A povoação do Dirão da Rua é atravessada por uma galeria subterrânea, vulgarmente conhecida por mina, que antigamente abastecia de água uma presa existente junto ao Largo de São Cornélio. A passagem de um veículo ligeiro da Câmara Municipal de Sabugal, em 16 de Março de 2018, provocou uma derrocada que surpreendeu a todos.
Conhecedor do terreno e das gentes, durante vários meses, questionei as pessoas mais velhas tendo chegado às conclusões que a seguir exponho.
1 – Narrativa histórica
1.1. A antiguidade da mina é completamente desconhecida, embora hoje esteja convicto de que a sua exploração maior aconteceu no século XIX com algum desenvolvimento das culturas de regadio, como a batata e milho.
Recentemente fui informado de que o meu avô, cerca de 1940, devido a manter uma entrada aberta em plena via pública, terá sido multado e intimado a fechar esse acesso.
De realçar as dimensões aproximadas de uma das pedras que fecham a presa: – Cumprimento – 3 m, altura – 60 cm e largura 23 a 30 cm (isto faz lembrar os tempos Megalíticos!).
1.2. Cerca de 1970 a presa tinha água em agosto, servindo esta para regar as hortas e lavar roupa. Estas gentes ainda não tinham máquina de lavar! Neste momento está seca! A situação só é compreensível devido às sucessivas derrocadas, com o consequente entupimento da mina, mantendo-se a água estanque dentro da mesma.
1.3. Dos trabalhos de construção, conta-se que dois homens, pressentindo a proximidade da água, levaram um garrafão de vinho. Chegados ao local, algures próximo do forno, deram as últimas marteladas na rocha, começou a jorrar água e não se trabalhou mais! Era tempo de celebração!
1.4. Da cerejeira às tílias: Em 1950 havia no terreiro, hoje largo de São Cornélio, uma cerejeira. Um dia os homens decidiram cortá-la! Um dos argumentos para justificar a decisão foi o fato de as raízes se infiltrarem entre as pedras das paredes da mina, que atravessa aquele espaço, podendo provocar a destruição da mesma. O mesmo argumento não foi tido em conta quando da plantação das tílias, no final da década de 1970, à entrada do chão pertencente à capela, em local próximo ao buracão que se formou em 16 março de 2018.
Ninguém se lembrou dos relatos, passados de geração em geração, que referiam o prolongamento da mina para essas bandas e dos efeitos nefastos que daí adviriam. Incoerência dos homens? Desconhecimento do percurso? Enfim, mudam-se os tempos, mudam-se as vontades! A verdade é que as referidas árvores foram plantadas e as suas raízes e a muita pluviosidade parecem ser a causa imediata do acidente. No mesmo local vi passar camiões com muitas toneladas sem que provocassem qualquer desabamento visível. Também no largo foram plantadas árvores, em situação idêntica. Em dias de calor sabe bem usufruir das sombras, mas…
1.5. Os acessos: Dos testemunhos recolhidos foi-me possível identificar duas entradas: Uma a menos de três metros do último buracão e outra no Largo de São Cornélio. Estes locais eram fechados com uma pedra, que seria removida quando se quisesse entrar. Os homens entravam acompanhados de lanternas, como se fazia nas minas da Carrasca e Vale de Arca que bem conheciam. Das últimas vezes foram fechadas/entulhadas com pedras mas sem critério algum, ou seja, de forma precária.
1.6. As obras para abastecimento de água ao domicílio, no final da década de 1970, poderão ter provocado alguns danos que hoje ignoramos.
1.7. As derrocadas: A que ocorreu o ano transato foi a quarta de que há memória e surpreendeu a todos. Duas localizaram-se muito próxima da atual, sendo que a antepenúltima aconteceu nos primeiros anos da década de 1960 e coincide com um antigo acesso, a penúltima ocorreu no início da década de 1980 e provocou danos na parede de uma casa.
Estes fatos sugerem a fragilidade da parte superior! Outra ocorreu no início da década de 1970 no Largo de São Cornélio.
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«Memórias de Sortelha», opinião de António Gonçalves
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2019)
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