Martinha e Mathias foram expostos na freguesia da Bendada em 1774 e 1858, respetivamente. Os diferentes comportamentos dos intervenientes só podem ser compreendidos no contexto de cada época.
Martinha – exposta na quinta da Ribeira
«Aos treze dias do mez de Novembro da era de mil sete centos e setenta e quatro anos baptizei em minha casa hua criança que se tinha exposto na quinta do Ribeiro à porta de Manoel Gonçalves Preto na noite do dia onze do referido mez da qual tomou conta Marcos Gonçalves e sua mulher, e lhe pus o nome Martinha, e indo dar conta della à justiça da Villa de Sortelha não veio logo como lhe recomendei à igreja para lhe por os Santos Óleos, o que se sucedeu no dia seis de Janeiro do ano seguinte de mil setecentos e setenta e cinco pelo padre Coadjutor desta freguesia da Bendada, na parhochial Igreja de Santa Luzia na presença das testemunhas João Gonçalves Doya e João solteiro, filho de António Gonçalves, da quinta do Souto desta freguesia e quando se achou exposta mostrava ter quinze dias de nascida.
Para constar nos assignamos dia, mez e era ut supra,
João Pinto Pereira de Figueiredo e Castelbranco / Paulo Quaresma Soares». (1)
Nótulas
• Certamente que o nome Martinha resultou do período em que foi exposta, pelo São Martinho. Estas situações eram frequentes nos Livros de Matriculados da Roda de Sortelha.
• Registe-se a preocupação em dar contas à justiça de Sortelha, em oposição ao Reverendo que estava mais preocupado com a realização do batismo, supostamente para salvar a alma, mostrando alguma aceitação para com esta prática que ainda não estava legalizada.
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Mathias – Exposto na quinta do Souto
«Mathias exposto à porta de Rosalina Rodrigues da quita do Souto desta freguesia da Bendada; foi solenemente baptizado por mim o párocho abaixo assignado, aos vinte e dous dias do mez de Fevereiro de mil e oito centos e cinquenta e oito: Padrinhos Agostinho Henrique Pereira e como testemunhas prezente Manoel Thiago deste lugar, e Madrinha a mesma Rosalina Rodrigues; de que fiz este termo que assignei.
Bendada, 22 de Fevreiro de 1858. O Encomendado,
Manoel Dias do Coração de Jesus.» (2)
Nótulas
• Em 1858 a exposição estava legalizada. O batismo de expostos tornou-se um ato rotineiro!
• A urgência em matricular a criança, na Roda dos Expostos de Sortelha, resultava do interesse da ama, a quem era entregue, em obter o vencimento que certamente aliviaria a situação económica da respetiva família! Tratava-se de um complexo jogo de interesses!
• Os diferentes comportamentos dos intervenientes (padre, quem encontra o exposto e justiça) só podem ser compreendidos no contexto de cada época.
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Notas de rodapé
(1) Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Livro de Registo de Batismos da Bendada.
(2) Arquivo Distrital da Guarda, Livro de Registo de Batismos da Bendada.
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«Memórias de Sortelha», opinião de António Gonçalves
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2019)
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