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Página Principal  /  Angola • Covilhã • No trilho das minhas memórias  /  Um cidadão no Dundo
11 Dezembro 2020

Um cidadão no Dundo

Por António José Alçada
António José Alçada
Angola, Covilhã, No trilho das minhas memórias antónio josé alçada 3 Comentários

Tenho escrito algumas crónicas de vivências únicas que tenho passado, mas estou a compilá-las para um dia, quem sabe, publicar. São estórias com história, onde há um vento da minha juventude, onde me faz lembrar como se vivia. Tal como tudo, há vantagens e desvantagens, mas para quem as viveu, deixa um sabor de saudade.

«Procissão» para abastecer combustível no Dundo - capeiaarraiana.pt
«Procissão» para abastecer combustível no Dundo

Deste vez conto um episódio que, bem ou mal, tem sido um quotidiano desta gente da Lunda Norte: a falta de combustível. Melhor, combustível há. Só que em alguns postos de abastecimento, gerando as filas e boa disposição. Na verdade, aqui na Lunda, raramente alguém se zanga.

Um pôr do sol habitual e único no coração de África. A luz aqui tem outro encanto. E o dia começa e acaba, invariavelmente à mesma hora, ao longo do ano.

Estou numa procissão esperando pacientemente para colocar o precioso combustível na viatura. Alguns perguntam aos céus se ainda haverá petróleo nos mares de Cabinda. Mas provavelmente, o petróleo nada tem que ver com gasolina.

A impaciência dos portugueses aqui de nada serve. O instante é o momento que se vive e, como poderão ler, factos interessantes ocorreram que ajudaram a passar o tempo.

O meu companheiro da frente entretanto avariou a viatura. Mas nada que o preocupe. Com uma tranquilidade inexplicável e tratando-me por «Boss», pediu-me gentilmente para guardar a vaga na lenta procissão.

Assim que estivesse quase a ser abastecido, guardava o precioso lugar, para colocar no carro avariado o afamado combustível.

Puxou a seguir do telemóvel, mas para chamar uns familiares que num ápice apareceram e ajudaram-no a arrumar a dita viatura, numa zona adjacente que não interferia com a marcha lenta, bem lenta.

Quando o por-do-sol foi-se, de facto, a energia foi também abaixo. Aqui alguns desistiram, permitindo a fila avançar mas mesmo assim, no meu caso, ainda faltavam umas dezenas de viaturas.

Mas há gerador. Bem, pensavam alguns. Sim há. Mas está fora de serviço. Esta manutenção, falha em muito sítio!

Este movimento, vai e vem do inesperado, acaba por ser interessante para quem já está farto da monotonia das Áreas de Serviço, em Portugal.

No meio daquela quietude todos falam com todos. Senhoras curiosamente não existem. Salvo com venda ambulante de amendoim, fruta ou milho que nos batem no vidro, tentando a sua sorte. As suas cabeças sustentam o sustento da família.

Agora noite nada se vê. Alguns ainda pedem ao Divino que a luz venha. Não têm combustível para regressar. Mas a calma continua a predominar. A esperança é mesmo a última a morrer!

Posso não atestar a viatura. Mas aproveito estes sons de vida. Despeço-me sem luz, sem gasolina, mas com um fim de tarde óptimo.

Mas tal como a luz vai, vem. E aquela multidão vibrava de alegria, como um golo do clube do coração.

Entretanto uma viatura vem de onde menos esperava. As luzes batiam-me lateralmente na vista. Era o meu companheiro. Queria o seu lugar de volta, não deixando de me avisar que seria prudente um afastamento mais seguro, porque os travões não queriam funcionar. Mas calma, o carro ainda travava!

Estou quase a entrar no recinto do posto. Mas para onde foi o «Operativo»?

O operativo é um segurança que tenta manter a ordem, e neste caso, até funcionava. De facto, os «espertos» que tentavam «furar» a fila eram recambiados. E ninguém se atrevia a entrar no recinto sem a permissão do Operativo. Desaparecido, todos gritavam em uníssono, onde anda o Operativo?

Sem o dito cujo, surge o patrão, ou o verdadeiro «Boss» da Estação de Serviço. Sem perder tempo selecciona as viaturas separando-as pela localização do tampão. As viaturas com tampão do lado esquerdo para um lado e as outras para outro lado. Só que a maioria é de esquerda, e como, por felicidade, o meu tapão está no lado direito lá subi mais uns pontos na «corrida».

Tudo normaliza com o regresso do Operativo. E, com mais ou menos espera, o combustível chega para todas as viaturas. O «Boss» não autoriza, e bem, venda em jerricans, porque só fomenta o mercado paralelo e prejudica quem quer, de facto, abastecer.

O aspecto que mais me impressionou é que na azáfama final, onde a confusão de abastecer e pagar é de facto alucinante, ninguém tenta não pagar. E, a ideia que se tem, da esperteza saloia, que há por tanto lado, aqui, mesmo com horas de espera, eu não constatei. E mesmo quem pagava com cartão, dentro do edifício, já com o carro estacionado no parque, podendo habilmente ir embora, entregava o comprovativo de pagamento (o talão do TPA) ao funcionário que abastecia.

Muitos pensarão que «seca», comigo não me apanham de certeza, etc, etc.

Mas para relembrar, nos tempos em que o combustível subia, horas e horas, se passavam em filas para abastecer. E quando há greve dos motoristas, como em 2017, o país quase paralizou.

Por isso os antigos mencionavam, várias vezes: «Nunca digas que desta água não beberei!»

Dundo, 4 de Dezembro de 2020

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«No trilho das minhas memórias», crónica de António José Alçada

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António José Alçada
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3 Comments

  1. Avatar Etelvina Responder
    Sábado, 19 Dezembro, 2020 às 17:02

    Vivências africanas..

  2. Avatar Quissi Responder
    Sexta-feira, 11 Dezembro, 2020 às 19:06

    Linda história!

  3. Avatar Jose Geraldes Responder
    Sexta-feira, 11 Dezembro, 2020 às 17:47

    Paulatinamente tudo se resolve. Tamos juntos. Abraço

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