A tradição do mês de agosto não é só capeias e romarias, é também este costume estranho (para lhe não chamar outro nome) de falar de prevenção. Temos nove meses para a discutir e praticar, mas só falamos dela no tempo que seria de ver resultados.
Acredito que com outros não se passe o mesmo, mas comigo é sempre assim, o mês de agosto passa sem quase dar conta. A rotina do ano, no mês de agosto, fecha.
Era assim quando ainda em casa dos pais, na quinta, o mês de agosto se dividia entre regar, tratar dos animais e preparar-me para ir com algum familiar emigrante, algures, festa ou não.
Foi assim durante anos quando a vida profissional apertava neste mês e não havia tempo para as habituais tertúlias da tarde, e nos fins de semana corria para Aldeia da Ponte ajudar a irmã no restaurante.
Continua assim agora, sem as correrias de outrora, mas que tendo mais família próxima, o tempo passa e nem se dá por isso.
Apenas quando tens que fazer algo que tem data, te dás conta que mesmo sendo agosto o tempo não pára, embora o calendário seja diferente. Nos anos antes da pandemia o calendário era regulado pelas festas e capeias. Embora a 15 fosse a de Aldeia da Ponte, só a 18 com a de Alfaiates se dava conta da ida de meio mês. Na hora que escrevo seria o encerro dos Foios, e na publicação a de Aldeia Velha. Aqui começávamos a pensar que para fechar o ciclo se ia à Freineda ou à Malhada. Assim era o calendário neste mês.
Assim se fechava o mês e, com a Senhora da Graça e a festa de Vilar Maior, se dava conta de tudo o que se queria fazer no mês de agosto e se não fez. E a rotina começava a voltar ao normal. Sim, que a Senhora da Ajuda e a Santa Eufêmea, são mais «romaria». Já não são da azáfama do mês de agosto.
Voltava-se às tertúlias com os amigos («Onde andaste, que já não te vejo há mais de um mês?»), gozava-se a calma de um Sabugal «fechado» na primeira quinzena de setembro, em que se mudava para Monte Gordo ou proximidades. Não sou, nem nunca fui fã do Algarve, mas sempre ouvi dizer a quem vinha: «Parecia que estava no Sabugal».
Nos anos oitenta alguém definiu férias como sendo o tempo em que as pessoas andavam mal vestidas, mal alojadas e mal alimentadas a dar uma volta fora de casa (todos nos lembramos dos parques cheios e dos carros com reboque «auto-tenda» ou grade com a tenda em cima), adaptando esta definição, para mim o Algarve é o local onde os portugueses podem falar estrangeiro e pagar bebidas ao preço da Europa, sem ter que sair do país (agora até dá jeito por causa dos testes). Se não se entenderem há sempre alguém ao lado que fala português, e com sorte também encontram anúncios e indicações em português. Era (e ainda é) outra tradição do mês de agosto.
E pelo meio teriam passado uns incêndios, mais ou menos graves. E a culpa era dos emigrantes. Mas vinha setembro e por vezes bem pior, e já não havia emigrantes. Que o Concelho, tradicionalmente, costuma ser mais fustigado no fim do verão, quando tudo está mais seco. Se o costume de culpar os emigrantes já se esqueceu, o mesmo não aconteceu com os incêndios.
Embora não tenhamos a mesma perceção (a não ser que apareçam os aviões), porque a sirene quase não se ouve, os meios que existem, e são muitos mais e melhor coordenados que há anos atrás, ou vão sorrateiramente ou já estão posicionados em locais estratégicos, mas os incêndios continuam. E voltamos à velha tradição de falar de prevenção, falar da ordenação da floresta, falar da limpeza que não existe na maioria dos Concelhos.
A tradição do mês de agosto não é só capeias e romarias, é também este costume estranho (para lhe não chamar outro nome) de falar de prevenção. Temos nove meses para a discutir e praticar, mas só falamos dela no tempo que seria de ver resultados.
E vêm os políticos botar faladura: Não há incêndios? (ou são poucos), é resultado das boas políticas aplicadas; Há mais? Conjugação dos fatores, temperatura, vento, humidade (falta dela); Nunca a falta de prevenção tem culpa. A casa está em perigo porque o mato chega à janela? Logo por lá está uma qualquer televisão para que o primeiro que apareça possa dizer que não viu por ali nenhum bombeiro. Tradições…
Aonde andam os responsáveis da prevenção em 2017?
Vem isto a propósito, não de defender a prevenção (embora precise, já que acorda no mês de agosto e re-adormece no mês de outubro, ou mais tarde que o verão já se estica), mas de lembrar que não há prevenção sem alteração de cultura. A falta não está em fazer-se ou não, está em que, culturalmente, não vemos necessidade.
Aconteceu 2017. Detetaram-se erros de combate, mas sobretudo de prevenção, e o que acontece? Estão a ser julgados os responsáveis do combate, não os da prevenção.
Quem considera criminosos (no mínimo por omissão) os responsáveis políticos que, mesmo após 2017, continuam sem fazer a prevenção mínima, como sejam alguns asseiros e limpeza ao lado das estradas e à volta das habitações? Basta dar uma volta pelo país para verificar que está tudo como em 2017, pesem embora os milhões e as Comissões. E este ano, ano de eleições, quem seria o autarca com «tomates» para aplicar uma coima a um eleitor?
E depois há a cultura de posse, sobretudo nos pequenos proprietários.
Numa conversa há dias sobre a criminalidade ligada aos incêndios em que defendia que tão criminoso é o incendiário, como quem, por omissão, lhe proporciona as condições, ouvi de um proprietário de terrenos no concelho, mas residente fora, o seu desagrado porque as vacas do vizinho saltavam para a sua abandonada parcela e lhe destruíam os carvalhos novos.
O concelho do Sabugal é um «território deserto», provam-no os últimos censos, não tem condições climatéricas para culturas mais rentáveis, pelo que a aposta das últimas décadas tem sido, e bem, no meu ponto de vista, a criação de gado. Bom seria que os terrenos abandonados pudessem ser cedidos por arrendamento ou qualquer outra forma legal a essas explorações, mantendo-os assim limpos e com condições para o desenvolvimento da floresta autóctone.
Mas não, a cultura de posse, sobretudo de quem está fora, é que mais vale perder os carvalhos de cinco em cinco anos, ou mantê-los sem condições de desenvolvimento, que deixar que as vacas do vizinho destruam alguns novos, mas proporcionem condições aos maiores para resistir e se desenvolver, rentabilizando-os.
Os incêndios são realmente um flagelo, como se verifica por acontecimentos noutros lugares e latitudes. Mas, o mal dos outros não deve apaziguar o nosso. Não podemos acabar com eles, podemos minimizá-los ou minimizar os seus efeitos. Até o fogo, bem utilizado pode servir para o prevenir. Utilizado com critério e no tempo que deve ser.
No âmbito do «Rosto detrás da máscara» apresento-vos o Ricardo…
Nome: Ricardo Emanuel Teixeira
Posto: Oficial Bombeiro de 2.ª Classe
Idade: 32 anos.
Estado civil: solteiro
Ingresso: 26 de Março de 2005
Ingresso na carreira de Bombeiro Voluntário: 31 de Maio de 2008
Ingresso na carreira de Oficial Bombeiro: 3 de Dezembro de 2014
Desempenhou as funções de 2.º Comandante entre 14 de Fevereiro de 2018 e 27 de Fevereiro de 2020.
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A pré-inscrição para a «escola de bombeiros» pode ser feita… (Aqui.)
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«A vida do Bombeiro», opinião de Luís Carriço
(Presidente da Direcção da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Sabugal.)
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