Em tempos escrevi quanto absurdo é o valor do dinheiro. Uma unidade num país podem ser 1000 num outro. Porém, com mais mil, menos mil, se todos ou todas tiverem as pessoas mesmo assim sobrevivem. Agora quando esses mil acabam? Sim, as pessoas deixam de ter qualquer bem móvel ou imóvel? Como fazem?

Em garoto vivia sempre este pesadelo. Se o dinheiro acabasse. O que faria? Tenho assistido infelizmente a este tormento. Principalmente jovens estudantes deixam de ter possibilidade de pagar as propinas. E muitos deles falta um cadeira. Uma mísera cadeira e o dinheiro acabou. E nem sequer passam a certidão das cadeiras se não tiver as propinas em dia.
Na verdade, quem vive este tormento faz o que sempre achei melhor. Pedir à família ou aos amigos. Há sempre alguém mais sensivel à misericórdia.
Depois de ter vivido em tanta abundância nunca imaginei que tal fosse possivel assistir. O «El Dorado» dos fundos europeus acabaram mesmo por nos fazer esquecer que há outros que nem fundo têm.
A situação tem sido para mim tão díficil que não adianta culpar seja quem for. A verdade é que não tenho a certeza se esta tragédia, num amanhã, bate à minha porta. Aí sim não acredito em optimismo demagógico. Quanto muito moderado, mas esse aconselha sempre a prudência em face da incerteza do novo mundo.
Muitos destes jovens nunca acreditaram que tal lhes acontecesse. Muita gente nunca imaginou que tem de sobreviver sem dinheiro recorrendo à caridade de quem mais tem.
Mesmo assim as pessoas têm aceite estas dificuldades procurando aqui e ali uma oportunidade. Eu próprio tenho ajudado jovens a pagar as proprinas. As propinas em atraso condicionam a frequência nas provas, os diplomas, podendo no entanto o aluno assistir à aula.
Mas obviamente há condescendências sem no entanto os responsáveis dessas escolas terem de pressionar os pais a pagar no mínimo a luz e a água. E, por sinal, estes bens até são acessíveis.
O texto parece chocante. E, se acaba por ser, é porque nem sabemos dar o valor ao que temos.
Mas a realidade da vida é esta. O sustento do Estado Social, que só existe em alguns países, tem-se mantido. Mas acredito que com o envelhecimento populacional, os salários mais baixos associando menos contribuições, o Estado Social tende a ir «tremendo» no trilho da sobrevivência.
O elitismo europeu, e norte americano, foge destas realidades, embora os norte-americanos e norte europeus sejam, por regra, grandes contribuintes para minorar estas dificuldades. Como exemplo refiro que tenho acompanhado um mega projecto de rede de distribuição que se destina precisamente a pessoas com carência de água potavel sendo o financiamento totalmente norte americano.
Embora não seja um especialista em economia, sempre temi o pior com a bandeira desta pandemia, que sinceramente, não sei se mantém ou já acabou, ou tende a acabar.
Mas o quadro social que tenho assistido antes e depois é na realidade muito desmoralizante do ponto de vista humano. E, desde as primeiras notícias ainda em Fevereiro de 2020, senti logo que esta varrida de miséria atingiria os mais frágeis.
Resta-nos esperar e ver o futuro com o tal optimismo moderado. Afinal até já existe dinheiro virtual. Pode ser que seja a solução para quem nada têm.
Ou será que esse virtual também já é realidade?
Luanda, 29 de Setembro de 2021
:: ::
«No trilho das minhas memórias», ficção por António José Alçada
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Junho de 2017)
:: ::
Leave a Reply