António Parente Lourenço nasceu há mais de sete décadas em Aldeia Nova do Cabo, Fundão, nos finais da II Guerra Mundial, no seio de uma família de pequenos agricultores, constituída por dois rapazes e duas raparigas, que cultivavam a terra para sobreviverem.

Aos sete anos já ajudava os pais nas lides do campo e, mal fez o exame da 4.ª classe na enigmática Escola das Tílias do Fundão, pegou na enxada e noutras ferramentas agrícolas a trabalhar para outrem, do nascer ao pôr-do-sol, ganhando diariamente onze escudos.
Na agricultura não havia regalias sociais, nem horários, só possíveis na década de setenta com o Governo de Marcelo Caetano.
Aos doze anos quis ir trabalhar para a Electro Gardunha, por sentir que a sua vocação era a de eletricista, mas por falta de vagas não entrou. É de referir que naqueles anos as empresas eram grandes escolas profissionais em diversas áreas.
Sem vaga, pela intervenção de Paulo Cascão entrou para o «Jornal do Fundão», como aprendiz de impressão. Teve como mestre o Serafim, natural do Porto, casado e residente em Aldeia Nova do Cabo, falecendo mais tarde na Ilha da Madeira. Outro dos mestres foi o César, morador na Quinta de São Pedro, nos tempos livres árbitro de futebol, mais tarde instalado como fotógrafo na Rua João Franco, junto à Farmácia Taborda no Fundão.
Trabalhou no «Jornal do Fundão» durante dois anos, mas abandonou aquelas instalações por, nas suas palavras, «incompatibilidades, dureza e feitio autoritário do Encarregado José Alberto». Este José Alberto foi mais tarde para Moçambique, regressou ao «Jornal do Fundão» e saiu para dono da Papelaria Salvado, na Avenida da Liberdade.
Numa das FACIF (Feira Agrícola, Comercial e Industrial do Fundão), «encontrei este amigo, quando eu era ensaiador do Rancho folclórico de Aldeia Nova do Cabo e, desta vez, teve de respeitar as ordens que lhe dei, porque os tempos em que me aplicava “correctivos” no Jornal do Fundão estavam longínquos».

Do «Jornal do Fundão» foi para empregado do comércio, na Loja do Adro, propriedade de Francisco Ferreira, em frente à Igreja Matriz do Fundão.
No comércio, «não gostava de estar preso», e depressa foi aprender a arte de sapateiro em Aldeia Nova do Cabo, nas oficinas de António Pedro e Virgulino Morais. No sentido de melhorar o salário foi para a Oficina de António Malícia Leitão, conhecido por «Portugal» em Aldeia de Joanes, só saindo para cumprimento do serviço militar obrigatório.
Cumpriu a recruta em Castelo Branco, a especialidade de cavalaria em Estremoz, a formação de Batalhão em Portalegre e seguiu para a Guerra na Guiné.
Integrou o Batalhão de Cavalaria 1905, Companhia 1650 (uma das raras companhias que tem um livro com a sua história, escrito pelo Capitão Paulo Santos com a colaboração dos Alferes Milicianos) e, durante vinte e dois meses, percorreu os espaços de guerra em Teixeira Pinto, Bissorã
Tempos de sangue, suor e lágrimas…

Regressado do Ultramar (comemorou 51 anos em Outubro de 2019 num encontro de ex-combatentes em Aldeia Nova do Cabo) foi trabalhar para a Auto Transportes do Fundão, fazendo os percursos Couto Mineiro – Fundão e São Jorge da Beira – Fundão.
Ao fim de três anos, emigrou para França, fixou residência nos arrabaldes de Paris e trabalhou na construção civil. Dado que o patrão tinha obras por diversas cidades de França, viajou por muitos territórios franceses durante catorze anos. Graças a esse trabalho, conseguiu angariar dinheiro para a construção da sua residência em Aldeia Nova do Cabo.
Regressou a Portugal em 1984, comprou uma Padaria em Aldeia Nova do Cabo e durante quinze anos dedicou-se à actividade da panificação.
Hoje, reformado, ocupa-se da pequena courela e ajuda um ou outro amigo nas actividades agrícolas, demonstrando conhecimentos muito diversificados.
Mas… ainda sonha que a sua profissão ideal seria a de electricista, para a qual tem grandes aptidões naturais.
Apesar de ser um andarilho das profissões, não esqueceu a acção social e cívica, junto das gentes bairristas de Aldeia Nova do Cabo.
Assim, durante seis anos, foi ainda participante, e mais tarde ensaiador, do Rancho Folclórico da Saudade de Aldeia Nova do Cabo, que participou em diversos festivais.
Também foi Tesoureiro da Junta de Freguesia e, durante quatro décadas, pertenceu aos órgãos sociais da Irmandade de Nossa Senhora do Pé da Cruz, com tradições profundamente religiosas nas gentes daquela aldeia.
Há meses celebrou as suas Bodas de Ouro Matrimoniais, rodeado de familiares e amigos.
Neste tão diversificado mundo profissional, social, religioso e político, o António Lourenço, como tantos de nós, é de uma geração que nasce no final da II Guerra Mundial e que conhece todas as austeridades («livro-vos da guerra, mas não da fome») e privações: a Ditadura, a Guerra do Ultramar, a Emigração, as Troikas… e agora a Covid-19, essa pandemia que nos confina e limita, cujas consequências são imprevisíveis.
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
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