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Página Principal  /  Concelho do Sabugal • Distrito da Guarda • Histórias da Memória Raiana • Outeiro São Miguel • Região Raiana  /  Histórias da memória raiana (4.3)
14 Novembro 2021

Histórias da memória raiana (4.3)

Por Capeia Arraiana
Concelho do Sabugal, Distrito da Guarda, Histórias da Memória Raiana, Outeiro São Miguel, Região Raiana antónio alves fernandes, antónio emídio, antónio josé alçada, fernando capelo, georgina ferro, josé carlos lages, josé carlos mendes Deixar Comentário

:: :: JOSÉ CARLOS MENDES :: :: No primeiro episódio das «Histórias da Memória Raiana» o António Emídio «apresentou-nos» a família do Luís do Sabugal quando este se preparava para ingressar no Outeiro de São Miguel. Na «quarta temporada» o José Carlos Mendes recupera a carta do Balé Nàciso para o Luís do Sabugal... (Capítulo 4, Episódio 3.)

Histórias da Memória Raiana - Capítulo 4 - Episódio 3 - José Carlos Mendes - capeiaarraiana.pt
Histórias da Memória Raiana – Capítulo 4 – Episódio 3 – José Carlos Mendes – capeiaarraiana.pt

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HISTÓRIAS DA MEMÓRIA RAIANA
Capítulo 4 – Episódio 3

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EM SETEMBRO VOU TRABALHAR PARA A ARGÉLIA

Dijon, 20 de Agosto de 1973

Caro Exmo. Senhor Luís,

Hoje escrevo-lhe esta carta de duas páginas porque desejaria contar-lhe algumas misérias da nossa emigração, quer aqui em Dijon quer sobretudo nos bidonvilles dos arredores de Paris.

Eu era para ter começado a trabalhar na empresa aqui em Dijon (de que já lhe falei e onde agora estou) logo ao fim de três semanas de chegar aqui à França. Mas houve um problema com a Argélia que nem sei qual foi e a grande obra para onde eu ia atrasou. Por isso, tive de ficar em Paris mais uns quatro ou cinco meses.

Pois bem, como sei que o Senhor Luís aprecia estas coisas, fui analisando e vendo bem o que acontecia com os nossos amigos portugueses que acabavam de chegar e com aqueles que ao fim de pouco tempo traziam a família para a França, ainda sem terem trabalho fixo e sem garantias de trabalho para as mulheres, o que era um grande erro.

Isso fez com que tivéssemos que ser nós, o que já por aqui estavam a começar a organizar a vida…

Uma miséria, Senhor Luís. Acredita que os garotos passam fome? Acredita que alguns sei eu que já têm algum amealhado, mas para pouparem e por sovinice doentia, nem se importam se os miúdos têm fome.

A pior história de todas foi esta:

Há dias estávamos a cear, eu e os meus dois colegas de casa. Aí entram dois irmãozitos: ela com nove anos e ele com seis. Vinham da escola, foram a casa deixar a papelada e vieram cá a casa que tem sempre a porta aberta.

O meu amigo disse-lhes se queriam comer. O garoto disse logo que sim. A miúda calou-se, como sempre, pois já sabe o que é ter vergonha da vida que passam lá em casa. Perguntei eu:

– Então lá em tua casa não há que comer?

Resposta dela:

– Só está a comer o meu pai porque não tem dinheiro para comprar para nós e tem de comprar só para ele porque trabalha.

Como calcula, ficámos os dois sem fala. Comeram os dois connosco, como tantas vezes.

Mas um dia foi pior. A mãe, que trabalha como porteira dois ou três dias por semana e já ganha um pouco, não lhes deu comida porque tem de poupar dinheiro para pagar a viagem para cá, para Paris. E os garotos passam fome de cão todos os dias que até metem dó.

Que desgraça, Senhor Luís: assim é a vida dos nossos compatriotas que vieram à procura de melhor vida… mas enquanto se organizam e não… os filhotes é que as pagam.

Bidonville de Champigny em Paris (foto: Gérald Bloncourt, o fotógrafo que imortalizou a emigração)
Bidonville de Champigny em Paris (foto: Gérald Bloncourt, o fotógrafo que imortalizou a emigração portuguesa)

Meu caro Amigo,

Desculpe maçá-lo com estas histórias do bas-fond desta nossa sociedade aqui na França – mas talvez até goste de ler estas coisas.

E agora outra coisa que muito me agrada.

Olhe, Senhor Luís, deixe-me abusar mais um bocadinho da sua paciência e dizer-lhe uma coisa muito boa para mim. Já namoro aqui com uma menina francesa, a Nicole, que é da minha idade mais mês menos mês e que tanto quer ter um filho meu. Acho que ela já está grávida, que é o que os dois mais queremos. Como vou sair para a Argélia em Setembro, ao serviço da tal empresa, a Brignon, tenho medo que o meu filho vá nascer enquanto eu estou por lá e não é fácil eles deixarem-me cá vir, porque lá uma obra pode demorar a arrancar, mas quando começa, não pode parar até ser toda acabada e os equipamentos pesados virem todos embora porque é muito perigoso ficarem lá.

Mas tudo há-de correr bem. Depois darei notícias.

Obrigado, Senhor Luis, por me ter respondido e por me ter desejado o melhor para mim e para os meus.

Com toda a consideração,

Receba um abraço deste que se assina,

Balé Nàciso / ou / Balé Nobre.

Na obra no norte de África vou trabalhar com grandes máquinas como esta
«Na obra no norte de África vou trabalhar com grandes máquinas como esta», esclarece o Balé

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José Carlos Mendes

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Os episódios das «Histórias da Memória Raiana» são escritos semanalmente por um autor diferente. Participaram na «primeira temporada»: António Emídio, Fernando Capelo, José Carlos Mendes, Ramiro Matos, António José Alçada, Franklim Costa Braga, António Martins, António Alves Fernandes, Joaquim Tenreira Martins, Georgina Ferro e José Carlos Lages.

Nesta «quarta temporada» o José Carlos Mendes recupera a carta do Balé Nàciso para o Luís do Sabugal…

Total de episódios publicados: 31.

Apesar de fazer referência a nomes e lugares verdadeiros da região raiana dos territórios do Sabugal esta é uma obra de ficção e qualquer semelhança com nomes de pessoas, factos ou situações terá sido mera coincidência (ou talvez não!)

José Carlos Lages

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Capeia Arraiana

Diariamente desde 6 de Dezembro de 2006.

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