• O Primeiro
  • A Cidade e as Terras
  • Contraponto
  • Cronistas
  • Documentários
  • Ficção
  • História
  • Personalidade Ano
  • Ficha Técnica

Menu
  • O Primeiro
  • A Cidade e as Terras
  • Contraponto
  • Cronistas
  • Documentários
  • Ficção
  • História
  • Personalidade Ano
  • Ficha Técnica
Página Principal  /  Aldeia do Bispo • Gentes e lugares do meu antanho • Região Raiana  /  O lume crepita no lar…
21 Janeiro 2021

O lume crepita no lar…

Por Georgina Ferro
Georgina Ferro
Aldeia do Bispo, Gentes e lugares do meu antanho, Região Raiana georgina ferro 3 Comentários

O céu apronta tormenta. Já escureceu, mesmo antes da hora do sol pôr. O toque das Trindades ainda não soou, mas os chocalhos tilintam fazendo adivinhar o trote mais acelerado do gado a arribar dos lameiros.

O céu apronta tormenta
O céu apronta tormenta

Ouve-se o apressar à Mourisca, à Castanha… que pararam no bebedouro do chafariz antes de se arrecadarem na loje! O burrito ainda tenta um espojar demorado, mudando logo de idéia, ao ouvir o zunir da verdasca no ar.

Os catraios saíram da escola em traquina correria e procuram algumas pocinhas deixadas pela chuva da manhã para achancar com as botas de borracha, pois é escusado pensar em que haverá tempo para um joguito do motcho ou da pedrincha antes da chuvada desatar a cair.

À chegada, encontram os pais a subir as escaleiras com braçados de galhos e uns cavaquinhos mais grossos para o lume aguentar o serão. Também eles se disponibilizam para ajudar.

E o vento gélido depressa varre da rua a criançada, os animais e toda a vida que flutua até ao sol se esconder no horizonte, em dias mais amenos.

Só se sabe da existência de vivalma, pelos fumos que esvoaçam das chaminés sobre os telhados e pela luz mortiça dos candeeiros ou candeias acesas que as vidraças das janelas deixam adivinhar.

De vez em quando ainda foge um negro xale a caminho da taverna do Ti Zé dos Pilos, ou do comércio do Senhor Anacleto, em busca do homem que por lá se deixou demorar ou, então, de um poquenino de açúcar ou café que não houve tempo de ir mercar.

Mas cá dentro há vida. O lume crepita no lar. A ceia já fumega e puxa-se a mesa para junto da chaminé. Há caldo escoado e pimentos curtidos e castanhas assadas, pois não tardarão a gear se não forem comidas a tempo.

Arreda-se a mesa, lava-se a loiça e começa o serão. O fuso enrola o fio puxado da roca enquanto se reza o terço. A tia cochila e pergunta em que mistério vamos. E, para seu grande espanto, mais uma vez falta só o último… «Ai que soninho tão lindo!», «Quase não dei pelo terço!…»

Pudera, é que, como quase sempre, mal tínhamos rezado o primeiro mistério!

O tio pergunta-me a lição que fiquei a estudar enquanto ele foi ordenhar a Tourina e colocar-lhe uma faixa de feno na manjedoura. Ainda joga o estanderete comigo enquanto aquece a sua botija de barro, antiga garrafa de «anis escartchado» que se trouxera de Navasfrias, num outro Natal passado.

A tia enrola a minha pedrinha quente numa velha camisola de lã e, depois, num já gasto pano de linho. Pega no candeeiro de mão e leva-me ao quarto. Aconchega melhor a enxerga de folhelho e mete o embrulhinho entre os lençóis de dois panos, que ela cultivara, espadalara, fiara e tecera. Eu tiro o vestido e sento-me na cama. Peço-lhe a bênção e encosto os pezitos frios à minha pedrinha que me aconchega num doce dormitar de sonhos que nem sabem que lá fora neva.

:: ::
«Gentes e lugares do meu antanho», crónica de Georgina Ferro

Partilhar:

  • Tweet
  • Email
  • Print
Georgina Ferro
Georgina Ferro

Origens: Aldeia do Bispo (Sabugal) :: :: Crónica: Gentes e lugares do meu antanho :: ::

 Artigo Anterior Vamos votar no domingo!
Artigo Seguinte   Postal TV (361)

Artigos relacionados

  • A Pepa

    Terça-feira, 2 Março, 2021
  • A minha amiga Laura…

    Quinta-feira, 25 Fevereiro, 2021
  • Aldeia do Bispo

    Terça-feira, 23 Fevereiro, 2021

3 Comments

  1. Aurélio Crespo Aurelio Crespo Responder a Aurelio
    Sexta-feira, 22 Janeiro, 2021 às 11:21

    Gostei muito deste seu texto. Os meus parabéns. E faço votos de que prossiga neste caminho, continuando a regalar-nos com novos trechos, tão belos como este, e que como este, consigam igualmente chegar ao âmago e à essência das vivências do dia-a-dfa de quem habita no interior deste País.

  2. Avatar José Manuel Responder a José
    Quinta-feira, 21 Janeiro, 2021 às 19:03

    Leio as suas crónicas com enorme prazer. Encantam-me os temas, a precisão dos termos, os poemas…
    Bem haja por me transportar à infância.

  3. Avatar Mário Antunes Responder a Mário
    Quinta-feira, 21 Janeiro, 2021 às 13:54

    Parabéns pelo texto Georgina Ferro!
    Faz-me recordar os meus tempos de infância na Lageosa da Raia.
    Abr.

Leave a Reply Cancel reply

RSS

  • RSS - Posts
  • RSS - Comments
© Copyright 2021. Powered to capeiaarraiana.pt by BloomPixel.
loading Cancel
Post was not sent - check your email addresses!
Email check failed, please try again
Sorry, your blog cannot share posts by email.