Um Natal que se aproxima. Como tantos lusitanos na diáspora, desde à séculos, a família com o bacalhau e grão, o madeiro, a lareira com a aguardente, a missa do galo com a samarra, o bolo rei com o cacau quente, referências que nos torna simplesmente portugueses, lusitanos perdidos mas com rumo e, acreditando, que um dia regressaremos a casa, sentido o calor do abraço de quem, de facto, nos quer bem.

Fado menor do Porto. Sim, existe e é tão português como qualquer outro. Estranho vir para tão longe para descobrir tanta riqueza cultural de um povo tão pequeno.
Porque motivo só valorizamos o nosso «canto» quando o vemos por um «canudo»?
De facto, ser lusitano, é algo diferente. O lusitano sente-se bem fora do seu território, mas nunca o esquecendo. E, há casos de sucesso com netos de lusitanos que esporádicamente visitam a terra dos seus avós.
Uma vez, no ano de 1995, fui numa viagem de trabalho a Paris. Ao sermos abordados por uma autoridade o meu colega identificou-nos como brasileiros. Nesse tempo um brasileiro em Paris tinha outro estatuto. E do fardado polícia mandou-nos logo seguir. Senti uma amargura, pese embora até tivesse sido sensato da parte dele. Portugueses a andar na Opera de Paris, naquelas horas da noite, não seria nada de bom. Mas um brasileiro bem vestido, se calhar com avião particular, seria muito mais natural.
Andando por estas terras, entende-se bem a verdadeira «alma» lusitana. O português adora naturalmente ir para outros lados, desbravar outras praias. A «fobia» de ir para o Interior, ou seguir o Leste, neste lado, ou Oeste, noutro lado, é que nunca foi nada do seu agrado.
Não quero lembrar tempos tristes onde a RTP da Ditadura corria a filmar os soldados, na época natalícia. Mesmo hoje sendo documentos históricos importantes para ambos os lados, o facto é que o Natal é tempo de paz e reconciliação. E eu, na Graça do Senhor, estou voluntário e não imposto por um desígnio qualquer.
Por isso, aqui das terras da Lunda, mais a Norte em concreto, onde os rios carregam os diamantes que quase ninguém vê, os crocodilos espreitam um bom almoço, as serpentes não gostam de ser incomodadas no seu banho de sol, mas a paisagem é deslumbrante num verde único de humidade persistente, desejo à minha mulher, às minhas filhas, ao meu padrinho e madrinhas, e aos meus familiares e amigos um Santo Natal e um Ano Novo cheio de propriedades (ou seria Prosperidade?), respeitando a ladainha daqueles anos, mas hoje, felizmente, em paz e em liberdade, onde a censura, certamente, me deixaria enviar este lindo poema, com uma lágrima no canto do olho, das saudades do nosso/vosso Canto Lusitano…
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CANTO LUSITANO
Ao som das cordas
De uma velha guitarra
Caminho nas ordas
Ao cantar de uma cigarra.
As pedras que por cá deixei
Também saem com o tempo
Rezando fado quando irei
Num barco que anda bem lento.
A pressa de não partir
É a música da saudade
Sentimento sem sorrir
Chorar com a verdade.
Porquê gostar tanto
De ver a casa bem longe
Estranha alma portanto
Viver como um monge.
Algo sem explicação
Que ultrapassa o abraçar
E tudo sem perdão
Ficando triste e só a rezar.
Pecados todos cometemos
Mas às vezes partimos o ramo
Por favor com o que temos
Deixem nos consertar o tramo
A cruz da Fé nos une
Símbolo de paz e amor
É a chama do lume
Que enterra este nosso ardor.
Lunda Norte, 1 de Dezembro de 2020
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«No trilho das minhas memórias», crónica de António José Alçada
Tamos juntos. Forte abraco.