Depois de duas semanas de intensas negociações, os representantes de cerca de 200 países presentes na COP-26 (Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas de 2021) assinaram em Glasgow, no passado dia 13 de Novembro, um acordo que visa garantir o cumprimento da meta definida no Acordo de Paris de 2015 de limitar, a partir de 2020, o aumento da temperatura terrestre provocada pelo aquecimento global a 1,5°Celsius. O acordo agora alcançado reafirma este objetivo, mas, de modo geral, é considerado pela opinião pública mundial como um avanço tímido na luta contra as alterações climáticas.

Com efeito, o Acordo Climático de Glasgow mantém a ambição do Acordo de Paris de limitar o aumento da temperatura do planeta a 1,5º Celsius, afirmando que esta limitação exige «reduções rápidas, profundas e sustentadas das emissões globais de gases com efeito de estufa» e fixando como objetivos a redução das emissões de dióxido de carbono em 45% até 2030 e a neutralidade carbónica até 2050, bem como reduções profundas de outros gases com efeito de estufa (GEE).
O Acordo de Glasgow salienta, por outro lado, a urgência de reforçar as ações relativas à mitigação e à adaptação às alterações climáticas nesta «década crítica», com vista a colmatar as lacunas na implementação dos objetivos fixados no Acordo de Paris, e exige que os países em falta apresentem até Novembro de 2022 as suas contribuições com vista à redução das emissões dos gases com efeito de estufa.
Além disso, o acordo estipula que os países desenvolvidos deverão «pelo menos duplicar» o financiamento necessário para a adaptação às alterações climáticas por parte dos países mais pobres do planeta. E nele apela-se, por outro lado, aos países mais ricos e às instituições financeiras que «acelerem o alinhamento das suas atividades de financiamento com os objetivos acordados no Acordo de Paris».
As pressões dos grandes países poluidores
Infelizmente, por forte pressão da Índia e da China, os países participantes na Cimeira acabaram por concordar em retirar do texto da declaração final a medida que preconizava o abandono gradual do uso de carvão e dos subsídios aos combustíveis fósseis. Em vez do compromisso de «acelerar a eliminação» dessas fontes de energia altamente poluentes, o acordo fala em «acelerar a sua diminuição».
Esta alteração de última hora foi proposta pela Índia no plenário de encerramento da COP-26 quando pediu para substituir o «fim progressivo» («phase-out») por uma «redução progressiva» («phase down«) das referidas fontes de energia, tendo esta proposta acabado por vingar, apesar das manifestações de desagrado de várias delegações, designadamente da União Europeia e de países mais vulneráveis às alterações climáticas.
Em suma, entre «fazer história» e o sentimento de desilusão demonstrado por muitos ambientalistas presentes na cidade de Glasgow durante a Cimeira, os países participantes acordaram numa solução de compromisso, uma solução de «copo meio cheio, meio vazio» e irão voltar à mesa das negociações na COP-27 a realizar em Novembro de 2022 no Egito, onde irão re-examinar os planos nacionais relativos à redução das emissões de GEE.
Reações da opinião pública mundial
As reações ao consenso alcançado nesta Cimeira do Clima dividem-se entre quem considera que se alcançou o «acordo possível» ou quem lamenta a «falta de ambição e força do Pacto Climático aprovado».
Mas a opinião que prevaleceu, tanto em Portugal como noutros países, é que o Acordo de Glasgow ficou aquém do esperado.
Marcelo Rebelo de Sousa lamentou que não tenha sido possível um consenso mais ambicioso, afirmando que a COP-26 representa um «pequeno passo», um «avanço tímido» na luta contra as alerações climáticas».
Isso mesmo decorre das declarações prestadas no final da Cimeira pelo secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, que considerou que a COP-26 «deu alguns passos em frente que são bem vindos», mas ressalvando que se trata de «um compromisso cheio de contradições» e que o acordo alcançado «ainda não chega!…» E Guterres deixou um alerta: «o nosso planeta frágil está por um fio. Ainda estamos a bater à porta da catástrofe climática», concluindo que «é tempo de entrarmos em modo de emergência, ou a nossa hipótese de alcançar zero em emissões de GEE será zero».
Por sua vez, o Papa Francisco, referindo-se em 14 de Novembro aos resultados alcançados na COP-26, incentivou «aqueles que têm responsabilidades políticas e económicas a atuar de maneira imediata, com coragem e com visão de futuro».
Que o Acordo de Glasgow é pouco ambicioso face à urgência de conter o aquecimento global e que o mesmo adia, mais uma vez, a solução para o clima foi também a avaliação de especialistas, de ambientalistas e de organizações da sociedade civil sobre os resultados práticos da Cimeira, alertando que eventos climáticos extremos – como inundações, secas e incêndios – continuarão a ser cada vez mais comuns no planeta, se não forem adotadas, sem perda de tempo, medidas inadiáveis na luta contra o aquecimento global.
«Se todos os países, em particular aqueles que são grandes emissores, se limitarem às políticas de pequenos passos, ao “business as usual”, condenarão as atuais e futuras gerações a viver num mundo de sofrimentos e danos indescritíveis», advertiu a UCS (Union of Concerned Scientists), organização de cientistas para a proteção ambiental sediado nos Estados Unidos.
O alerta do ministro de Tuvalu
Uma das imagens mais simbólicas desta Cimeira difundidas pela internet em 4 de Novembro e que se tornaram virais, mostraram Simon Kofe, Ministro dos Negócios Estrangeiros do arquipélago de Tuvalu (um pequeno Estado da Polinésia, formado por um grupo de nove ilhas e atóis, localizado no sul da Oceania, antigo protetorado britânico que se tornou independente em 1978) dirigindo-se aos dirigentes e chefes de governo presentes na COP-26, exibindo um filme em que o próprio ministro aparece com os pés mergulhados no Oceano Pacífico até aos joelhos, a alertar para a «ameaça mortal» que a subida do nível do mar, decorrente do aquecimento climático, representa para as ilhas de Tuvalu e para outras ilhas de baixa altitude do Pacífico: «não se trata de uma mera declaração política!» alertou Simon Kofe, «se as alterações climáticas prosseguirem a este ritmo, Tuvalu poderá desaparecer dentro de 50 anos… Iremos afundar-nos… e as outras ilhas também».
E terminou com um apelo: «Pedimos e exigimos que o limite da temperatura de 1,5° Celsius seja respeitado. Reclamamos que sejam mobilizados com urgência os financiamentos necessários para fazer face aos desastres climáticos e apelamos a uma maior responsabilidade dos povos e países para a preservação da Terra.»
Este apelo do ministro de Tuvalu deve ser escutado por todos quantos têm a responsabilidade de tomar, a nível nacional e mundial, as decisões que se impõem para evitar cataclismos irreversíveis à humanidade, a médio e longo prazo.
Este desafio é incontornável e inadiável. Efetivamente, como diz António Guterres, «é tempo de entrarmos em modo de emergência».
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«Portugal e o Futuro», opinião de Aurélio Crespo
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Julho de 2020.)
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