O meu plano é trazer aqui um resumo dos 38 meses e 11 dias da minha tropa: desde 21 de Julho de 1971 (entrada no Curso de Oficiais Milicianos da Escola Prática de Infantaria de Mafra) até 2 de Outubro de 1974 (aterragem no aeroporto militar de Lisboa, vindos de Luanda). Trarei apenas episódios marcantes, nunca esquecidos, que dormem acordados nos recantos da minha memória.

Tal como leu aqui na semana passada, a minha Companhia já chegou a Cabinda.
No porto, ao sairmos da Corveta, fomos logo informados da morte do Capitão Bexiga, do alferes médico e de um furriel, num jipe, na Curva da Morte, entre Buco Zau e o Sangamongo. Zonas de guerra que ia conhecer demasiado bem dentro de poucos dias.
Mas ainda é cedo, nesta minha narrativa: agora vamos fazer a viagem e perceber como funciona o Batalhão…

Batalhão
A tropa / Exército organizava-se em pelotões (grupos de combate), companhias e batalhões.
Cada batalhão tinha quatro companhias.
Cada companhia, quatro grupos (pelotões).
Cada pelotão, cerca de 28 homens.
Ou seja, cada companhia, perto de 105 homens, incluindo oficiais e sargentos. Cada batalhão, cerca de 430 homens, incluindo os comandantes e o oficial de operações.
No caso do meu Batalhão, era assim:
– Companhia de Comando e Serviços (CCS, a minha): um grupo de operacionais de intervenção (o meu), e mais três pelotões: o de transmissões, o de abastecimentos e o de manutenção: mecânicos etc.
– 1.ª Companhia: 4 grupos de combate operacionais;
– 2.ª e 3.ª Companhias: mesma composição da 1.ª.
O Comando de Batalhão era formado do seguinte modo:
– 1.º Comandante (coronel);
– 2.º Comandante (tenente coronel);
– Oficial de Operações (Capitão, depois promovido a Major).
Cada Companhia era comandada por um capitão. No caso do meu batalhão, eram todos milicianos, menos o capitão da CCS (a minha, repito), que era do quadro e ainda por cima vindo de sargento, quase analfabeto, no caso.
Cada grupo de combate era comandado por um alferes (todos milicianos, excepto um, na CCS, que não comandava, mas era um apoio do capitão).
Cada grupo de combate era composto de quatro equipas: uma comandada directamente pelo alferes miliciano e as outras comandadas por furriéis milicianos.
Não sei se sabem, mas milicianos éramos nós, os que não vínhamos das escolas da tropa, mas sim das escolas do Estado: liceus (os furriéis) e Universidades (os alferes).

Vamos entrar no Maiombe, floresta virgem
Este era o complicado universo da tropa em que me vi metido naqueles mais de dois anos de Maiombe. Resta explicar que Maiombe é a floresta virgem onde fui parar, de certeza a mais bonita do mundo… mas que era naquela altura o pior local do mundo para eu estar!!
Vamos então em frente: estou no porto de Cabinda à espera das Berliets que vão transportar a CCS para o Bata Sano, quartel central, três quilómetros acima de Buco Zau, a sede do concelho a 120 km de Cabinda.
Era já em zona de guerra, se bem que a zona operacional começava exactamente ali: quer em direcção ao Belize, já sede de outro batalhão; quer em direcçãoà nossa própria zona 100% operacional mais grave: Chimbete e Sangamongo.
Mas falarei nos próximos capítulos de outras zonas de perigo permanente. Hoje, vamos apenas fazer a primeira viagem (cheios de miúfa) entre Cabinda e Buco Zau.

Viagem em zona de perigo
Recordo de forma muito emocionada essa primeira entrada na zona operacional. Nunca se sabia o que podia acontecer.
As Berliets chegaram, estão formadas aqui em frente ao porto, nós a observá-las e a pensar no que seriam os próximos meses. A partir daí, já não controlávamos a nossa vida: era ela e o acaso que nos controlavam a nós…
Subir para as Berliets, todos de cabeça baixa de emoção, e arrancar para a zona do perigo maior de todos: perder a vida num ataque em emboscada…
Vamos em frente. Seja a partir de agora o que o destino quiser…
(Continua.)
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«1971-74 – Os Dias da Tropa», por José Carlos Mendes
Olá.
Bem-vindo, sempre.
Conheço isso tudo até demais… como calcula…
A tropa escrevia Penkacta nos mapas de operações – sei lá porquê!
Abraço.
Tive oportunidade de passar por Chimbete a caminho de Penecacata nos anos 90 com um amigo madeireiro, por sinal antigo militar do exército português no Maiombe. Já era tudo mata e a única coisa que restava para contar a história era o tanque de água. Foi uma viagem muito encantadora pela floresta.