais corretamente as implicações da taxa de inflação surpreendentemente elevada que foi divulgada em Dezembro e Janeiro», concluiu a presidente Christine Lagarde, que tem sido pressionada por vários membros do Conselho do BCE que querem ver a autoridade monetária a tomar medidas rapidamente para tentar conter a taxa de inflação e assegurar a estabilidade dos preços na União Europeia.
Como se vê, não faltam os avisos à navegação do terceiro governo de António Costa.
Bruxelas, 18 de Fevereiro
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«Portugal e o Futuro», opinião de Aurélio Crespo
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Julho de 2020.)
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