São dezoito horas de uma quarta-feira cinzenta e outonal, com folhas amarelecidas a caírem no tejadilho do automóvel. Regressava do Fundão e acabava de consultar os painéis necrológicos, apenas com o anúncio do falecimento de uma senhora idosa.

Mal cheguei ao meu destino, tocou o telemóvel, com a indicação de uma chamada de um familiar, que me deu a triste e inesperada notícia da morte do Professor José Chambel Gomes, cujo funeral se realizara na tarde daquele dia, na freguesia de Alcongosta (Fundão), transladado de região de Lisboa.
Durante vários anos fomos companheiros de viagem, de segunda a sexta-feira por motivos profissionais, criando raízes de amizade, que após a reforma se mantiveram.
Muitas e diversificadas foram as manifestações recíprocas que cultivámos, mas vi sempre no Professor Chambel um homem com grande caracter, humano, generoso, dedicado e muito amigo de ajudar aquele que precisava de auxílio, sempre disponível. Se as descrevesse dariam para escrever vários textos. Estava na presença de um grande samaritano. Não posso deixar de lhe estar imensamente grato pela ajuda humana e psicológica no falecimento de um filho jovem.
Admirei sempre a sua postura, não descurando a apresentação, estava sempre presente na despedida fúnebre de qualquer habitante de Alcongosta.
Natural de Alvega, Santarém, Portugal concelho de Abrantes, frequenta a Escola do Magistério de Castelo Branco, iniciou a sua carreira profissional em Vila de Rei, onde desempenhou também as funções de Delegado Escolar.
Jovem professor veio para freguesia de Alcongosta (Fundão), para uma escola primária, hoje sem alunos, a futura Casa da Cereja. Nesta localidade, onde conheceu a sua esposa, viveu muitos anos conquistando a estima e amizade de todos os habitantes.
Sobre este aspeto recolhemos o depoimento do Presidente da Junta de Freguesia, Vítor Félix: «Foi um homem muito estimado pelas gentes de Alcongosta, que o tratava como o “Senhor Professor”, e ele assumia aquela freguesia como a sua terra. Não fazia diferença entre classes sociais, convivia com toda as pessoas. Gostava de dar as suas opiniões com sentido construtivo. Marcou muita gente nos valores humanos e cívicos. Se alguém merece uma estátua ou uma rua na toponímia de Alcongosta é o Professor Chambel.»
O Professor fez a recruta e especialidade militar em Castelo Branco, foi mobilizado como furriel miliciano para Angola, onde ministrou o ensino primário a soldados e nativos sem habilitações escolares no Norte de Angola.

Na escola primária de Aldeia de Joanes exerceu durante muitos anos a missão de professor, e a este propósito fomos ouvir alguns dos seus alunos.
Teresa Nunes, auxiliar de educação educativa: «O Professor Chambel foi meu Professor na 1.ª e 3.ª Classe. Era muito exigente, e moldou-nos para aquilo que somos hoje. Mantinha muito respeito, mas era muito próximo, participando connosco nos diversos jogos infantis. Éramos muito felizes naquela escola. Naquele tempo havia respeito, disciplina, exigências, o que hoje não se verifica.»
João António Oliveira Lambelho, bancário: «Foi meu Professor do ensino primário. Era um Professor de referência na altura, que conquistou naturalmente o respeito de todos, qualidade inata para o desempenho da sua profissão. Recordo as segundas-feiras do Mercado do Fundão, altura em que ele colocava no recreio da escola, “cantando” a tabuada para que todos ficassem a saber como os seus alunos a tinham na ponta da língua. Além da sua função principal, marcou uma geração de alunos de Aldeia de Joanes, transmitindo-lhes o seu saber e, mais importante que tudo, valores e princípios que tanta falta hoje fazem no nosso ensino.»
António Albino Costa Ramos, técnico de Finanças: «Em 1978/79 fui seu aluno na segunda classe, na Escola Primária de Aldeia de Joanes. Era de uma pontualidade e assiduidade extremas, às vezes bem queríamos um feriado, mas nunca faltava. Os(as) alunos(as) preparados pelo Professor Chambel faziam a diferença, destacando-se graças aos métodos pedagógicos por ele empregues. Não esqueço que no fim de tarde das sextas-feiras os alunos lavavam-lhe o carro e as meninas limpavam a escola primária.»

Mais tarde frequentou o Curso de Diretor Escolar em Lisboa. Com a obtenção do diploma, foi nomeado Adjunto Escolar em Portalegre e, com a vaga aberta em Castelo Branco, ocupou o lugar de Diretor, do qual se aposentou ao fim de vários anos.
A extinta Direção Escolar, sediada em Castelo Branco, era a entidade do Ministério da Educação (MEC) gestora a nível distrital de todos os assuntos ligados ao ensino pré-escolar e primário.
O Professor Chambel desempenhou um papel pedagógico assinalável junto de muitas centenas de jovens no ensino básico, onde se alicerçam as bases para a construção de um futuro melhor.
Com os dons do Professor José Chambel Gomes, a vida era uma chama. Agora que nos vemos às escuras a sua ausência causa-nos uma grande dor. O rosto de um amigo desinteressado faz-nos sempre muita falta.
Professor Chambel, meu companheiro de tantas viagens, desejo que os Anjos te tenham conduzido à Escola do Paraíso.
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Dezembro de 2012.)
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Um artigo muito bonito. cheio de princípios que o professor Chambel prosseguia e hoje os seus alunos reiteram ser de necessidade nos dias de hoje.
Está de parabéns o Autor que muito bem lembra o seu Amigo, afinal um Amigo merecedor de um busto ou de uma rua para o homenagear.
Concordo, só lembro ao Autor do artigo que os que cumprem cumprem com o seu dever. Essa a maior homenagem.
Aos que não cumprem devia aplicar-,se por exemplo publicitando esse incumprimento.
Devíamos pugnar por acabar com farsas que a sociedade vai tendo tantas vezes por incumprimento do dever.
Os meus parabéns pelo artigo.