Estas casas de pedra, hoje destelhadas, entortadas e a quererem abrir frechas, são autênticos monumentos do esforço humano e da ajuda das suas parelhas de vacas jungidas e atreladas aos seus carros.

Lembro-me de quatro homens irem até ao barrocal escolher os barrocos para rebentar. Levavam escopo e cinzel para neles furarem buracos fundos onde colocavam pólvora com um rastilho que acendiam fugindo para longe o mais depressa possível. E os barrocos estoiravam em pedregulhos de muitos tamanhos e feitios. Todos tinham serventia e valor.
O senhor Padre Baptista anunciou no sermão dominical a data do carreto.
Naquele dia todos os carros da aldeia, puxados pelas parelhas de vacas mais possantes, foram indo até ao barrocal. Lá, eram desatrelados e apoiados em cavilhas de ferro para as vacas não estarem a fazer tanto esforço.
Os garotos de nove, dez anos… muito senhores do seu varapau de guia, tal como se de um cetro real se tratasse, iam guiando a sua parelha para junto de erva fresca.
No barrocal não havia mãos a medir! Eram catraios, homens e até mulheres e moçoilas a carregar os carros alinhados e voltados para a saída. Nesse dia viriam as pedras que não precisavam de tanto esforço a carregar. Os blocos muito grandes ficariam para serem talhados e picados antes de serem carregados um a um .
Já o sol começava a baixar quando as vacas voltaram a ser atreladas. E lá vinha o carreto enfileirado. Os garotos passaram a vara aos homens de calça de pana preta, camisa a soltar-se do cinto, boina basca negra e empoeirada na cabeça. A garotada ao lado dos carros incitava a energia dos seus animais. As mulheres apressaram-se a chegar ao povoado para darem uma mãozinha na preparação da merenda. Os sinos começaram a repenicar. Toda a gente veio à rua. Garotas de cabelo ao vento e pé descalço, catraios de suspensórios a descair dos ombros, mulheres de sorriso aberto vaidosas dos seus homens e dos seus filhos suados a desfilarem em procissão.
À chegada toda a gente se apressou a desungir as vacas e a levá-las para a respectiva loja onde a manjedoura já as esperava com uma boa dose de ferrã, feno ou bandeiras das canas de milho tenrinhas.
A ti Felisbela com as suas parceiras distribuíam pão, chouriço, presunto, queijo, galhetas, bicas doces e iam enchendo dos jarros de barro com o vinho «do nosso» os copos que se lhes iam estendendo….
Depressa o lugar ficou vazio porque o cansaço era tanto que ninguém conseguia ser capaz de mais folia. Os carros seriam despejados nos dias seguintes!…
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«Gentes e lugares do meu antanho», crónica de Georgina Ferro
(Cronista no Capeia Arraiana desde Novembro de 2020)
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