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24 Maio 2020

A minha burra Farrusca

Por António Alves Fernandes
António Alves Fernandes
Agricultura/Ambiente, Aldeia de Joanes, Aldeia de Joanes, Alfaiates, Beiras, Bismula, Cerdeira do Côa, Cultura, Fundão, Quadrazais, Região Raiana, Riba-Côa, Rio Côa, Vila do Touro burro Deixar Comentário

Desconhecia que 8 de Maio é o Dia Internacional do Burro. E qual é o dia da espécie humana? Talvez não se comemore essa efeméride porque, apesar de toda a epidemia, estamos longe das vias de extinção e somos a espécie dominante da Terra.

Dia Internacional do Burrno a 8 de Maio
Dia Internacional do Burro a 8 de Maio
Os meus pais tinham uma burra com o nome de «Farrusca»…
 
Dado que há celebrações para tudo e para nada, o nosso Homem sugere que a Humanidade festeje, antes do Dia do Burro, o Dia do Asno.
 
Na minha aldeia, Bismula, no concelho do Sabugal, uma das poucas capitalidades que a minha humilde terra pode exibir é ser duas vezes capital da mula. Possivelmente os meus leitores desconfiam do meu natural regozijo, mas nunca confundi um burro com uma mula. Esta surge de um casamento improvável entre um burro e um nobre cavalo.
 
Na minha aldeia, nem todas as famílias eram proprietárias de asininos. Os meus pais tinham uma burra, que baptizaram com o nome de «Farrusca» por se de cor escura. Assim, desde pequenino, afeiçoei-me àquele animal, que era dócil, paciente, a nossa companheira permanente.
 
Naqueles tempos difíceis, de carestias e austeridades, chegámos a viver paredes meias com os animais. Perto de nós, ajudavam a aquecer as noites do Inverno daquelas terras frias.
Os burros são animais dóceis e pacientes
Os burros desde sempre ajudaram nas lides do campo nas aldeias beirãs
A «Farrusca» era o 112 do nosso viver, o melhor meio de transporte, de trabalho agrícola, social, religioso e até desportivo.

Estava sempre pronta para todos os serviços: era necessário ir a um médico às aldeias vizinhas de Alfaiates ou da Cerdeira do Côa e lá estava às ordens para fazer a viagem sanitária, salvando inclusive a vida do meu irmão Ezequiel; nas idas e regressos dos mercados mensais de Vila do Touro, Miuzela ou Alfaiates, a fim do transporte de produtos agrícolas ou outras mercadorias; disponível para os trabalhos agrícolas, lavrando e semeando a terra de cultivo; «tocar a nora», durante muitas horas, com os olhos vendados, para não se estontear, a fim de a água matar a sede das plantas.

Por ribeiras, caminhos, veredas tortuosas, difíceis de ultrapassar, levava os passageiros até à estação da C.P. da Cerdeira da Côa, ou à Paragem de Camionagem da Nave.
 
Falecia um irmão de uma freguesia limítrofe da Irmandade de São Sebastião da Bismula e lá ia a «Farrusca», uma burra fúnebre, carregada com o estandarte, lanternas e às vezes com o peso de um dos três acompanhantes mais cansados. Tantas idas ao Ozendo, às Batocas, a Quadrazais ou a Vila Boa…
Companhia de muitos idosos nas aldeias
Dóceis e pacientes são ajuda e companhia de muitos idosos nas aldeias
Na ida à sede do concelho do Sabugal, vinha carregada com os livros e apetrechos para cozinhar durante pelo menos dois dias, a fim de os alunos da Primária fazerem exame da 4.ª classe, o culminar de um ano escolar.
 
Durante o ano escolar, quando não sabíamos as lições, as professoras puxavam as orelhas, «para ficarem maiores que as dos burros». Também nos chamavam asnos, que era pior que ser burro. Nesse aspecto lembro-me que é mais grave chamar cretino que estúpido, até porque o cretino raramente tem consciência da sua estupidez.
 
Quanto ao contrabando não eram solicitados os seus préstimos, exportávamos sim, clandestinamente muitas mulas, cujo nome de guerra era «tractores».
 
Em cortejos de oferendas, angariação de fundos para festas anuais, lá estava a sua força motora de trabalho. Era a versão mais solidária do burro.
 
Também em termos culturais, o nosso Homem ainda programou encher os alforges de livros e, com uma comitiva de amigos, vender os seus livros pelas ruas da sua aldeia no período das Festas de Verão.
 
No campo desportivo, além do futebol, a única corrida oficial da Época do Asinino, na Bismula, era a «Burricada», uma corrida de burros, organizada por esse grande Pastor, que acompanhava a par e passo a sua comunidade cristã, o Padre Ezequiel Augusto Marcos. Como é diferente a maioria dos Pastores dos nossos tempos.
 
Os participantes vencedores, no alto dos seus chapéus, qual corrida de cavalos de sua Majestade, lá recebiam troféus tão valiosos, como um presunto, um coelho, um bacalhau, um galo de capoeira. Porém, no dia seguinte, nada tinha mudado para os burros campeões.
 
Antigamente as crianças gostavam de andar de burro
Lotação esgotada
Hoje defende-se o burro para experiências turísticas, para defesa do nosso património genético e autóctone, mas já nos idos anos de setenta, do século passado, os meus filhos, ainda crianças, quando queriam ir à minha aldeia natal, falavam em ir «à terra dos burros», porque adoravam estar junto daqueles animais.
 
Se assim continuarem nas presentes e futuras gerações, haverá esperanças para os burros. Se tal não acontecer, porque não fazer mais uma petição pública tão na moda, para que o Dia Internacional do Burro seja substituído pelo Dia Mundial do Asno?
 
Como tenho saudades da minha Burra «Farrusca», que tantos momentos felizes nos proporcionou.

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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes

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António Alves Fernandes
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