Festeja-se no primeiro dia de Novembro o Dia de Todos os Santos. Nesse dia havia missa e procissão em Quadrazais.
Era nesse dia que se deixavam os castanheiros, podendo, quem quisesse, fazer neles o rebusco, munido duma cesta e dum martelo de madeira que funcionava com dois gumes. À tarde a rapaziada fazia grandes magustos, acompanhando as castanhas assadas com aguardente, anis ou jeropiga.
Em Quadrazais não havia água-pé. Enquanto assavam as castanhas até jogavam ao contras ou cabeças com palitos (com a aberto=fósforos). Seguia-se a procissão ao cemitério, com as campas enfeitadas com muitas flores e com várias velas acesas. À noite os pais mandavam os filhos entregar um bocado de pão aos mais pobres.
Neste dia os padrinhos ou aqueles a quem chamavam padrinhos, e eram muitos os afilhados não verdadeiros, já que era hábito em Quadrazais chamar padrinho ou madrinha aos amigos mais velhos já que mais não fosse para receber a rosca, davam a todos os afilhados uma rosca, bolo redondo de trigo com azeite, cozido no forno. O dia de anos era ignorado pelos padrinhos ou até pelos pais e pelo próprio. Nós, miúdos, aguardávamos ansiosos pela rosca que tinha um sabor especial nesse dia. Noutras terras os miúdos vão de casa em casa a pedir o pão por Deus. A origem deste costume deve ser comum, já que o pão ou rosca de farinha é o elemento central.
Em anos mais recuados, o dia 2, Dia de Fiéis Defuntos, também era feriado. De manhã ia-se à missa e à tarde ao cemitério.
Recordando esses tempos da minha infância, de choro pelos que tinham partido, vou reproduzir em verso o que guardo na memória deste dia, às vezes soalheiro, mas na maioria das vezes já bem frio ou até com neve.
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Os Santos
No primeiro de Novembro,
Dia de Todos os Santos,
Roscas dão aos afilhados,
Padrinhos ou não de uns tantos,
Ficando todos mimados.
Bem pouca coisa será,
Mas será boa lembrança.
Para quem tão pouco tem
O pouco alegra a criança.
Venham lá, que sabem bem.
Algumas roscas comi
De padrinhos emprestados.
Alegrias também tive
De padrinhos que já foram
E agora são bem lembrados.
Busca, busca entre os óriços
A castanha escondidinha.
Co’ o martelo picarás,
E enchendo vais a cestinha.
Busca, busca, que acharás!
É o rebusco da castanha
Como o fora já dos gachos
Esquecidos na videira
Com os verdes na apanha.
Tudo serve pr’à moedeira!
Não esqueceram os pobres,
Pois o pão de Deus lhes mandam.
Gratos por tais gestos nobres:
-Bem hajam lhes recomendam.
Até pr’ó ano, amiguinhos!
Magustos por todo o lado,
Castanhas na boca estalam.
Uma copa de aguardente,
Que bem sabe a acompanhá-las!
Come, come, que estão quentes.
Passa pronto a alegria
Que os mortos, cheios de dores,
Há muito esperam deitados
Por umas velas e flores
Neste Dia de Finados.
Rezas, gritos, fundos ais
Se ouvem por toda a noite,
Pelos que já os deixaram
E jamais eles voltaram
Ao convívio dos demais.
Que a terra vos seja leve,
Meus irmãos, tios e pais.
Que a morte a mim não me leve!
Com todos estes meus ais,
Prefiro ainda ver neve.
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