Nada foi tão decisivo, para a vida das pessoas daqui, como a emigração dos anos cinquenta e sessenta para França. No início, com a emigração fechada, quase todos saíram a salto. Mais tarde, com uma abertura na emigração, foi possível emigrar legalmente, com cartas de chamada, o que beneficiou a reunião das famílias e a ida de outros emigrantes.

Saíam de noite, levados por passadores, a quem pagavam oito ou nove mil escudos…
Os que partiram clandestinos, eram, sobretudo, pais de família que precisavam ganhar o sustento dos filhos e também rapazes solteiros, alguns, com menos de dezoito anos, para fugirem à tropa e à guerra colonial. Saíam de noite, levados por passadores, a quem pagavam oito ou nove mil escudos. É bom de ver que nem todos tinham este dinheiro, a solução era endividarem-se.
No geral, um passador português levava-os para Espanha e, aí, podiam passar por vários, até chegarem à fronteira de Hendaya, já em França, onde apanhavam o comboio até Austerliz, em Paris, estação de destino de quase todos os emigrantes que foram daqui.
Passar a Espanha, onde a emigração também estava proibida, era o mais difícil. Andavam dias e dias, até semanas, a pé, por veredas, montes, caminhos ruins, atravessando ribeiros…, para fugirem à guarda civil. O dia era passado em casebres e, de noite, quando havia menos policiamento, caminhavam ou eram levados de carro.
Os que foram apanhados, trazidos até à fronteira e entregues às autoridades portuguesas, tiveram de passar pelos usuais interrogatórios e ameaças da PIDE. Apesar disto, muitos voltavam a tentar a ida a salto e assim conseguiram chegar a França; outros não tentaram ou não conseguiram e tiveram de aguardar por cartas de chamada.
A carta de chamada era um documento que vinha de França, atestando que aquela pessoa tinha um trabalho assegurado, em determinado patrão ou firma, e também onde ficar alojado. Contudo, não era suficiente, todos tinham de passar por um exame médico, só os considerados aptos para o trabalho, tinham direito ao passaporte de emigrante.
Tempos difíceis estes!
:: ::
«A minha terra é Águas Belas», crónica de Maria Rosa Afonso
Obrigado, Rosa Afonso por querer partilhar connosco o seu saber.. Contou-nos, na generalidade, o que acontecia. A todos. Veja, agora, por favor, se tem alguma história em particular que se tenha passado com um vizinho seu, um amigo, um primo… ou que tenha ouvido contá-la a alguém. Obrigado.
Muito obrigada pelas suas palavras e pela sugestão. Também tenho a noção clara de que há situações em que só os relatos, na primeira pessoa, podem dar conta de tudo o que verdadeiramente se passou e importa. A recolha de testemunhos, mais ainda quando os protagonistas têm noventa ou mais anos, também me parece uma urgência, seja no âmbito de estudos ou de escritos de outra natureza, desde que a pessoa seja informada e dê o seu consentimento. É por isso que tenho muita dificuldade em referir nomes.
Maria Rosa Afonso :
«Calcula-se que entre 1961 e 1974,um milhão de portugueses encontrou trabalho no estrangeiro(…) o maior movimento populacional da história de Portugal (…)».
«Num município português, Sabugal,no Norte rural, a emigração reduziu a população local de 43513 em 1950 para unicamente 19174 trinta anos depois.»
Quem isto escreveu foi o historiador Tony Judt, no seu livro Pós-Guerra, neste livro, Tony Judt tem o que de mais relevante aconteceu na Europa a partir de 1950, e o Concelho do Sabugal, com a sua emigração é uma parte importante desta História.
António Emídio
Obrigada pelo comentário e pela informação. Foi uma saída massiva, com dramas humanos incalculáveis, vividos por quem partiu e por quem ficou (os mais velhos, as mulheres que tiveram de sozinhas tomar conta dos filhos…). Mesmo com as coisas a melhorar sempre, a todos os níveis, o sentimento de viverem uma vida divididos, não é uma coisa de somenos. Espero que as últimas gerações (a 3ª e a 4ª) já tenham ultrapassado este sentimento.