Acabo de acordar. Num relance olho a brancura do teto. Levanto-me num primeiro impulso. Invade-me o anseio de espreitar o exterior.
Ali estavam todas as razões…
O telemóvel emite um tocar melódico. Atendo-o expectante. Era um amigo que, nestes tempos de isolamento, ganhou o hábito de substituir a conversa da «bica» por explicações virais. Hoje vaticinou o meu desejo e convidou-me a espreitar o dia. Proposição feita, corri à janela. Desviei a cortina e olhei.
Ali estavam todas as razões. Um extenso manto branco havia pousado sobre o vale estirado. Mas o nevoeiro roubava-me a Serra.
A neve sempre me surpreendeu. Todavia, na primavera, ela constitui maior surpresa. Nunca se prevê tanto frio em Abril.
Era, então, tempo de contemplar. A alvura do vale contrastava com a supra escuridão flutuante. Havia minúsculos flocos muitos brancos quais pedacinhos de algodão subindo e descendo frente à janela, ensaiando um doce bailado e indiciando a eminência de um nevão repetido.
Contudo, em tal momento, não obtive um agrado absoluto. Este instante, embora intenso, apenas me ofereceu uma espécie de prazer contaminado.
A ambiência, severa, perturbava-me e a epidemia multiplicava inquietações. A neve poderia restringir cinesias, sim, mas era apenas a montra de todas as limitações.
Dir-se-ia então que a mãe natureza aproveitava o ensejo para sussurrar em voz de vento:
– Fiquem em casa!
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«Terras do Jarmelo», crónica de Fernando Capelo
(Cronista no Capeia Arraiana desde Maio de 2011)
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Isso fernando! No momento, a contemplação deve ser feita pela janela. Aqui se faz o mesmo. Abraços e cuidem-se.
Muito bom, excelente e surpreendente final, esse fiquem em casa” nesse contexto até seria agradável não fossem já as 3 semanas de confinamento e a obrigação. Bem se sabe que o proibido sempre é o mais desejado .
Um prazer ler-te. Um abraço cheio de saudades
Saudades, também!
Beijinhos.