Um Grupo de Trabalhadores dos Serviços Prisionais da Covilhã, Fundão e Castelo Branco, realizam todos os anos uma viagem à Rota do Peixe Frito e desta vez escolheu-se a linda freguesia de Belver, terras de onde «foram os mouros e ficaram os gaviões». Nada melhor que uma viagem pela linha ferroviária da Beira Baixa, com paragens em todas as estações e apeadeiros, algumas e alguns a meter dó, dado o total abandono a que foram votadas. Estações que estão carregadas de memórias, de histórias humanas, de sofrimentos, de dores e alegrias e de muitas saudades.
A viagem não é longa e depressa chegamos a Belver, sobre a qual escreveu Alexandre Herculano: «…é um local onde se tem de ir uma vez na vida».
Por ali passei inúmeras vezes, a maior parte de comboio e desconhecia a riqueza patrimonial que contém. A verdade é que temos sempre um Portugal desconhecido à nossa espera e neste caso por uma boa causa.
A primeira imagem que nos chama a atenção, além do curso do Tejo, é o seu Castelo Medieval, construído por D. Sancho I, onde se albergou o tesouro do Reino, logo que foi habitado. Dali deslumbramos uma bela paisagem, o que levou uma princesa à janela na Torre de Menagem para gritar: «oh! meu Pai, que belo ver».
Mais abaixo, o Museu do Sabão é um dos quatro existentes no mundo sobre esta temática e já motivo de reportagem na revista National Geographic. É uma homenagem aos trabalhadores saboeiros.
Junto ao Rio, o Núcleo do Museu das Mantas e Tapeçarias de Belver, onde podemos «reviver o passado, ter contacto com os teares, as matérias primas e os seus instrumentos de trabalho, conhecer, no Bairro da Tropa, a História da Antiga Fábrica Natividade Nunes da Silva, e as peças aqui produzidas, numa simbiose entre a tradição e as novas tecnologias».
A guia D. Olga Teixeira, numa linguagem acessível, explica e exemplifica todos os pormenores desta antiga indústria, complementados com um pequeno filme.
Faço uma viagem no tempo e regresso às minhas origens rurais da Bismula -Sabugal e, ontem como hoje, vejo uma plantação de linho em flor azul, como o meu pai cultivava nas suas pobres courelas, o linho a passar por diversas transformações, o amassar, o coser, o fiar, o tecer e os sons dos teares a pedal a trabalhar, a que não se ficava indiferente.
Sabemos que estes trabalhos eram essencialmente executados pelas mulheres e, a este propósito, cito a escritora Simone de Beauvoir: «é pelo trabalho que a mulher vem diminuindo a distância que a separa do homem, somente o trabalho pode garantir uma independência concreta».
Findo o circuito cultural, iniciamos uma caminhada pelo Passadiço de Belver, junto ao Rio Tejo, e desembocamos na Praia Fluvial do Alamal, em cujo restaurante nos espera uma ementa de açorda com peixe frito. Na sobremesa não faltam as cerejas do Fundão. O Guarda José Leirinha canta algumas músicas francesas no convívio, depois de bem bebidos e de óptima refeição. Toda a gente o escuta.
Antes do regresso aos nossos destinos, um passeio de barco pela Barragem de Belver, onde o barqueiro nos chama a atenção para uma gigante pedra de granito, junto às águas, muito semelhante a um golfinho.
Será que o Rio Tejo já teve golfinhos? É pouco provável.
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Março de 2012)
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