O Quadrazenho não era muito dado a ter estas profissões. Pedreiros, carpinteiros e ferreiros, também conhecidos por ferradores, eram, em geral, de fora.

Os carpinteiros de fora eram o Sá, pai, o Jão da Bivinda, o Rambóia, pai, e o Jaquim Ramos, pai. Já nascidos em Quadrazais eram o Jaquim Ramos, filho, o Sá, filho, o Ranilhas e o Rambóia, filho. Pedreiros de fora eram o Zé Avelar e o Belarico. Da terra havia poucos dignos desse nome, mas tão só uns jeitosos na arte, à excepção dos irmãos Casado, o Zé e o Ismael. Ferreiro de fora era o Sr. Mateus, sendo da terra o Armando Ferreiro e o Magildro.
Recordo uma cena que me deixou triste e choroso. Meu pai tinha uma burra machorra, isto é, que não paria. Tentou várias vezes cobri-la com um burro e nada. Vá então de recorrer ao Sr. Mateus para lhe fazer uma sangria antes de lhe deitar novamente o burro, como era usual. Veio o ferreiro Sr. Mateus com um molho de facas de diversos calibres, qual alveitar da Idade Média. Pôs-lhe uma sobre a veia do pescoço e, com uma martelada, a faca cortou a veia e saíu uma sangria desalmada. Eu, com os meus cinco ou seis anos, pensei que a minha burra ia morrer e desatei a chorar. A dada altura espetaram-lhe um prego a unir as duas partes da pele ferida e o sangue estancou. A burra sobreviveu, mas continuou machorra. Guardo para sempre na memória esta cena, que incluirei nos meus versos.
Carpinteiros, Pedreiros e Ferreiros
Espeta, espeta esse prego,
Carpinteiro afamado.
Alisa, polaina, o rego
Ou garlopa bem mais fundo.
Mostra o que sabes ao mundo.
Preciso dum carpinteiro,
Que o banco está a partir.
Como poderei sentar-me
Sem para baixo cair
E poder vir a magoar-me?
Lembro o Sá que dividiu
Minha casa a ripa e cal.
As portas que ele montou
Permanecem tal e qual
Como em primeiro se viu.
Tecto do corredor, sala
Com desenhos concentrados,
Revelam bem sua fala
De quem da arte sabia.
Era assim que ele fazia.
Não fiques comigo a mal,
Pedreiro meu conhecido.
Na parede uma demão
E um muro no quintal
Pedem-te reparação.
Pica, pica essa parede
Para levar o cimento.
Pois quero tudo lisinho,
Alisa bem num momento,
Minha casa é meu ninho.
Com roldanas e correntes
Fizeste a casa do pai.
Cantarias estão presentes
Sobre portas e janelas.
Quem poderia com elas?
Escaleiras de cantaria
Que séculos durarão,
Mostrando a todos estão
Teu engenho em Quadrazais,
Cortadas nos Barrocais.
Bate, bate com a marra
Para moldares o ferro.
Enxada ou gancho será
Que a terra revolverá.
Vá! Bate, bate com garra!
Perdoo sangrado ter
Minha burra que estimava.
Ver dela o sangue jorrar
Fez-me chorar e chorar
Com receio de a perder.
Procuro uma ferradura
Para meu burro calçar.
Faça-ma, soprando o fole.
Sairá talvez mais mole,
Se não tem uma bem dura.
De todos estes artistas
Eu guardo boa lembrança.
Fizeram-me bons trabalhos
Sem seguirem por atalhos.
E todos deram nas vistas.
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