Parece mais ou menos claro que ou as maiorias são capazes de partilhar o poder ou os conflitos sociais assumirão proporções cada vez maiores. Pode-se partilhar o poder por decreto, criando cotas para diferentes grupos; mas, como se tem visto, o fundamental do problema, o sentirem-se representados, não parece resolvido.

Há um trabalho de fundo que tem a ver com o modo como as próprias pessoas veêm a sua participação nos destinos do país. Diria que precisa mudar e que não é uma coisa simples. Uma ideia para essa mudança pode ser dada pela imagem de uma praça, no sentido da agora grega, o lugar do debate, do conhecimento, das diferentes opiniões, onde se discutem e definem interesses comuns.
A imagem de caminhos distintos que convergem para um cruzamento que, pouco a pouco, se vai transformando numa grande praça, à medida que uns e outros se aproximam, é muito bonita. A praça é o lugar do encontro, o espaço aberto, onde, a cada momento, vão chegando novas pessoas, novas culturas, diferentes nacionalidades…, e onde todos têm lugar. Nela, tudo decorre como numa reunião em círculo, sem lugares marcados, sem estrados para os chefes, todos no mesmo plano, olhando-se e falando diretamente.
Chegaram à praça de livre vontade, sem pré-condições, sem pré-juízos, ou qualquer tipo de coação – isto é decisivo, pois sem liberdade e democracia não se pode construir nada em comum. Vieram, porque entenderam que os seus caminhos, também, passavam por ali. Sentaram-se, falaram, ouviram, partilharam e, pouco a pouco, perceberam que as suas próprias ideias e valores eram importantes para todos. E, assim, sem pressas, mas também sem desistências, foram construindo um espaço social, de igual para igual, respeitando e sendo respeitados.
A determinada altura, percebe-se que a praça se transformou numa comunidade, onde são cada vez menos as resistências e as desconfianças e onde todos se sentem comprometidos e empenhados nas decisões. As condições, para o exercício de uma democracia mais participativa, trouxeram ganhos para a partilha do poder e a para igualdade de oportunidades.
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«Rostos e Contextos», crónica de Maria Rosa Afonso
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