A capela tinha uma alpendrada. Tiraram-na para que os ciganos não a usassem como dormitório. O chão era coberto de chinas tiradas do rio, tal como na capela do Divino Espírito Santo. Alguém teve a má ideia de as cobrir com cimento. É mais prático para ajoelhar, mas teria sido melhor colocar bancos como na capela do Espírito Santo. Tem uma porta de lado que dá para o cemitério. Os mortos cuja casa ficava para cá da igreja não iam para esta, mas sim para a capela. Saíam por essa porta directamente para a sua cova.

Tal como em Pádua, onde as moças se vão roçar no santo para arranjarem namorado, também aqui as moças o procuravam para as ajudar na mesma missão.
Santo António é também o padroeiro das coisas perdidas. Por isso lhe rezavam seu Responso (Riponso como lá diziam) para as encontrar. Recordo-me de procurarem minha avó, a ti Luisinha, para que lhes dissesse esse Responso, que transcrevi no meu livro «Quadrazais-Etnografia e Linguagem».
Os mordomos eram rapazes solteiros. Estes colocavam pequenos pinheiros enfeitados com bandeirinhas de papel multicor na rua que vai da igreja à capela de Santo António, onde colocavam um arco com dois pinheiros mais altos, unidos por enfeites.
No dia 12 de Junho os mordomos levavam o santo da sua capela para a igreja, sem procissão, e no dia 13 acordava-se ao som de foguetes e levava-se o santo em procissão da igreja para a sua capela. As duas labardas (alabardas), uma mais leve que a outra, arco e tambor do Espírito Santo também eram usados nesta festa.
Até por ser meu vizinho, na rua com o seu nome, único santo a que servi, e muito da devoção de meu pai, que também se chamava António, vou dedicar-lhe um poema, cheio de saudade e amor.
A Santo António
Foguetes para acordar,
Chamando todos p’rà festa.
Que tanto labardear
Não faça suar a testa.
Tu mereces, meu bom santo!
As labardas e tambor
Passeiam co’ o arco na rua.
Experimentaste aquela?
Pega nesta que é a tua.
Santo António, em teu louvor!
Já tocam na torre os sinos
A chamar pr’à procissão
Saíndo da igreja em hinos
Para a capela do santo.
Dlim, dlão, dlão, dlim, dlão e dlão.
O padre por entre o povo
Rezando vai orações.
Tomados de tal fervor,
Amém, dizem corações.
Vamos pegar no andor.
P’las ruas engalanadas
Continua a procissão
Com estrondo de foguetes
Que abafam a oração.
Sigam. Já vão atrasadas.
Como és casamenteiro,
São jovens os teus mordomos.
Raparigas te suplicam:
Com muito amor aqui somos,
Dá-nos um rico parceiro!
Foram elas que enfeitaram
Rua e capela, um espanto!
Para assim bem merecer
Que o santo as possa ver.
Que me dareis, grande santo?
Não satisfazes meu gosto,
Será a São João que eu peço
O que a ti já eu roguei.
Que me dê o que mereço:
Namorado de bom rosto.
Para o ano voltarei
Com meu noivo já ao lado
À vossa bonita festa.
Por vós será abençoado.
E com filhos cá virei!
Perdi a chave de casa.
Como poder nela entrar?
Mas Santo António não passa
Sem ma ajudar a encontrar.
Busca, busca, meu bom santo!
Graças a ti encontrei
O que procurara tanto.
Uma vela te porei
Aos pés do teu lindo altar.
Bem mereces, grande santo!
Meu bom santo taumaturgo,
Milagre quero pedir:
Faz com que neste teu burgo
Já não haja mais barulhos
E ninguém outro ferir.
Eu perdi tua amizade
Por ir viver pr’a tão longe
Prometo te visitar
Um dia próximo d’honje.
Santo, quero tua bondade!
Vela pela minha casa
Que antes já foi de meus pais.
Do meu amado quintal
Colhe fruta e coisas mais.
Oxalá não façam mal!
No dia em que eu morrer
Quero ficar teu vizinho
Na campa onde estão meus pais,
Junto de ti bem pertinho
Para ouvires os meus ais.
Leave a Reply