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14 Setembro 2018

A chegada dos refugiados… à minha aldeia?

Por António José Alçada
António José Alçada
Internacional, Nacional, Nacional / Internacional, No trilho das minhas memórias, Política, Religião, Solidariedade antónio josé alçada, refugiados 2 Comentários

A crónica de hoje não é mais do que uma estória de ficção, de uma hipotética chegada de um grupo de refugiados a uma das nossas aldeias, perdidas por detrás destas montanhas. Curiosamente, ou não, com tanta generosidade europeia, ninguém se lembrou que até por estas bandas a tónica da hospitalidade é uma das sãs características do povo Beirão. Como se costuma escrever nestas «coisas» qualquer semelhança com a realidade é pura ficção!

A minha aldeia aceitou receber refugiados (Foto: D.R.)
A minha aldeia aceitou receber refugiados (Foto: D.R.)

A reunião da Comissão de Festas foi convocada com caracter de urgência. Mesmo com a rede móvel sempre a ir abaixo, o Presidente conseguiu convocar todos os mordomos. A expetativa era grande e ninguém sabia o que se passava.

«O Marcelo telefonou ao nosso Presidente de Junta e questionou-o se estaríamos disponíveis para receber um grupo de refugiados. Ora como estamos a perder população, a Escola está já está fechada, a Junta decidiu em recebê-los e convocou-me para preparar uma receção memorável. Por isso convoquei esta reunião. Quero ouvir a vossa opinião!»

Fez-se um silêncio pesado. Já não bastava organizar a Festa da Padroeira e agora mais esta. A questão é como fazê-lo. Os mais afoitos começam a dar ideias havendo no entanto uma oposição generalizada. O problema da língua era o principal entrave. Sendo árabes como os entender.

O Presidente da Comissão de Festas, habituado às divergências entre os mordomos, resolve a contenda no imediato invocando que a comida e a bebida com a música do rancho aproximam gerações, inclusivamente lusodescendentes que quase todos os anos voltam à aldeia. Seguramente que a «receita» também resultaria para estes convidados, escorraçados do próprio país por guerras fratricidas.

Começam logo a surgir vozes de oferta e solidariedade. O Justino oferece um porco. O Mariano, o Joaquim e o António trazem vinho e aguardente das suas adegas. O pão seria cozido no forno da aldeia fazendo-se um peditório para comprar farinha e fermento. A luz começa a surgir no grupo onde de uma discussão a organização da festividade da receção parece consolidar-se.

Mas de repente surge um grito: «Calma!»

O Marco, um dos mordomos mais novos, sempre «agarrado» ao telemóvel, lá apanhou dados móveis (por sorte) e, durante a discussão, consultou o Google. No meio de tanta pesquisa «deitou por terra» todo um sonho de hospitalidade. Pois é!

Os muçulmanos não podem comer carne de porco, nem beber álcool, e o pão, vejam lá, não pode ter fermento! Volta logo a discussão. Uns diziam que era impossível. Os judeus sim era verdade, mas com os árabes, nem se podem ver!

Outros já faziam contas à vida com os custos. Nem pensar em comprar laranjadas e Coca-Cola. E arranjar carne de cabrito, ou de vaca, era impossível. O tesoureiro avisou logo que o orçamento mal dava para a Festa da Padroeira.

Mas o Marco ainda disse mais: «Rezam cinco vezes por dia. Se calha na hora da festa há logo problema com o padre.»

O Presidente deita as mãos à cabeça. Os cruxifixos na Escola Primária tinham de ser retirados. E seguramente o padre não iria gostar. Mas o Marco continuava:
«Rezam e temos de lhes dizer a direção de Meca!»

A reunião da Comissão de Festas foi convocada com caracter de urgência. Mesmo com a rede móvel sempre a ir abaixo, o Presidente conseguiu convocar todos os mordomos. A expetativa era grande e ninguém sabia o que se passava.

«O Marcelo telefonou ao nosso Presidente de Junta e questionou-o se estaríamos disponíveis para receber um grupo de refugiados. Ora como estamos a perder população, a Escola está já está fechada, a Junta decidiu em recebê-los e convocou-me para preparar uma receção memorável. Por isso convoquei esta reunião. Quero ouvir a vossa opinião!»

Fez-se um silêncio pesado. Já não bastava organizar a Festa da Padroeira e agora mais esta. A questão é como fazê-lo. Os mais afoitos começam a dar ideias havendo no entanto uma oposição generalizada. O problema da língua era o principal entrave. Sendo árabes como os entender.

O Presidente da Comissão de Festas, habituado às divergências entre os mordomos, resolve a contenda no imediato invocando que a comida e a bebida com a música do rancho aproximam gerações, inclusivamente lusodescendentes que quase todos os anos voltam à aldeia. Seguramente que a «receita» também resultaria para estes convidados, escorraçados do próprio país por guerras fratricidas.

Começam logo a surgir vozes de oferta e solidariedade. O Justino oferece um porco. O Mariano, o Joaquim e o António trazem vinho e aguardente das suas adegas. O pão seria cozido no forno da aldeia fazendo-se um peditório para comprar farinha e fermento. A luz começa a surgir no grupo onde de uma discussão a organização da festividade da receção parece consolidar-se.

Mas de repente surge um grito: «Calma!»

O Marco, um dos mordomos mais novos, sempre «agarrado» ao telemóvel, lá apanhou dados móveis (por sorte) e, durante a discussão, consultou o Google. No meio de tanta pesquisa «deitou por terra» todo um sonho de hospitalidade. Pois é!

Os muçulmanos não podem comer carne de porco, nem beber álcool, e o pão, vejam lá, não pode ter fermento! Volta logo a discussão. Uns diziam que era impossível. Os judeus sim era verdade, mas com os árabes, nem se podem ver!

Outros já faziam contas à vida com os custos. Nem pensar em comprar laranjadas e Coca-Cola. E arranjar carne de cabrito, ou de vaca, era impossível. O tesoureiro avisou logo que o orçamento mal dava para a Festa da Padroeira.

Mas o Marco ainda disse mais: «Rezam cinco vezes por dia. Se calha na hora da festa há logo problema com o padre.»

O Presidente deita as mãos à cabeça. Os cruxifixos na Escola Primária tinham de ser retirados. E seguramente o padre não iria gostar. Mas o Marco continuava:
«Rezam e temos de lhes dizer a direção de Meca!»

Escola Primária da minha aldeia - Capeia Arraiana
Escola Primária da minha aldeia

Fez-se um súbito silêncio. Agora como resolver mais este imbróglio. Alguns ainda perguntaram o que seria Meca, mas prontamente foram esclarecidos. Só mesmo um topógrafo poderia determinar a direção da cidade sagrada do Islão.

O Presidente deu por terminada a reunião. Tinha de falar com a Junta de Freguesia. Não era má vontade, mas a Comissão de Festas estava muito limitada para resolver tanta contrariedade. E muito menos queria problemas com o padre da Aldeia!

No dia seguinte encontra o Presidente da Junta de Freguesia. Mal ia contar a reunião do dia anterior, fica logo a saber a novidade: «Já não veêm. Preferiram outro país. Assim que desembarcaram em Lisboa pisgaram-se logo para o Centro da Europa!»

O Presidente da Comissão de Festas respirou de alívio!

Soltroia (Grândola), 8 de Setembro de 2018

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«No trilho das minhas memórias», crónica de António José Alçada

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2 Comments

  1. António Alves Fernandes Antonio Alves Fernandes Responder a Antonio
    Sexta-feira, 14 Setembro, 2018 às 16:22

    Otimo! Com muito humor e realidade. Parabéns!

    • Avatar António José Alcada Responder a António
      Sábado, 15 Setembro, 2018 às 1:42

      Obrigado meu irmão escuteiro

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