Eram outras personagens típicas que apareciam aí por Julho nas ruas de Quadrazais, ao som do pregão: Cornachos, peles ou ferro-velho para vender! Porquê o nome cornachos? Certamente pela forma retorcida de muitos deles, assemelhando-se a cornitos.
Muita gente percorria os pães próprios ou alheios à procura de cornachos em Junho e Julho. Um quilo deles valia bom dinheiro e sempre era uma ajuda para ir à feira de São Pedro ou outra mais tarde comprar alguma roupa ou outro bem necessário.
Dizia-se que eram para a indústria farmacêutica. O instrumento usado eram uma balança para pesar o ferro velho ou os cornachos.
As peles eram a olho ou preço fixo para as peles de coelhos. Aproveitava-se tudo para fazer negócio e obter uns tostões para as necessidades do dia-a-dia. Era o caso de ferraduras velhas ou qualquer pedaço de ferro.
Cornachos, Peles e Ferro Velho
Pele do coelho guardei
E ao cão não a deitei.
Valerá cinco tostões
Para comprar rebuçados,
Um bom lápis ou piões.
Ferradura encontrei
A caminho do Alcambar.
Não p’ró burro, mas artigo
Para cerejas comprar,
Como Cristo e os amigos.
Por searas eu andei
À procura de cornachos
Muito calor apanhei
Sem estragar a seara
Até encher meus dois tachos.
Sonhei comprar fato novo
P’rà festa de Sant’Ófêmia.
Será grande o desconsolo
Se o comprador não me der
O preço que eu quiser.
Já me imagino no balho
Cativando moças mil.
Olharão muito para mim.
Sem um senão ou um til,
Mirarão do fato o talho.
Se não chegar o dinheiro
Ainda há pele dum cabrito
Vendida ao taberneiro
Com devolução da pele.
É como na sopa o mel!
Minha prima também pôr
Quer nova camisa e saia.
Andou nos pães a meu lado
Aos cornachos à gandaia.
Só nos falta comprador.
Lá vem ele. Já ouvi
Sua voz de pregoeiro.
Vou já chamá-lo aqui
Para mostrar-lhe os cornachos
Antes que esgote o dinheiro.
Contente ficou o intruso
Que leva em mercadoria
Peles e alguns ferros velhos.
E em nós muita alegria
Por realizar sonhos lusos.
Minha prima ficou linda
Com a saia que comprou.
Não menor é meu ornato
Com este meu novo fato.
Por agora a festa é finda.
Para o ano se verá
O que poderei comprar.
Trabalhos mil passarei
Se a vida me ajudar.
Veremos o que farei.
Coitados, donos do pão,
Que cornachos não colheram
Em seus terrenos sem medo!
Que madrugassem mais cedo
E os guardassem então!
:: :: ::
:: ::
«Lembrando o que é nosso» crónica de Franklim Costa Braga
:: ::
Obrigado pela explicação da Wikipédia.
Ainda bem que lhe fiz recordar a infância, parecida à minha e de muita gente da raia. Um abraço.
Franklim
Mon père, Albertino Baldo, maintenant décédé, était citoyen de Quadrazais et m’avait parlé des “cornachos”. Mais il croyait que c’était “coronachos”. J’ai toujours essayé de trouver de l’information sur cela sans succès. Merci beaucoup pour votre article! Je vais sûrement imprimer les photos et l’information! Apparement mes grand-parents (Manuel et Maria-Luisa Baldo) ramassaient les cornachos pour faire de l’argent.
Merci!!!
Julie Mallen (Baldo)
Caro Franklim
Com esta crónica vieram-me à memória episódios esquecidos da minha meninice na aldeia.
Recordo a excitação quando era miúdo de ir com as minhas primas para os campos apanhar os cornatchos. Na aldeia havia adultos que conseguiam encher muitas sacas de farinha e fazer uma boa maquia de dinheiro quando vinha o comprador com a balança decimal na camioneta.
Não me recordo se apanhava muitos ou poucos mas recebia sempre excitado as duas ou três moedas de 2$50 escudos de recompensa que a minha tia me dava no domingo depois da missa matinal. Eu e os meus primos corríamos até ao comércio da Ti Mari’Mília do Ti Marinheiro para fazer furos no cartaz dos prémios que estavam sempre divididos em quatro quadrados com os clubes de futebol. Depois de furar com uma caneta BIC arrancávamos do lado de trás a bolinha de papel com o prémio. Quase sempre saiam rebuçados mas quando a dona do comércio estava mais bem-disposta trocava-os por copinhas de ginja. E para aqueles pequenos «não havia mais metafísica no mundo do que beber ginja»!
Uma pesquisa na wikipédia esclarece-me que o cornacho (como é conhecido nas nossas terras) é um fungo parasita que ataca o centeio, e do qual se extraem vários alcaloides e substâncias de uso medicinal. É um fungo conhecido por ser alucinogénio e usado para fabricar LSD. Quem ingerir o fungo pode desenvolver uma doença actualmente denominada de ergotismo.
A partir do estudo do esporão do centeio, em 1943, foi descoberta a substância dietilamida de ácido lisérgico, popularmente conhecido como LSD que é um poderoso alucinogénio.
jcl